O Globo
Como lidar ou, se quiserem, como reagir ao
presidente Bolsonaro? É mais fácil dizer o que não se deve fazer: bater boca
com ele. Essa é a casa dele.
Alguns sugerem não fazer nada: deixem ele
falar sozinho com a turma do cercadinho.
Não é boa ideia. Afinal, o cara é
presidente eleito com 57,7 milhões de votos. Não se pode dizer que sejam todos
fiéis. Muita gente, a maioria, acredito, votou nele considerando a opção melhor
ou menos ruim, de modo que depositaram um mínimo de confiança em sua
capacidade.
Nesse pessoal, é possível que cole a
questão do voto impresso. Qual o problema, dirão, de tirar um print do voto?
Por isso, fez muito bem o Tribunal Superior
Eleitoral ao responder, on-line, em tempo real, às mentiras que Bolsonaro foi
espalhando na live da última quinta-feira. O TSE ocupou espaço nas redes
sociais — território bolsonarista — e deu argumentos técnicos, detalhados,
contra as fake news. Mostrou que uma urna cheia de papeizinhos impressos é mais
vulnerável a roubos de toda espécie do que a urna eletrônica.
Portanto temos aqui uma linha de resposta.
Não cair na armadilha do bate-boca, mas responder com serenidade, mostrando
fatos, sem exclamações.
Isso vale especialmente para a imprensa
independente. E é o que temos procurado fazer aqui, no Grupo Globo. Os leitores
não imaginam o tempo e os recursos que usamos para checar e rechecar as falas
do presidente e sua turma.
Lógico, há uma parte dos eleitores de Bolsonaro — os fiéis dos cercadinhos — que nem sequer se inteira do que se publica na imprensa independente. Vive, como seu chefe, no mundo das fake news da internet.
Serão quantos? Vinte e cinco por cento do
eleitorado?
Varia, é claro, conforme as circunstâncias.
Por exemplo: economistas, cientistas políticos, políticos profissionais, de
variadas tendências, acham que Bolsonaro pode ter um bom momento no ano que
vem, se a vacinação estiver bem avançada e a economia em recuperação.
Ou seja, a reação — serena, técnica — ao
comportamento do presidente deve ser permanente e diária.
Mas e a outra parte da história? Os danos
que a gestão Bolsonaro causa ao país, às instituições e ao serviço público?
Isso vai desde as ofensas e ataques ao
sistema democrático (as ameaças de golpe) até o desleixo e a corrupção na
compra de vacinas. Podem-se incluir aqui as coisas aparentemente menores, como
o incêndio na Cinemateca ou a paralisação da Plataforma Lattes, do CNPq. Nesses
dois casos, é evidente a péssima administração dos órgãos federais. A
Cinemateca está sem gestor há meses. No dia do incêndio, o governo lançou
edital para contratar. É uma confissão, não é mesmo?
Então temos: ameaças à estabilidade
institucional; ataques à liberdade de imprensa; vidas perdidas por falta de
vacinas e políticas sanitárias nacionais; e desastres administrativos, com
danos à população e ao interesse público.
Resumo da ópera: responder é bom e
importante, mas não basta. Certamente, há crimes nesse desempenho presidencial.
O que nos leva ao grande problema atual.
Ministério Público, Polícia Federal,
Ministério da Justiça — instituições que poderiam investigar e representar
contra o presidente — estão devidamente aparelhados. O Congresso está
controlado pelo Centrão, que pouco se lixa para as questões da democracia e das
instituições. Seus chefes só não querem um golpe militar, porque isso, ao menos
temporariamente, tiraria poder dos políticos.
Um Bolsonaro que entrega cargos e dinheiro
está mais que bom.
Sobram a imprensa independente,
governadores, prefeitos e parlamentares de oposição e o Supremo Tribunal
Federal.
Sim, sobra Lula também, mas ele quer que
Bolsonaro fique assim mesmo até as eleições, para polarizar fácil. Deveria
pensar mais no país do que em si mesmo, mas isso não vai acontecer.
Tem também a CPI da Covid, mas que demora e
poderá não chegar diretamente a Bolsonaro.
Então, quem vai apanhar e punir os crimes do presidente?
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