- O Estado de S. Paulo
Para bom entendedor, meia palavra basta. Para quem leu o novo documento do PMDB, o título basta: “Uma ponte para o futuro”. Não é um programa de governo para a campanha de 2018, mas sim um programa de governo já: uma proposta de transição até 2018, sem Dilma Rousseff e com Michel Temer na Presidência.
O texto não tem o feitio maneiroso nem o cheiro doce desses programas de campanha eleitoral que depois são jogados no lixo – como, aliás, Lula admitiu no Diretório do PT. Tem o feitio duro e o odor ácido de um programa de emergência que visa um pacto político para medidas, nada populistas ou eleitorais, que os especialistas apontam para evitar um mal ainda maior e criar as condições para a recuperação.
O PMDB, portanto, deixou de lado a conveniência diplomática e assumiu o mais puro pragmatismo diante de uma crise que, quanto mais se aprofunda, mais parece sem saída. Goste-se ou não do partido, há excelentes razões para que prepare terreno para uma posição, senão de oposição aberta, pelo menos de independência, na grande reunião do dia 17.
Ao descer do muro e se colocar, o maior partido do País simplesmente reage ao tsunami dos fatos. Avalia que o governo Dilma não tem mais condições mínimas de aprovar o que quer que seja no Congresso e vem perdendo importantes aliados que se uniam em torno de Dilma – não por ela nem pelo PT, mas pela governabilidade – e vêm jogando a toalha, um atrás do outro.
Recessão, déficit, arrecadação, empregos, tudo vai ladeira abaixo junto com a credibilidade, sem nenhum freio à mão, sem saber o que esperar lá no fundo. Investidores, empregadores, empregados, analistas, aliados, estão perplexos ou em pânico. A velocidade do bólido só aumenta.
O País parou e, afora os bancos, que assistem a banda passar de camarote, não há um só setor feliz e satisfeito e não há uma só área do governo que funcione a contento. A política externa, por exemplo, raia o vexame. O Brasil abrir mão da mediação do conflito Colômbia-Venezuela para o Equador? Engolir calado Nicolás Maduro desdenhando da indicação de Nelson Jobim como observador das eleições? Onde nós estamos?
As manchetes são desastrosas não por um complô da “direita”, da imprensa ou de “destacamentos repressivos e judiciais apropriados por grupos subordinados ao antipetismo”, como diz a resolução do PT, mas porque fatos são fatos. As notícias de economia são desesperadoras e as notícias policiais são chocantes, porque o abuso foi descarado e os desvios já ultrapassam a casa de milhões.
Quem pode acreditar, a esta altura, que tudo isso seja simplesmente um complô malévolo para evitar a volta de Lula em 2018? A Polícia Federal, o Ministério Público, a Justiça, a Receita Federal e a mídia estão todos errados, comprados, mancomunados, fazendo da destruição do PT e do Lula um projeto de vida???
Não bastasse, o rol dos “destacamentos repressivos e judiciais” continua aumentando. Agora é o Coaf (agência do governo para o combate à lavagem de dinheiro) que, segundo a revista Época, identificou movimentações suspeitas de quase R$ 300 milhões nas contas de Lula, Palocci, Pimentel e Erenice. Os de sempre.
É assim que investigações independentes, de órgãos, setores e agente diferentes, vão afunilando para os mesmos personagens, deixando o governo, o PT e Lula sem um discurso plausível. Cada vez mais, eles falam só para quem quer acreditar, ou precisa acreditar, como crentes ingênuos de uma igreja universal do reino do poder e do dinheiro.
A seita PMDB é melhor do que isso? Bem... Ali a questão não é de crenças, deuses, pastores e ovelhas, mas uma coisa é certa: o partido sabe direitinho onde estamos, onde o País está indo parar e onde Michel Temer pode perfeitamente se encaixar.
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