sábado, 20 de dezembro de 2025

A blindagem do Supremo. Por Ana Luiza Albuquerque

Folha de S. Paulo

Eventuais excessos durante o governo Bolsonaro poderiam se justificar diante de um momento agudo de ascensão autoritária, mas o cenário hoje é outro

Tentativas de blindagem da corte podem agravar a crise de confiança nas instituições e, por consequência, colocar em risco a própria democracia

O Poder Judiciário é um bastião fundamental contra avanços autoritários.

Por vezes, porém, como no Brasil, a missão foi exercida com atos que extrapolaram as prerrogativas ou que fugiram do rito processual. Está longe do ideal que um magistrado julgue fatos em que figura como personagem, como foi com o ministro do STF Alexandre de Moraes e o plano Punhal Verde e Amarelo.

Ainda assim, pode-se argumentar que o país passava por um momento de crise democrática aguda e que, fazendo valer o sistema de freios e contrapesos, a Suprema Corte respondeu aos excessos do Executivo diante de um Procurador-Geral da República omisso.

A situação era tão grave que, no segundo turno, a PRF montou um esquema de blitze para impedir que eleitores de Lula votassem. Então diretor da corporação, Silvinei Vasques havia pedido votos para Jair Bolsonaro. Na última semana, ele foi condenado pelo Supremo pelo ato desavergonhadamente antidemocrático.

O momento, porém, felizmente passou. Não há hoje uma ameaça iminente que justifique excessos do Supremo. Permanecem intactas as condições sociais e políticas que permitiram a ascensão do autoritarismo, mas não é papel da Suprema Corte tratá-las.

A defesa da democracia não pode ser pretexto para propostas desarrazoadas como a do ministro Gilmar Mendes, que tentou limitar na canetada processos de impeachment contra integrantes da corte.

Também não pode servir para blindar o Judiciário do escrutínio público. Especialmente diante de fatos preocupantes, como a viagem do ministro Dias Toffoli em um jato particular ao lado do advogado de um dos diretores do Master e a contratação pelo banco do escritório da família de Moraes por R$ 3,6 milhões mensais.

Um código de ética seria bem-vindo para combater a crise de confiança nas instituições. Segundo o Datafolha, 35% consideram ruim ou péssimo o desempenho do Supremo. São as mesmas pessoas que, descrentes do sistema, estão dispostas a abraçar personagens autoritários como Bolsonaro.

 

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