Maduro diz que “encarcerará um a um todos os fascistas”.
Quem são os fascistas? Os que Maduro determinar que são.
No meio da avalanche de lixo multiplicado pelas redes sociais, existem cenas estarrecedoras dos distúrbios da Venezuela, mas imagens verdadeiras vem misturadas com outras cuja confiabilidade é zero. A TV venezuelana está numa espécie de auto-censura, o que não contribui em nada para esclarecer os fatos.
Servem apenas como lenha na fogueira para alimentar discussões sem nexo, e ataques de ódio alimentados pela cegueira e pelo fanatismo ideológico que se retroalimenta à esquerda e à direita. Em vez de luz, essas discussões produzem mais escuridão.
A chance de um debate objetivo sobre os acontecimentos na Venezuela é tão ampla quanto pode ser um “diálogo” entre torcedores do Atlético Paranaense e do Botafogo ocorrido meses atrás num estádio catarinense, cujas edificantes cenas pudemos ver ao vivo pela TV.
Cada um vai para a arquibancada com seu porrete forrado de pregos na ponta e disposto a aplicar ao adversário a sua versão da “verdade”.
Há uma crise de representatividade e legitimidade na Venezuela desde que Maduro foi eleito por uma estreitíssima margem de 1,59% e a oposição pediu recontagem de votos, não foi atendida e se negou a reconhecer a vitória do sucessor de Chavez.
O clima piorou com o agravamento da crise econômica, o desabastecimento, a inflação em alta, a criminalidade em alta, e as medidas populistas anunciadas pelo governo, como a lei que fixa o limite de lucro máximo que os negócios privados podem produzir.
Uma sandice parecida com o congelamento do preços durante o Plano Cruzado, no qual galopou ex-governador paulista Orestes Quércia, com sua cruzada de caça ao boi gordo no pasto.
Os venezuelanos foram às ruas divididos em prós e contras e as manifestações fizeram emergir a figura do ex-prefeito de Chacao, Leopoldo López, como um líder de oposição mais incisivo e menos conciliador do que Henrique Capriles, que foi o candidato da oposição unida nas eleições de 2013.
López é um líder controvertido, já foi acusado de desunir a oposição, e para Maduro, como todo opositor, é um “fascista”. E como tal foi preso.
A ONG Human Rights Watch, conhecida mundialmente, disse que “a única causa provável para a detenção é o fato de ele ser um dirigente de oposição, que convocou manifestações contra o governo, o que não é causa suficiente numa democracia para privar alguém de sua liberdade”.
A morte de seis manifestantes atingidos por tiros na cabeça, é atribuída por alguns à ação de milícias criadas durante o governo Chavez, como força auxiliar das forças de segurança.
O Fla-Flu das redes sociais mais confunde do que esclarece e o jornalismo profissional pouco se empenha em reportar o real clima e as reais causas da crise venezuelana e a verdadeira dimensão da atuação das milícias chavistas.
A imagem da jovem miss Génesis Carmona, de 23 anos, carregada ferida nos braços de um manifestante, antes de morrer, tornou-se um emblema do conflito e a prisão de López remete, inevitavelmente, ao histórico filme “Il Delitto Matteoti”, dirigido por Florestano Vancini em 1973, que faz refletir sobre formas de fascismo, milícias e até onde pode levar a irracionalidade da violência política.
Sandro Vaia é jornalista. Foi repórter, redator e editor do Jornal da Tarde, diretor de Redação da revista Afinal, diretor de Informação da Agência Estado e diretor de Redação de “O Estado de S.Paulo”. É autor do livro “A Ilha Roubada”, (editora Barcarolla) sobre a blogueira cubana Yoani Sanchez e "Armênio Guedes, Sereno Guerreito da Liberdade"(editora Barcarolla).
Fonte: Blog do Noblat
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