Dora Kramer
DEU EM O ESTADO DE S. PAULO
O líder do governo no Senado, Romero Jucá, tem um bom dilema pela frente. Cotado para assumir o posto de relator da CPI da Petrobrás, o senador se adiantou à indicação oficial e não só aceita, como assegura total imparcialidade no exercício da função.
Essa é a parte mais fácil, a da mistificação. Frente a frente com a realidade, entretanto, Jucá terá de escolher: ou cumpre a promessa de ser imparcial e deixa a liderança do governo ou continua líder e deixa a imparcialidade para outra ocasião.
As duas mercadorias não cabem no mesmo pacote.
Tivesse a neutralidade a mais pálida intenção de comparecer às sessões da CPI, a escalação do comando não seria a que se cogita. A escolha do líder do governo equivale a uma assinatura de compromisso com o resultado.
O mesmo ocorre com a ideia de a senadora Ideli Salvatti, líder do governo no Congresso, ocupar a presidência da comissão. Se confirmada, esperemos que a bem da verdade se abstenha de firmar compromisso com a isenção.
Mais não seja, para que não se extrapolem os limites do razoável no quesito embromação.
Ideli e Jucá são cogitados exatamente para prestar serviço à parcialidade. São líderes de governo, nomeados pelo Planalto, e isso define os contornos da atuação que o governo espera de sua base de apoio e o peso dado ao potencial de dano da CPI.
Sobre a relatividade da garantia proporcionada pelo controle do comando de uma CPI já se escreveu à vasta. Há disponíveis exemplos de comissões supostamente controladas que saíram do controle, mas não há registro de CPI cujo êxito possa ser atribuído ao fato de o presidente ou o relator serem de oposição.
Portanto, perfeitamente entendido que dois governistas por si sós não fazem um verão.
Ocorre que a composição da CPI da Petrobrás está obedecendo a critérios mais rígidos. E inéditos. Nunca se viu governo algum pensar em deslocar seus líderes no Senado e no Congresso para a linha de frente desse tipo de combate.
Justamente para preservar o ofício da liderança, de um lado, e, de outro, evitar a explicitação da presença do Executivo na direção da CPI. Mas aqui não há essa preocupação. Importam menos as aparências que a essência.
E de essencial o que existe é o plano de fazer a CPI fracassar. Custe o que custar, doa a quem doer.
O Planalto está suficientemente escaldado com experiências anteriores para se dar ao desfrute de fazer concessões à figuração. O senador Delcídio Amaral, do PT, e o deputado Osmar Serraglio, do PMDB, governistas, credenciaram-se no quesito impessoalidade ao comandarem a CPI dos Correios, cujo relatório final serviu de base à denúncia da Procuradoria-Geral da República contra os acusados de participar do esquema do mensalão.
Pois Delcídio foi parar numa terceira suplência da CPI da Petrobrás e, fosse a comissão mista, o deputado Serraglio estaria fora, dado ter-se transformado em persona non grata nas hostes pemedebistas.
Os quatro senadores do PMDB que assinaram o requerimento da CPI - Jarbas Vasconcelos, Mão Santa, Geraldo Mesquita e Pedro Simon - nem sequer foram cogitados, embora tenham aptidões suficientes para participar. O problema é que seus atributos não são convenientes.
A tarefa adiante é dura, pesada e requer biografias compatíveis. Daí, a escalação da tropa de estiva comandada pelo líder do PMDB no Senado, Renan Calheiros, cuja influência na CPI se estende para além de seu partido.
E qual é o ofício? Simplesmente impedir que a CPI saia do lugar. Com o regimento interno na mão, uma ordem na cabeça, nenhum pudor nas faces e muita desfaçatez no espírito, a maioria tentará partir para a obstrução total: nada de requerimentos de informações (a não ser as irrelevantes), nada de depoimentos importantes, nada de quebra de sigilo. Nada de nada.
Brigas, desaforos, exacerbação artificial de ânimos, chicanas de toda sorte, isso haverá a mancheias, pois a meta é muita confusão e pouca investigação.
No Congresso, portanto, o campo está todo dominado.
Isso assegura a falência da CPI? Não necessariamente, porque a imprensa o governo não controla, embora tenha tentado exercer o domínio por meio do malfadado Conselho Federal de Jornalismo, que teria a função de fiscalizar, regulamentar e disciplinar o exercício da atividade.
Resolveria os problemas de azia que acometem o presidente Lula quando da leitura de jornais e poderia se arvorar a prerrogativa de considerar qualquer notícia mais embaraçosa sobre os meios e modos de administração da Petrobrás um ato de lesa-pátria a ser combatido a bem da soberania nacional.
Cão que ladra
A emenda que autoriza à disputa do terceiro mandato faz barulho, mas não morde. Se alguém porventura quiser que morda, precisará atuar à luz do dia porque casuísmo não sobrevive sem dono nem prospera no escuro.
