Com
ações arrojadas, podemos pensar em reeditar o caso de sucesso do agronegócio
O
Brasil vem assistindo há décadas a um forte movimento de desindustrialização,
fenômeno que, infelizmente, tem graves consequências para a sociedade. Fonte de
emprego e renda, a indústria tem apresentado retração sistêmica. Se em meados
de 1980 sua participação no PIB acional estava na casa dos 35%, hoje atinge
apenas 11%.
A
fuga de multinacionais se intensificou e os brasileiros têm sentido o impacto
na pele. A mais recente e emblemática saída de cena foi a da Ford, que deixa só
na região de Camaçari (BA) cerca de 12 mil desempregados. Tranco muito duro num
momento de dificuldades econômicas e sociais aprofundadas pela covid-19.
Se quisermos um futuro diferente, é necessário analisar o passado para não cometer os mesmos equívocos que assolam o presente. Insegurança jurídica, sistema tributário caótico e falta de infraestrutura, como portos, aeroportos, rodovias, ferrovias, energia e telecomunicações, entre outros, criaram um ambiente de negócios inadequado. O custo Brasil é alto. Soma-se a isso a carência de educação básica e de ensino profissionalizante adequados. Os gargalos estão escancarados e o País precisa resolvê-los urgentemente.
Não
podemos acomodar-nos diante dos entraves. Precisamos de mais olhares, para o
agora e para o amanhã. Mesmo diante deste quadro de muitos obstáculos, há
exemplos na indústria brasileira, hoje, que podem iluminar bons caminhos. Além
disso, eclode nos quatro cantos do planeta um forte movimento de retomada
econômica verde, acelerado por aprendizados oriundos desta pandemia.
Trata-se
de um terreno fértil para o Brasil. Especialmente levando em consideração que o
País tem a maior floresta tropical e a maior biodiversidade do planeta,
concentra 12% da água doce do mundo e tem uma matriz energética diferenciada,
com fontes renováveis representando 45% do total.
Para
que o trabalho em sinergia com a natureza se transforme em produtos
sustentáveis nas mãos dos consumidores temos um elo importante: a indústria.
Nesse sentido, precisamos saber usufruir todas as nossas vocações e
potencialidades naturais.
Marco
zero para um recomeço é investir consistentemente em inovação. Não só no
sentido financeiro. Estabelecer parcerias com Academia, institutos de pesquisas
e startups é um dos
pilares para dar esse salto. Essa é uma das vias para que produtos ganhem
competitividade internacional. E também uma receita já experimentada no nosso
próprio país.
A
companhia WEG, por exemplo, vem aliando inovação e competitividade para
consolidar sua atuação em mais de 30 países. Seu recente lançamento é um
aerogerador para energia eólica capaz de abastecer até 11.200 casas, com ganho
de mais de 80% em relação a modelos anteriores. Projeto desenvolvido por
equipes sediadas em diferentes locais do mundo, como EUA, Brasil, Alemanha e
Índia.
Já
a CBMM está aplicando tecnologia e pesquisas para fabricar produtos ligados ao
nióbio em áreas como infraestrutura, mobilidade e energia. Há mais de 80
jazidas desse minério no mundo, mas a empresa se destaca, o que revela que não
é somente a riqueza natural do País que provê vantagens competitivas. Exemplo é
a criação de uma bateria que utiliza óxido de nióbio. Parcerias com institutos
e a Academia, um time de 11 pesquisadores dedicados ao projeto e dois
laboratórios construídos para esse fim, vêm desenvolvendo uma solução que
enderece desafios como desempenho, durabilidade e segurança.
O
setor de árvores cultivadas, uma agroindústria imersa na bioeconomia, cresce
ano após ano. O estopim para atingir o sucesso foi a introdução do eucalipto e
a aplicação de pesquisa no cultivo. Se na década de 1970 a produtividade
rondava os 10 m³ por hectare/ano, em 2020 chegou a mais de 35 m³ hectare/ano,
fruto de ciência. Esse é um dos fatores que permitiram que a produção de
celulose saltasse de 777 mil toneladas naquela época para 21 milhões em 2020 –
15 milhões de toneladas foram comercializadas com outros países, chancelando o
País como o maior exportador mundial da matéria-prima.
Importante
lembrar experiência bem-sucedida da indústria de etanol. Além ser a segunda
maior produtora do biocombustível do mundo a partir de cana-de-açúcar, inovou
recentemente e, por meio da Raízen, exportou tecnologia para produção do etanol
de segunda geração.
Mesmo
com um cenário recheado de entraves, há caminhos para avançar. Pontos em comum
entre todos os cases citados: inovação, busca por competitividade, escala e
internacionalização. Assim, temos dois caminhos a seguir: continuar no ciclo do
insucesso, em que Brasília é vista como o único bote de salvação, ou mirar nos
exemplos industriais bem-sucedidos e na agenda modernizante do País.
Seguindo
um novo rumo, podemos pensar em reeditar, na indústria, o caso de sucesso do
agronegócio. Há 50 anos o Brasil importava comida e hoje alimenta quase 1
bilhão de pessoas no mundo. É possível. Mas para isso precisamos efetivar ações
arrojadas para a superação deste quadro de desindustrialização.
*Economista, presidente executivo da Indústria Brasileira de Árvores (IBÁ), membro do Conselho do Todos pela Educação, foi governador do Estado do Espírito Santo (2003-2010 e 2015-2018)
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