- O Globo
Ao mesmo tempo em que garante, também na tribuna da ONU, que o Brasil é o país
que mais preserva o meio ambiente historicamente, Bolsonaro coloca em dúvida os
dados brasileiros sobre o desmatamento coletados pelo Instituto Nacional de
Pesquisas Espaciais (Inpe) e manobra para transferir o acompanhamento das
queimadas para o Exército.
Já estamos há mais de um ano com números crescentes de desmatamento na
Amazônia, e o vice-presidente, Hamilton Mourão, que comanda o Conselho da
Amazônia, desconfia que os dados são divulgados por algum inimigo interno do
governo, para desmoralizá-lo, mesmo sendo eles públicos. Em acordo com o
ministério da Defesa, houve a inclusão no orçamento de verba de R$ 145 milhões
para comprar um novo satélite, para fazer o mesmo acompanhamento que é feito
pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), cujo orçamento vem sendo
desidratado.
O Centro Gestor e Operacional do Sistema de Proteção da Amazônia (Censipam)
faria o acompanhamento do desmatamento, aglutinando os dados de vários órgãos.
No Inpe, uma reorganização interna leva a que se tema o esvaziamento do órgão.
O que o governo parece desconhecer, ou não levar em conta, é que dados que
vierem de uma reorganização desse setor estarão marcados pela desconfiança,
pois o Inpe é reconhecido internacionalmente por sua qualidade técnica.
Assim como estão marcadas as palavras do presidente Bolsonaro em seu discurso
na ONU, onde descreveu uma realidade paralela que é rejeitada pelos
interlocutores internacionais.
Horas depois de seu discurso na ONU, os ministérios das Relações
Exteriores e da Agricultura tiveram que divulgar uma nota defendendo a entrada
em vigor do acordo entre o Mercosul e a União Européia (UE), que está sendo
bombardeada pela França.
Assim como o presidente fez em seu pronunciamento, a nota oficial aponta
"reais preocupações protecionistas” dos que encomendaram o relatório,
temendo a competição com a carne brasileira por causa das concessões feitas
pela União Européia ao Mercosul. Na nota conjunta, os números são de 2004 a
2012, e mostram que o desmatamento da região nesse período caiu enquanto que a
produção agrícola subiu, e o rebanho bovino cresceu em mais de 8 milhões de
cabeças, chegando a 212 milhões em 2012.
De fato, o Brasil tem historicamente tido uma política ambiental condizente com
a necessidade de reduzir o desmatamento, aumentando a produtividade através de
inovações tecnológicas, mas o atual governo tem sido leniente com as ações
ilegais na região.
Saiba mais: Confira as contradições do discurso
de Bolsonaro na ONU
Reduziu a verba para fiscalização, mudou conceitos de exportação de
madeira alegando desburocratização no processo, mas, de fato, retirando do
Ibama a capacidade de fiscalização, afrouxou regulamentos que protegiam as
áreas indígenas, enfim, uma boiada e tanto vem sendo passada, como o ministro
Ricardo Salles preconizou naquela famigerada reunião
ministerial.
O aumento do desmatamento e a política de direitos humanos em relação aos povos
indígenas provocaram carta de um grupo de investidores internacionais, que gere
US$ 3,75 trilhões, a seis embaixadas brasileiras na Europa, além de Estados
Unidos e Japão. Nela, advertiram que o que classificam de “desmantelamento” de
políticas ambientais e de direitos humanos poderá levar empresas expostas a
eventual desmatamento em suas operações no Brasil e cadeias de fornecedores a
enfrentar dificuldade crescente para acessar os mercados internacionais.
Ontem, esses mesmos empresários criticaram a fala de Bolsonaro na ONU,
afirmando que esperam medidas concretas que demonstrem uma mudança de atuação.
É provável que a situação se agrave com a União Europeia se juntando aos
Estados Unidos na questão ambiental com o democrata Joe Biden derrotando Trump
nas próximas eleições presidenciais.
No discurso de abertura da Assembleia da ONU, o presidente Bolsonaro não falou
nada que pudesse aumentar o atrito com a Europa, mas repetiu todas as
falácias que já são sua marca internacional.
Nenhum comentário:
Postar um comentário