• Nova fase da operação investiga prédio onde ex-presidente
• Ministro da Justiça diz que petista não é investigado e que suspeitas sobre ele são ‘ especulação indevida’; segundo procuradores, OAS teria usado apartamentos para lavar dinheiro desviado da Petrobras
Nova fase da Lava- Jato deflagrada ontem, a Triplo X chegou mais perto do ex-presidente Lula. Centrada no Edifício Solaris, em Guarujá, onde Lula e sua mulher tiveram um tríplex, a operação investiga a relação entre a Bancoop (cooperativa de bancários), o PT e a empreiteira OAS. A suspeita é que 11 apartamentos do Solaris foram usados para lavar dinheiro desviado de contratos da Petrobras para pessoas ligadas ao PT. Os procuradores classificaram o imóvel que pertenceu a Lula como “alto grau de suspeita” e querem saber se houve tentativa de ocultação de patrimônio. A operação preocupou o Planalto e o PT. Lula repudiou ligação de seu nome com a Lava- Jato. O ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, disse que suspeitas sobre o ex-presidente são “especulação indevida”.
Lava- Jato bate à porta de Lula
• Tríplex que foi de ex-presidente pode ter servido para lavar dinheiro da Petrobras
Cleide Carvalho, Mariana Sanches, Renato Onofre - O Globo
- CURITIBA, GUARUJÁ e SÃO PAULO- As investigações da Operação Lava- Jato chegaram ao edifício Solaris, no Guarujá, onde está o tríplex em nome da OAS que pertenceu ao ex-presidente Lula e a sua mulher, Marisa Letícia. O tríplex faz parte de uma lista de 11 apartamentos que o Ministério Público Federal suspeita terem sido usados para lavar dinheiro de contratos da Petrobras, beneficiando pessoas ligadas ao PT e ao ex- tesoureiro do partido João Vaccari Neto, preso desde abril de 2015 e já condenado em um dos processos. Para a Polícia Federal, que ontem deflagrou a 22 ª fase da Operação Lava- Jato, batizada de Triplo X, essas unidades do edifício têm “alto grau de suspeita quanto à sua real titularidade”.
— Nós investigamos fatos. Todos os apartamentos e todas as pessoas que tiveram ligação com este empreendimento são investigadas. Se houver um apartamento lá que esteja em seu nome (do ex-presidente Lula) ou que ele tenha negociado, ou alguém de sua família, vai ser investigado como todos os outros — disse o procurador da República Carlos Fernando Lima.
— Há indicativos que um tríplex pertence a ele (Lula), mas temos de avançar na investigação — disse o delegado Igor de Paula, coordenador da investigação da Lava- Jato na PF. Para o procurador, houve interesse especial da OAS para concluir os apartamentos do Solaris.
Ontem, após deflagrada a operação, Lula reproduziu nas redes sociais trecho do que disse em entrevista a blogueiros simpatizantes ao PT na semana passada: “Gosto de ser provocado”.
Lula diz que não ocultou patrimônio
À noite, no Facebook, Lula disse que não foi sequer citado na decisão do juiz Sérgio Moro e repudiou tentativa de envolver seu nome em atos ilícitos investigados na Lava- Jato: “Lula nunca escondeu que sua família comprou, a prestações, uma cota da Bancoop, para ter um apartamento onde hoje é o edifício Solaris. Isso foi declarado ao Fisco e é público desde 2006. Ou seja: pagou dinheiro, não recebeu dinheiro pelo imóvel. Para ter o apartamento, de fato e de direito, seria necessário pagar a diferença entre o valor da cota e o valor do imóvel, com as modificações e acréscimos ao projeto original. A família do ex-presidente não exerceu esse direito. Portanto, Lula não ocultou patrimônio, não recebeu favores, não fez nada ilegal. E continuará lutando em defesa do Brasil, do estado de direito e da Democracia”.
O edifício Solaris foi transferido da Bancoop para a OAS em 2009 e já é alvo de investigações do Ministério Público de São Paulo. Pelo menos oito das 11 unidades sob suspeita do edifício à beira mar da praia de Astúrias, no Guarujá, seguem em nome da OAS, que descarta irregularidades e diz que ainda não conseguiu vendê-los.
