terça-feira, 5 de agosto de 2008

DEU NO VALOR ECONÔMICO


BAGUNÇA INSTITUCIONAL
Raymundo Costa


A autorização para grampear telefones que o juiz federal Fausto De Sanctis deu ao delegado Protógenes Queiróz é inédita. Desconcertante. De uma penada só, o magistrado paulista deu ao delegado acesso a todos os telefones do país. On line. A todos os números do banqueiro Daniel Dantas, o alvo principal da operação Satiagraha, mas também aos do presidente da República e os do vendedor de churrasquinho de gato apanhado na escuta da PF e pelo "rapa" paulista.

Uma autorização que deixou intrigados o Congresso e os chamados meios jurídicos. Há os mais desconfiados, que desde já apostam no superaquecimento da campanha eleitoral de 2010. O mercado negro dos grampos é que dirá se eles estão certos ou se tudo não passa de mera paranóia. Mas existe também quem observe apenas "uma fase de uma certa bagunça institucional", como o deputado Arnaldo Madeira, tucano paulista com experiência e conhecimento dos desvãos do governo. Bagunça que, segundo ele, começa pela Presidência.

Os exemplos estão por toda parte. Um que passou em branco: a manifestação de delegados pela autonomia da Polícia Federal. É fato que há um grau de impunidade muito alto no país e um sentimento de justiça muito alto na sociedade, mas isso não justifica a ação de justiceiros e paladinos, que só ameaçam as bases nas quais se assentam o estado de direito. É outra a delegação democrática.

A bagunça institucional seria visível quando o juiz De Sanctis, por mais bem intencionado e sintonizado com o sentimento da sociedade que esteja, revela uma visão um tanto messiânica da sua função, como alguém que deve dar satisfação diretamente ao povo. E quando a PF passa a imagem de que prende porque quer arrumar o pais. É o bem combatendo o mal.

Em uma das suas entrevistas, o delegado Protógenes adverte que ficará de olho na criação do Fundo Soberano, uma proposta do Ministério da Fazenda, atento para ir atrás de quem tentar malversar o dinheiro público. Como diz Arnaldo Madeira: "É um pouco essa questão de super-homens que vão resolver a questão, porque as instituições estão fragilizadas", diz.

As manifestações de juízes federais em relação a decisões do Supremo Tribunal Federal se colocam no mesmo nível. A primeira instância tem de ter autonomia, mas há também as instâncias superiores. É a lei. Outro exemplo: o ministro das Relações Exteriores representa o país na rodada Doha, mas o ministro da Agricultura diz que essa reunião é uma bobagem. O outro pensa o quê? "O que é que eu estou fazendo aqui, turismo"?

"Os ministros do presidente Lula se estapeiam em público e nada acontece", diz Madeira. "Estamos numa situação preocupante não porque a PF vai fazer mais isso e mais aquilo, mas porque a própria ação da PF revela a bagunça institucional que nós estamos vivendo".

A força da democracia nos dias de hoje é que o conceito de democracia se generalizou no mundo. Mas para o deputado Arnaldo Madeira, "as sociedades precisam ter instituições sólidas, porque o que dá segurança à democracia não é o homem genial, não é o homem providencial: é o funcionamento das instituições". Mas o que se vê é "que as instituições estão muito fragilizadas, a hierarquia está quebrada em todos os níveis. É isso o que ocorre quando um delegado faz uma representação ao Ministério Público porque não estaria sendo atendido por seus superior na Polícia Federal".

Democracia prescinde de justiceiros e paladinos

Madeira tem um diagnóstico para o que chama de bagunça institucional da atual conjuntura: "É a contradição entre a complexidade da sociedade e dos segmentos modernos da sociedade, que tocam a atividade econômica, e o atraso do Estado e das instituições. Esse é o centro do problema", diz.

Na opinião do tucano, o Brasil se tornou uma sociedade mais complexa, tem setores econômicos dinâmicos, que são competitivos em nível mundial (agronegócio, siderurgia, minério de ferro, fabricação de aviões, entre outros). "Estamos competindo com empresários e agentes privados que têm capacidade de atuar numa economia competitiva muito grande", argumenta. Modernidade que por outro lado convive com "instituições que ficaram para trás, que não estão conseguindo se modernizar para enfrentar essa nova circunstância da moderna sociedade brasileira".

O que ocorre então é a contradição de uma sociedade arcaica, com instituições com a cabeça da década de 1950, e segmentos da economia ultra-sofisticados. Um exemplo é o sistema financeiro. Basta ver que à abertura do mercado quem "deu show" foram os brasileiros Bradesco, o Itaú e Unibanco. O Banco do Brasil, apesar de estatal, é bem gerenciado. Os outros se deram mal".

Para Madeira o quadro se resume a isso: uma sociedade bastante complexa e a política com a cabeça na década de 50, atrasada e uma estrutura de Estado obsoleta. "Poucos economistas conhecem o funcionamento do mercado financeiro, que é sofisticado, internacional. Imagina se um juiz um ou um delegado vão entender isso. Aí o cara fica vendo minhoca".

Segundas intenções

O ministro do Desenvolvimento Social, Patrus Ananias, acha que a coordenação da área social está em muito boas mãos com Miriam Belchior, assessora especial da Casa Civil, o que dispensa a designação de um ministro específico para a tarefa. A unificação foi sugerida pelo ministro Fernando Haddad (Educação) durante reunião de 17 ministros realizada no último 21 de julho.


O presidente Luiz Inácio Lula da Silva não chegou a se comprometer com a idéia, disse que ia pensar. Mas tratou de advertir eventuais interessados que a adoção da proposta não significaria mais salário, apenas mais trabalho.

Segundo fontes credenciadas do Planalto, o próprio Patrus e Luiz Dulci (Secretário Geral) estariam cotados para a função. Mas no próprio PT há quem vislumbre por trás da idéia um projeto presidencial paulista para se contrapor a Dilma Rousseff e a vontade de empregar a área social nas eleições.
Raymundo Costa é repórter especial de Política, em Brasília. Escreve às terças-feiras

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