• A eleição deu mais visibilidade aos chamados conservadores, e significou um passo rumo a um quadro político mais diversificado, à disposição dos eleitores
Herança da Revolução Francesa, em que, no salão da Assembleia Nacional, os liberais girondinos se colocavam à direita, e os radicais jacobinos, à esquerda, os dois termos seguem, pelos séculos, a designar aqueles que querem preservar o estabelecido, em oposição aos transformadores pelos votos ou armas.
A fundação da União Soviética, à esquerda, instituiu a antítese dos Estados Unidos, capitalista, e ali foram lançadas as fundações da Guerra Fria do pós-guerra. Para embaralhar conceitos simplistas, o nazifascismo, aliado do Japão imperial, era extrema-direita, mas queria destruir os Estados Unidos, hoje chamados de “fascistas” pela ultraesquerda. Mas nazifascistas foram os alemães, os italianos e os japoneses, derrotados pela ação decisiva americana.
Na Guerra Fria, direita e esquerda eram conceitos bem definidos. Com a queda do Muro de Berlim, as cartas foram novamente embaralhadas. Afinal, o capitalismo, “a direita”, passou a ser adotado pelas peças que desmoronaram da União Soviética, a “esquerda”: Rússia e ex-satélites.
No Brasil, a ditadura militar facilitava os rótulos: esta, de direita; na oposição, liberais, sociais-democratas e vários matizes da esquerda. Veio a redemocratização, sociais-democratas como os tucanos do PSDB viraram de “direita”, na boca dos militantes do PT, líder da esquerda até começar a atolar na corrupção. Agora, aí está o PSOL a disputar o espólio imaginário petista do início do partido.
Na realidade, 227 anos depois da Revolução Francesa, os conceitos “direita” e “esquerda” são cada vez mais geográficos e menos ideológicos. O bolivarianismo chavista é de esquerda? Depende. Não, se for considerado de direita todo ato autoritário, ditatorial, violento. E sim pelos que consideram qualquer meio válido para se atingir o fim da melhoria das condições de vida do pobre. Não é o caso da Venezuela, onde a pobreza e a miséria avançam.
Referências herdadas do final do século XVIII parecem insuficientes para se avaliar como positiva esta ou aquela corrente de pensamento. No Brasil, por exemplo, acabada a ditadura militar, ninguém aceitava ser chamado de direitista. Para os menos avisados, o Brasil parecia um país só com “esquerdas”. Para complicar, Lula assumiu e, ao praticar radical fisiologismo, fez alianças à “direita”, sem pudor e preocupação com planos e projetos de governo. Salvo o projeto pessoal e de poder.
Sai deste primeiro turno das eleições municipais um fato alvissareiro: uma representação assumidamente conservadora, de “direita”. Já existia, é certo. O deputado federal Jair Bolsonaro (PSC-RJ), é sua figura mais conhecida. No Rio, um dos filhos, Flávio, ficou em quarto lugar na corrida para prefeito, atraindo 14% dos votos, mais do que previam as últimas pesquisas. O irmão dele, Carlos, reelegeu-se vereador pela quinta vez, com a maior votação do pleito — 106.657 eleitores o sufragaram, 3,67% dos votos totais.
Dos movimentos que foram às ruas pedir o impeachment de Dilma, na esteira das passeatas espontâneas de 2013, também se elegeram vereadores. Naquele ano, os protestos convocados pelas redes sociais contra a qualidade dos serviços públicos quebraram o histórico monopólio de forças esquerdistas nas manifestações de rua. E não foram partidárias.
Depois de 31 anos do fim da ditadura militar, a direita se assume em atos ao ar livre e pede votos. Melhor para o país. É preciso que as forças e correntes políticas disputem votos, de maneira franca, obedecida, sempre, a Constituição.
Este é um ponto-chave: a aceitação das regras do jogo democrático, seja a pessoa de “direita” ou de “esquerda”. O poder público demonstra ter condições de proteger o estado democrático de direito, mesmo quando seus inimigos são os poderosos da vez. Os mais conservadores conquistam votos, assim como já ocorreu com os ditos progressistas. Que se digladiem, no melhor sentido do termo, nas urnas e espaços legislativos, dentro das regras constitucionais da democracia representativa. Passou mesmo o tempo de se ganhar na marra.
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