quarta-feira, 8 de julho de 2009

Ameaças e fatos

Miriam Leitão
DEU EM O GLOBO


No fim de 2007, o presidente Lula atacou os senadores da oposição que votavam o fim da CPMF. Definiu-os como "a direita impiedosa". Afirmou que pediria aos governadores que fossem às casas dos pobres, explicando quem eram os responsáveis por eles ficarem sem o dinheiro do Bolsa Família. Os fatos: a carga tributária subiu e o governo gasta com Bolsa Família apenas 1% do dinheiro que arrecada.

Lula continuou ofendendo. Chamou de "mesquinhos" e criticou a "pequenez" dos que estavam contra o imposto. Quando a contribuição foi derrubada, ele prometeu que não aumentaria imposto algum. Quinze dias depois, o governo subiu as alíquotas do IOF para todos os contribuintes e da Contribuição Social sobre Lucro Líquido (CSLL) para o setor financeiro.

O ministro Guido Mantega disse que se a CPMF acabasse o Brasil seria rebaixado pelas agências de risco. O país foi promovido e chegou ao grau de investimento. Quando subiu o IOF e a CSLL, Mantega garantiu que a carga não subiria, pelo contrário, já que as novas alíquotas não compensariam a perda da contribuição. Durante todo o ano passado, o governo insistiu que estava eliminando impostos e que, por isso, a carga não aumentaria. Como se viu ontem, ela subiu um ponto percentual do PIB. Como o PIB subiu 5%, significa que os impostos pagos pelos brasileiros subiram ainda mais. Na conta da Fazenda, 8%.

O fato é: os brasileiros pagam impostos demais, seu peso é mal distribuído, o fruto da arrecadação é também desigualmente distribuído em benefícios. Como agora. A Fazenda conta que as desonerações para estimular a economia já provocaram a perda de R$11 bilhões. A maior parte foi para quem produz carro e para quem compra carro.

- Para ser justo, o governo deveria, quando há um aumento de carga tributária, devolver isso ao contribuinte, mas os planos de desoneração tem sido injustos. Da forma que tem feito, o governo tem beneficiado alguns setores em detrimento do resto da sociedade - diz Gilberto Amaral, do Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário.

Tudo é desigual. Até a fúria da Receita. Ela se abate implacável sobre o contribuinte pessoa física que, às vezes, apenas se enganou, não entendeu o que tinha que recolher. Mas a Petrobras, que deixou de pagar R$4 bilhões, não foi chamada para se explicar. Pelo menos foi isso que o presidente da empresa, José Sérgio Gabrielli, disse em entrevista ao jornal "Estado de S. Paulo". Gabrielli defendia a tese de que esse assunto não deveria ser tratado pela CPI. "No máximo deveria ser uma discussão entre a Petrobras e a Receita Federal. E nem isso existe porque não fomos intimados". Como a entrevista saiu no dia 28 de junho, quem sabe a Receita já tomou alguma providência?

A carga tributária era 30% em 2000. Ontem, a Receita divulgou que ela fechou 2008 em 35,8%: quase seis pontos percentuais do PIB em oito anos. O ex-secretário da Receita Federal Everardo Maciel explica que existe aumento de carga sem pressão fiscal e com pressão fiscal. Um pouco o que o governo está dizendo:

- Parte do aumento se deve ao fato de que as empresas tiveram mais lucratividade no começo do ano e mesmo que tenha havido crise no final do ano não foi suficiente para derrubar a arrecadação. Houve um aumento muito forte de consumo.

O problema, segundo Maciel, é que o governo está fazendo "um caminho suicida":

- Está aumentando o gasto corrente de maneira irreversível. Ao mesmo tempo, está, por causa da crise, tendo uma queda de arrecadação de 6%, maior do que a queda do PIB. Está compensando os aumentos dos gastos e a queda da arrecadação, com a redução progressiva do superávit primário, o que elevará a dívida/PIB. Isso é um caminho suicida.

Com essa queda de arrecadação maior do que a queda do PIB, a carga tributária cairá no ano que vem. Mas por maus motivos. O que o governo deveria fazer é o que o ministro Guido Mantega disse esta semana ao "Financial Times" que fará, mas que dificilmente fará: a redução dos impostos que pesam sobre a folha de pagamentos das empresas. Ou seja, o custo enorme, de quase 25%, que as empresas têm que recolher pelo fato de estarem concedendo emprego e pagando salário.

- Desejável, a redução do custo da folha é. Factível, não acho que seja - afirmou Everardo.

Provavelmente essa promessa vai engrossar outras tantas feitas pelo governo que não foram cumpridas, como a da reforma tributária ou do mecanismo que o governo disse que iria criar para inibir o aumento da carga tributária.

No dia 26 de fevereiro do ano passado, uma terça-feira, o ministro Guido Mantega se reuniu com líderes da oposição e fez várias promessas. Disse que enviaria na quinta-feira, dois dias depois, a proposta de reforma tributária. Ela teria um mecanismo que inibiria o aumento da carga tributária daí para diante. Prometeu que a carga não aumentaria e disse que, três meses depois de aprovada a reforma, o governo iria propor a desoneração da folha. Nada disso aconteceu.

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