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Está com Bolsonaro a memória eletrônica da portaria do condomínio
Verdade que o Procurador-Geral da República Augusto Aras é contra federalizar as investigações sobre a morte da vereadora Marielle Franco. Segundo ele, não passou de um “factoide” logo arquivado a história de que Jair Bolsonaro, no dia do crime, autorizou a entrada em sua casa no Rio de um dos supostos assassinos.
Mas Sérgio Moro, que nunca comentara nada sobre a morte de Marielle nem à época de juiz em Curitiba nem como ministro da Justiça, pediu que as investigações fossem transferidas do Rio para Brasília. Ali, naturalmente, ficariam aos cuidados da Polícia Federal, subordinada ao seu ministério. Sujeito esperto!
Se crescerem as suspeitas de que foi com Bolsonaro que o porteiro falou e não com o ex-policial Ronny Lessa, acusado de matar Marielle e também morador do condomínio, aí as investigações irão bater em Brasília, e ali chegando, paralisadas por força da lei. Só seriam retomadas depois do fim do mandato de Bolsonaro.
O presidente da República parece muito interessado em que assim seja. Sem que ninguém o obrigasse, ele disse ontem, textualmente: “Nós pegamos [as gravações da portaria do condomínio] antes que elas fossem adulteradas ou que tentassem adulterar. Pegamos toda a memória da secretária eletrônica”.
Alô! Alô! O inquérito sobre a morte de Marielle não corria em segredo de Justiça? As gravações não poderão servir como provas ou evidências de fatos investigados? Não caberia somente à Polícia e ao Ministério Público ter acesso a elas? Isso não caracterizaria crime de tentativa de obstrução de Justiça? Juristas à beça acham que sim.
Por muito menos, em novembro de 2015, Delcídio do Amaral (PT-MS), então líder do governo Dilma no Senado, foi preso por ordem do Supremo Tribunal Federal, acusado de atrapalhar a Lava Jato. No mesmo dia, por 59 votos a 13, o Senado manteve a prisão. Depois de 80 dias detido, Delcídio voltou ao Senado e acabou cassado.
É uma lambança só o inquérito sobre o assassinato de Marielle. As gravações da secretária eletrônica do condomínio onde Bolsonaro e Lessa eram quase vizinhos foram copiadas pelos Bolsonaros, mas não foram periciadas pelo Ministério Público. A promotora que disse que o porteiro mentiu era bolsonarista de raiz.
Por que um porteiro se meteria numa encrenca só pelo prazer de mentir? No dia em que um dos suspeitos de matar Marielle pediu licença para ir à casa de Bolsonaro, a vereadora estava viva e Bolsonaro não era candidato a presidente. Por que em dois depoimentos o porteiro disse que “seu Jair” autorizou a entrada?
Por que o porteiro afirmou que, ao ser informado de que o visitante se dirigia para outra casa, “seu Jair” respondeu que estava tudo okey? E por que anotou no livro de registros do condomínio que o visitante pedira para ir à casa de Bolsonaro e não de Lessa? Toda essa história está mal contada e o risco é de que permaneça assim.
Tem uma foto onde Bolsonaro aparece ao lado do homem que pediu para visitá-lo no dia do crime, e que depois pilotou o carro que levou Lessa ao encontro de Marielle. Um dos filhos de Bolsonaro namorou uma filha de Lessa. Flávio Bolsonaro homenageou Lessa e outros milicianos. A família sempre teve fortes ligações com essa gente.
Há 600 dias, a serem completados amanhã, Marielle foi executada a tiros no centro do Rio. Quem a matou? Quem mandou matá-la? Quem tentou encobrir o crime e por quê? Onde está o porteiro?
Por que te calas, Toffoli?
Covardia ou outro golpe à vista?
Em menos de sete dias, o Supremo Tribunal Federal foi alvo de duas graves ofensas – uma direta, mais direta impossível; outra indireta que atingiu sua condição de fiel defensor das leis.
Em vídeo postado no Twitter, o presidente Jair Bolsonaro comparou-se a um leão ferido e a outro em boa forma. E comparou o Supremo a uma hiena, animal de péssima reputação.
O que disse Toffoli na ocasião? Nada. Se os ministros Celso de Mello, o mais antigo da Corte, e Marco Aurélio Mello não saíssem em defesa da imagem do tribunal, teria ficado por isso mesmo.
Em entrevista de larga repercussão à jornalista Leda Nagle, o deputado Eduardo Bolsonaro sugeriu a adoção de um “novo” Ato Institucional nº 5 caso o Brasil entre em convulsão social.
Não há o mínimo sinal de que entrará. O AI-5 foi o ato usado pela ditadura militar de 64 para tirar a máscara. Tirou também a vida de centenas de opositores do regime e estimulou a tortura.
Nunca a fala de um dos filhos de Bolsonaro provocou tmanha indignação em todos os escalões da sociedade brasileira. A reprovação foi gigantesca e ele teve de pedir falsas desculpas.
O que disse Toffoli, o presidente do Supremo Tribunal Federal? A resposta de Toffoli foi o silêncio. Outra vez foram Celso e Marco Aurélio que falaram pelo tribunal.
Ao assumir a presidência do Supremo há pouco mais de um ano, Toffoli pôs um general como assessor para fazer o meio de campo entre ele e as Forças Armadas. Mais tarde, o assessor foi embora.
Quem faz agora o meio de campo para Toffoli é o ministro da Defesa, o general Fernando Azevedo e Silva. Toffoli acha que conseguiu abortar, há meses, um golpe que só ele pressentiu.
Assessores justificam seu estranho silêncio com a desculpa de que ele está pronto para quebrá-lo na hora que votar pelo fim da prisão em segundo instância, o que poderá acontecer esta semana.
Mas o que uma coisa tem mesmo a ver com a outra? Por acaso os militares se rebelarão se a prisão em segunda instância acabar? Toffoli enxerga outra possível ameaça de golpe no horizonte?
Responda, ministro! Responda. Os brasileiros têm o direito de saber.
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