O Globo
Bolsonaro é resiliente, mas não tem um
partido para chamar de "seu"
O presidente Bolsonaro demonstrou em diversas
oportunidades ser resiliente, recuperando-se de situações políticas
embaraçosas, como quando foi obrigado a entregar o Orçamento nas mãos do
presidente da Câmara, Arthur Lira, para sobreviver a um possível impeachment.
Parecia um “pato manco”, mas sua prioridade nunca foi gerir o país, e sim atuar
em setores ideológicos específicos, como costumes, religião, armamentos.
Dedicou-se a esses temas por meio das redes sociais e de suas lives e formou
uma base de apoio que se mostrou forte na eleição presidencial.
Quando todos achavam que o Centrão o abandonaria, conseguiu mantê-lo unido em torno de sua candidatura, que, devido também ao abuso do poder econômico, mostrou-se mais competitiva do que parecia. “Pato manco” (lame duck) é uma expressão usada principalmente na política norte-americana. Define o político que continua no cargo, mas perde a expectativa de poder.
A expressão nasceu na Bolsa de Valores de
Londres, no século XVIII, em referência a um investidor que não pagou suas
dívidas, e ficava exposto à pressão dos credores. A ave (e o político) com
problemas torna-se presa fácil dos predadores.
Quando se dizia que o café de Bolsonaro já
era servido frio no Palácio do Planalto, um sintoma nacional da perda de poder,
ele conseguiu mobilizar os militares na sua luta ridícula contra as urnas
eletrônicas. Agora usa o PL de Valdemar Costa Neto para tentar reverter o
resultado da eleição. Ainda tem bala na agulha para mobilizar apoiadores em
atos ilegais, com a leniência dos militares e de outros órgãos policiais.
Nossa sorte é que todas as tentativas de
anular a eleição e de disseminar suspeição sobre as urnas eletrônicas têm sido
tão patéticas, que caem no ridículo. É o caso do PL agora, que está numa
situação delicada, pois, para colocar em xeque a lisura das urnas eletrônicas,
teria de pedir também que o resultado do primeiro turno da eleição, realizado
nas mesmas máquinas, fosse revisado. O PL elegeu uma superbancada de 99
deputados federais, que não querem saber de revisão.
É politicamente inviável, e o presidente do
Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ministro Alexandre de Moraes, acertou em
cheio ao exigir que o partido inclua na petição inicial também as urnas do
primeiro turno. Como não o fará, a ação será recusada de cara. É mais uma
tentativa malfeita, como o relatório do Ministério da Defesa que admite não ter
sido encontrado nenhuma falha nas urnas eletrônicas, mas sem afirmar que elas
não existam.
Não há nenhuma base real para essa ação do
PL, nem mesmo um relatório circunstanciado da auditoria independente. As
explicações técnicas que derrubam os argumentos do pedido de anulação de
milhares de urnas, que alegadamente daria a vitória a Bolsonaro, já estão dadas
de antemão.
A única razão para levantar tantas
suspeitas fáceis de desmentir é incentivar os militantes que estão acampados,
bloqueando estradas, pedindo intervenção militar e anulação da eleição. A
situação se resolverá inevitavelmente, porque daqui a menos de 30 dias Lula, o
presidente eleito, anunciará os comandantes militares das três Forças Armadas e
o ministro da Defesa. A partir daí, eles integrarão o novo governo e não
poderão, portanto, ser lenientes, como os atuais estão sendo, com essas
manifestações antidemocráticas.
Terão que reprimi-las —porque são ilegais.
Imaginemos a situação inversa: Bolsonaro eleito e petistas acampados em frente
aos quartéis, com suas bandeiras vermelhas, exigindo a anulação da eleição. Já
estariam todos na cadeia, acusados de subversivos. É desagradável ter uma
oposição que não atua no campo democrático do Congresso e jogue na tentativa de
anular a eleição.
Não tem sentido uma atitude desta numa
democracia. Houve o caso do candidato tucano Aécio Neves no PSDB, que entrou
com denúncia no TSE depois de derrotado por Dilma Rousseff na eleição
presidencial de 2014. Mas o partido seguiu no jogo, não houve acampamentos de
militantes nem bloqueios de estradas. O próprio PT, que pediu o impeachment de
Fernando Henrique logo no primeiro minuto de jogo, restringiu-se a uma
participação negativa no Congresso, recusando-se a assinar a Constituição de
1988 e sendo contrário ao Plano Real, entre outras atitudes nefastas.
O tipo de oposição que Bolsonaro fomenta
vive de não reconhecer o governo e é um problema institucional sério, que terá
de ser resolvido na base da política. Acho difícil que ele consiga manter
dentro do Congresso essa atitude de negação. Não há dúvidas de que seja um bom
cobrador. Mas a fila anda, e Bolsonaro não tem um partido para chamar de seu.
2 comentários:
"devido também ao abuso do poder econômico,"
" mobilizar os militares na sua luta ridícula contra as urnas eletrônicas"
"usa o PL de Valdemar Costa Neto para tentar reverter o resultado da eleição."
"tem bala na agulha para mobilizar apoiadores em atos ilegai"
"incentivar os militantes que estão acampados, bloqueando estradas, pedindo intervenção militar e anulação da eleição."
Merval, Mer-val, tudo isso é crime.
E a relação continua.
Merval não perde a chance de cutucar o PT.Gostaria que ele alfinetasse também o PSDB de FHC.
Postar um comentário