DEU EM O ESTADO DE S. PAULO
O líder do governo no Senado, Romero Jucá, tem um bom dilema pela frente. Cotado para assumir o posto de relator da CPI da Petrobrás, o senador se adiantou à indicação oficial e não só aceita, como assegura total imparcialidade no exercício da função.
Essa é a parte mais fácil, a da mistificação. Frente a frente com a realidade, entretanto, Jucá terá de escolher: ou cumpre a promessa de ser imparcial e deixa a liderança do governo ou continua líder e deixa a imparcialidade para outra ocasião.
As duas mercadorias não cabem no mesmo pacote.
Tivesse a neutralidade a mais pálida intenção de comparecer às sessões da CPI, a escalação do comando não seria a que se cogita. A escolha do líder do governo equivale a uma assinatura de compromisso com o resultado.
O mesmo ocorre com a ideia de a senadora Ideli Salvatti, líder do governo no Congresso, ocupar a presidência da comissão. Se confirmada, esperemos que a bem da verdade se abstenha de firmar compromisso com a isenção.
Mais não seja, para que não se extrapolem os limites do razoável no quesito embromação.
Ideli e Jucá são cogitados exatamente para prestar serviço à parcialidade. São líderes de governo, nomeados pelo Planalto, e isso define os contornos da atuação que o governo espera de sua base de apoio e o peso dado ao potencial de dano da CPI.
Sobre a relatividade da garantia proporcionada pelo controle do comando de uma CPI já se escreveu à vasta. Há disponíveis exemplos de comissões supostamente controladas que saíram do controle, mas não há registro de CPI cujo êxito possa ser atribuído ao fato de o presidente ou o relator serem de oposição.
Portanto, perfeitamente entendido que dois governistas por si sós não fazem um verão.
Ocorre que a composição da CPI da Petrobrás está obedecendo a critérios mais rígidos. E inéditos. Nunca se viu governo algum pensar em deslocar seus líderes no Senado e no Congresso para a linha de frente desse tipo de combate.
Justamente para preservar o ofício da liderança, de um lado, e, de outro, evitar a explicitação da presença do Executivo na direção da CPI. Mas aqui não há essa preocupação. Importam menos as aparências que a essência.
E de essencial o que existe é o plano de fazer a CPI fracassar. Custe o que custar, doa a quem doer.
O Planalto está suficientemente escaldado com experiências anteriores para se dar ao desfrute de fazer concessões à figuração. O senador Delcídio Amaral, do PT, e o deputado Osmar Serraglio, do PMDB, governistas, credenciaram-se no quesito impessoalidade ao comandarem a CPI dos Correios, cujo relatório final serviu de base à denúncia da Procuradoria-Geral da República contra os acusados de participar do esquema do mensalão.
Pois Delcídio foi parar numa terceira suplência da CPI da Petrobrás e, fosse a comissão mista, o deputado Serraglio estaria fora, dado ter-se transformado em persona non grata nas hostes pemedebistas.
Os quatro senadores do PMDB que assinaram o requerimento da CPI - Jarbas Vasconcelos, Mão Santa, Geraldo Mesquita e Pedro Simon - nem sequer foram cogitados, embora tenham aptidões suficientes para participar. O problema é que seus atributos não são convenientes.
A tarefa adiante é dura, pesada e requer biografias compatíveis. Daí, a escalação da tropa de estiva comandada pelo líder do PMDB no Senado, Renan Calheiros, cuja influência na CPI se estende para além de seu partido.
E qual é o ofício? Simplesmente impedir que a CPI saia do lugar. Com o regimento interno na mão, uma ordem na cabeça, nenhum pudor nas faces e muita desfaçatez no espírito, a maioria tentará partir para a obstrução total: nada de requerimentos de informações (a não ser as irrelevantes), nada de depoimentos importantes, nada de quebra de sigilo. Nada de nada.
Brigas, desaforos, exacerbação artificial de ânimos, chicanas de toda sorte, isso haverá a mancheias, pois a meta é muita confusão e pouca investigação.
No Congresso, portanto, o campo está todo dominado.
Isso assegura a falência da CPI? Não necessariamente, porque a imprensa o governo não controla, embora tenha tentado exercer o domínio por meio do malfadado Conselho Federal de Jornalismo, que teria a função de fiscalizar, regulamentar e disciplinar o exercício da atividade.
Resolveria os problemas de azia que acometem o presidente Lula quando da leitura de jornais e poderia se arvorar a prerrogativa de considerar qualquer notícia mais embaraçosa sobre os meios e modos de administração da Petrobrás um ato de lesa-pátria a ser combatido a bem da soberania nacional.
Cão que ladra
A emenda que autoriza à disputa do terceiro mandato faz barulho, mas não morde. Se alguém porventura quiser que morda, precisará atuar à luz do dia porque casuísmo não sobrevive sem dono nem prospera no escuro.
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