O Globo
Presidente segue entoando o samba de uma nota
só e pode perder chance de buscar atender frustrações demonstradas pelo eleitor
Lula, até aqui, parece ter passado os últimos
dias de olhos e ouvidos fechados para os recados que emergiram das urnas no
último domingo. Passadas 48 horas, com vencedores colhendo os louros e vencidos
lambendo as feridas, o presidente segue entoando o samba de uma nota só que tem
marcado seu segundo e encruado ano do terceiro mandato.
Voltou a falar que os juros estão altos e a dizer esperar que baixem em breve, mesmo sabendo que isso não está no radar, justamente no dia da sabatina no Senado de Gabriel Galípolo, seu escolhido para presidir o Banco Central. Não causou nenhum ruído, a aprovação se deu com o pé nas costas — mas para quê? Deixa no ar a ideia de que a próxima gestão terá sobre si a sombra da pressão palaciana, o que não ajuda em nada a transição na autoridade monetária.
Na mesma fala, o presidente repetiu que
ideias novas estão proibidas entre os ministros e que a hora é de colher
sabe-se lá que frutos, uma vez que o que mais se vê por aí são pepinos, de
queimadas a vício em bets. O governo ainda não chegou à metade. Condenar ideias
novas tão prematuramente, ainda mais depois de os eleitores voltarem às seções
de votação e chancelarem tão fortemente, de Sul a Norte, incluindo o
emblemático Nordeste, políticos com ideário oposto ao de Lula, é desperdiçar a
chance de perceber o que está errado e corrigir a rota. Para, aí quem sabe,
colher frutos.
Se no primeiro ano houve com o que encher a
cesta, do arcabouço fiscal à reforma tributária, passando pelos dissabores em
série de Jair Bolsonaro et caterva, neste ano nem o bom desempenho da economia
parece ser capitalizado pelo Executivo.
Para completar um cenário bem adverso, o
ex-presidente tirou a cabeça da água e ajudou o PL a obter uma performance
inédita em pleitos municipais, com dois eleitos e nove disputando segundo turno
em capitais. O desempenho supera de longe o do PT, que não conseguiu nenhuma
vitória em capitais e disputa a segunda fase em quatro delas em situação de
tiro, porrada e bomba.
Ignorar a realidade política nunca foi boa
medida para governos, e Lula, conhecido pelo pragmatismo com que construiu sua
carreira única, sempre foi bom em dar a volta por cima de adversidades que
pareciam definitivas, como sua prisão pela Lava-Jato. O fato de estar cercado
de um time bem mais fraco e menos autônomo que em seus mandatos anteriores
talvez tenha empenado um pouco essa sua propalada capacidade.
Temas que se impuseram no debate nas
principais cidades do Brasil deveriam motivar o governo a espanar o velho e a
buscar desesperadamente por ideias novas, que o fizessem se reconectar com uma
parcela imensa do eleitorado, sob pena de ser derrotado daqui a dois anos.
O fenômeno Pablo Marçal, que por um triz não
foi ao segundo turno em São Paulo, à parte toda a delinquência, evidenciou que
existe uma classe empreendedora que não vê no PT, nem na confusa novela para
regulamentar atividades como a dos entregadores e dos motoristas de aplicativo,
qualquer relação com aquilo que almejam para suas vidas.
O partido que nasceu e chegou ao poder
vocalizando anseios dos trabalhadores desistirá de falar com a nova classe
trabalhadora só porque não consegue lhe enfiar goela abaixo uma CLT e uma
sindicalização que ela despreza? Não seria menos arrogante e mais inteligente
entender o que eles dizem em vez de considerá-los alienados e idiotizados?
O mesmo erro vem sendo cometido na última
década com o cada vez maior e mais multifacetado eleitorado evangélico, que, de
novo no pleito municipal, foi determinante para a eleição de candidatos bem
distantes de Lula. Fechar os olhos e os ouvidos a recados que brilham em neon e
rugem é sinal de perda de tirocínio político que pode ser fatal.
5 comentários:
Primeiro, Lula tem que ENtender as frustrações dos eleitores! Até isto está difícil. Ele se acha o sabe-tudo que tudo sabe mesmo...
O povo rejeitou a esquerda que representa o autoritarismo , a censura , a perseguição , Ideologia de gênero nas escolas para as crianças , Liberação de drogas e aborto
É isso que o eleitor brasileiro está rejeitando cada vez mais cada nas eleições
Lulu eu o PT perderam a credibilidade , depois da Lava jato , por mais que a imprensa tente passar pano
Exatamente. A vaidade de Lula nunca foi aliada na necessidade de ouvir e observar a realidade. Agora, a idade e um certo deslumbramento com a (mais) nova esposa prejudicam ainda mais sua capacidade de ouvir o recado dos eleitores.
é curioso como alguns colunistas gostam de mencionar a "propalada capacidade" política do Lula, mas esquecem de mencionar que durante todos os seus mandatos o congresso sempre esteve COMPRADO! nunca foi em torno da capacidade política ou ideias, mas sim em torno do $ do contribuinte
1º com o Mensalão e depois com o Petrolão...
Ninguém vota em partido para prefeito,é uma sopa infindável de letras e siglas.
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