sexta-feira, 17 de abril de 2009

Crise, um biombo

EDITORIAL
DEU EM O GLOBO

O que era “marola” virou “tempestade” e o governo dá a entender que encontrou uma justificativa sob encomenda para abrir cada vez mais os cofres públicos. O motivo declarado é a “crise”, mas o tamanho das cifras dos gastos é tal que o Planalto não consegue disfarçar o sentido eleitoreiro de uma série de medidas anunciadas como “anticíclicas”.

É Keynes nos palanques.

O primeiro sinal mais forte de que a política eleitoral passou a mover o governo em decisões destinadas formalmente a se contrapor a pressões recessivas foi emitido na garantia aos municípios de que eles terão no mínimo um repasse anual de R$ 53,1 bilhões, mesmo volume de dinheiro de 2008, quando a arrecadação foi recorde — um desatino fiscal, devido à queda de arrecadação verificada desde fins do ano passado. E algo semelhante poderá ser concedido nos repasses federais aos estados. Pelo menos, governadores também aproveitam a evidente subordinação da política econômica às urnas de 2010 para reivindicar.

Com a retirada da Petrobras do esforço fiscal para a acumulação do superávit primário — decisão acertada em hora inadequada —, o Planalto conseguiu realizar o desejo de sua ala “desenvolvimentista”: reduziu a meta do superávit de 3,8% do PIB para 2,5% e passou a ter disponíveis mais R$ 40,2 bilhões para gastos.

São — ou seriam — recursos preciosos para investimentos na infraestrutura precária do país. O sentido eleitoreiro que passou a condicionar as ações oficiais não alimenta grandes esperanças.

Mesmo porque a já proverbial incapacidade de o Planalto fazer o PAC andar certamente induzirá Lula a queimar esse dinheiro em boa parte no custeio. Um dado revelador: no primeiro trimestre, o governo conseguiu executar apenas 7,5% do programa de investimentos do ano.

O autista projeto da Lei de Diretrizes Orçamentárias para 2010 não permite outra conclusão. Afinal, estão garantidos um aumento real para o salário mínimo — conforme regra ainda não aprovada pelo Congresso —, apesar do seu grande impacto na Previdência, e mais uma parcela de reajuste ao funcionalismo. Só para os servidores serão destinados R$ 40,1 bilhões, o equivalente a tudo que o Planalto conseguiu retirar do superávit primário ao reduzi-lo. E se o prometido ao funcionalismo para julho próximo for cumprido, metade do dinheiro do superávit irá para suas contas bancárias.

A crise é simples biombo para tentar encobrir uma enorme farra de gastança eleitoreira. Fica cada vez mais visível a herança maldita que Lula deixará para o próximo presidente.

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