Um relatório da PF anexado às investigações diz que há “manobras financeiras e comerciais complexas” envolvendo a OAS, a Bancoop e pessoas vinculadas ao PT, e que os apartamentos “podem ter sido repassados a título de propina pela OAS em troca de benesses junto aos contratos da Petrobras”. A OAS já teve seus principais executivos condenados na Lava- Jato por corrupção, e a Bancoop é investigada em São Paulo por estelionato contra os cooperados, que teria sido praticado por Vaccari e pelo ex- presidente da empreiteira, Léo Pinheiro.
Além do tríplex reservado a Lula, que ficaria na unidade 164- A, de frente para a praia das Astúrias, outros dois apartamentos estão em nome de Simone Godoy ( 133- A), mulher do ex-assessor especial da Presidência da República no governo Lula Freud Godoy; e de Sueli Falsoni Cavalcante ( 43- A), funcionária da construtora. Para os investigadores da Lava- Jato, o apartamento de Sueli seria o destinado a Vaccari e já teria, inclusive, sido declarado pela mulher dele, Giselda Rose Lima. A cunhada de Vaccari, Marice Correa de Lima, apontada pelo doleiro Alberto Youssef como a pessoa que coletava dinheiro de propina para o PT em nome de Vaccari, também aparece na lista de proprietários e declarou uma unidade em seu IR de 2010.
Em depoimento prestado em outubro do ano passado, Lenir Gushiken, ex- cunhada de Luiz Gushiken, morto em 2013, disse ter ouvido que o filho de José Genoino também teria apartamento no edifício. Por meio de um amigo, Ronan Kayano Genoino informou ao GLOBO que não tem apartamento no Guarujá. Disse ainda que sequer frequenta a cidade e que nenhum membro de sua família possui imóveis lá.
Marice comprou um apartamento da OAS e o revendeu mais caro para a própria construtora. Em seguida, a OAS o vendeu por menos do que teria pago à Marice. Para os investigadores, a manobra é indício de lavagem de dinheiro. Os advogados de Marice informaram que ela está fora do país e não vai comentar.
Na lista das 11 unidades do Solaris sob suspeita está um segundo tríplex, em nome da offshore Murray Holding, sediada em Nevada, nos Estados Unidos. O negócio é obscuro. A pessoa que aparece como intermediária na transferência do apartamento para a offshore é a publicitária Nelci Warken, uma das três pessoas presas ontem. Para os investigadores, ela não tem capacidade financeira para ser proprietária de imóveis com valores que alcançam mais de R$ 5 milhões e pode ter servido como “laranja”. Dona de várias empresas, Nelci também prestou serviços para a Bancoop.
Na investigação para identificar os reais beneficiários da Murray, a Lava- Jato chegou ao escritório Mossack & Fonseca, com sede no Panamá e filial em São Paulo, responsável pela abertura de centenas de offshores usadas para lavagem de dinheiro. Entre elas, seis já foram identificadas como repassadoras de propina da Petrobras. Das seis pessoas que tiveram prisão temporária decretada pela Justiça, três estão no exterior e são vinculadas ao escritório.
Segundo a PF, foi montada uma estrutura criminosa destinada a oferecer a investigados da operação a abertura de empresas offshores e contas no exterior para ocultar dinheiro desviado em corrupção, “notadamente recursos oriundos de delitos praticados no âmbito da Petrobras”. Além de Nelci, foram presos Ricardo Onório Neto, sócio da Mossack, e Renata Pereira Brito, funcionária ligada à empresa. A PF levou coercitivamente para prestar depoimento Eliana Pinheiro de Freitas, suspeita de ser laranja no esquema, e o venezuelano Rodrigo Andres Uesta Hernandez, funcionário da Mossack.
O principal interlocutor de Nelci no escritório era Ademir Auada, que está fora do país. Sua família não quis comentar. Morador de São Bernardo do Campo, ele é acusado de destruir documentos junto com a filha, antes de uma ação da PF.
Em nota, a Bancoop disse sobre o Solaris que “por deliberação coletiva dos respectivos cooperados, adotada em assembleia realizada em 27 de outubro de 2009 e confirmada pela adesão individual de cada cooperado, o empreendimento foi transferido à construtora OAS”.
Nenhum comentário:
Postar um comentário