segunda-feira, 2 de fevereiro de 2015

Ricardo Noblat - Gosto amargo da derrota

- O Globo

"Nem oposição nem situação. Serei independente" Deputado Eduardo Cunha, PMDB-RJ, novo presidente da Câmara

O governo da presidente Dilma Rousseff amanheceu ontem sem dispor de uma resposta satisfatória para a indagação que corria de boca em boca entre ministros de Estado e líderes do PT desde o início da semana passada: o que seria pior? Eduardo Cunha (PMDB-RJ) se eleger presidente da Câmara dos Deputados para um mandato de dois anos? Ou ser derrotado e permanecer como líder do seu partido na Câmara?

AGORA, o que mais apavorava o governo: é a atribuição do presidente da Câmara de receber ou ignorar pedidos de impeachment do presidente da República. Dilma detesta Eduardo. Sempre o tratou mal. Considera Eduardo um dos deputados mais fisiológicos da Câmara. Não o perdoa por ter contribuído para derrotas do governo em votações importantes. E não quis pagar preço algum para tentar convertê-lo em aliado.

SE TIVESSE ouvido Lula, ela teria procedido de outra forma. Ou teria feito um acordo com Eduardo ou se mantido distante da eleição na Câmara. Mas, não. Dilma mobilizou a máquina do governo para derrotá-lo. E acabou conferindo-lhe o rótulo de candidato da oposição — embora a oposição propriamente dita apoiasse a candidatura a presidente do deputado Júlio Delgado (PSB-MG). Dilma imaginou eleger um candidato do PT — e perdeu.

AO CAIR da noite de ontem, só havia uma dúvida : contra Arlindo Chinaglia (SP), candidato do PT a presidente, o PSDB de Aécio Neves ajudaria a eleger Eduardo logo no primeiro ou no segundo turno? A oposição dava como certa a derrota de Júlio . E estava disposta a votar em Eduardo para vencer o PT e o governo. Foi o que fez. No Senado, tentara impedir a reeleição de Renan Calheiros (PMDB-AL) para presidente. Em vão.

DILMA NÃO precisava ter colhido na Câmara uma derrota tão amarga no início de seu segundo governo, enquanto o escândalo da Petrobras só faz esquentar . Donos e executivos de empreiteiras presos em Curitiba cansaram de esperar um sinal dela ou de Lula de que há vontade de socorrê-los. Não querem mofar na cadeia, destino reservado ao ex-publicitário mineiro Marcos Valério, um dos cérebros do mensalão.

DE FATO, eles só têm uma saída: em troca de penas menores, contar tudo o que sabem sobre o esquema de desvio de dinheiro da Petrobras para financiar a base de sustentação do governo no Congresso e abastecer o caixa 2 dos partidos. O caso deverá chegar em Lula. E em Dilma. Foi Lula quem nomeou o delator Paulo Roberto Costa para diretor da Petrobras. Ali, ele pintou o diabo. Dilma conviveu amistosamente com Paulo Roberto durante anos a fio.

POR ORA, não convidem Lula e Dilma para a mesma mesa. Lula está certo de que Dilma nada faz para salvá-lo, além de não levar em conta seus conselhos. De sua parte, Dilma não se conforma em ter herdado dele a enrascada da Petrobras. Mantém Graça Foster na presidência da empresa para que ela siga limpando a cena do crime e apanhando no seu lugar.

PARA AFLIÇÃO de Dilma e Lula, é no meio desse imbróglio que se encaixará o novo e poderoso presidente da Câmara dos Deputados. Bom dia, Eduardo.

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