quinta-feira, 3 de setembro de 2009

Reforma restringe internet na campanha

Adriana Vasconcelos BRASÍLIA
DEU EM O GLOBO

O projeto de reforma eleitoral aprovado em duas comissões no Senado restringe a cobertura jornalística de campanhas na internet. Sites teriam de seguir as regras das emissoras de rádio e TV, mas alguns senadores protestaram. Acórdão do Supremo sobre o fim da lei de imprensa publicado ontem deixa claro o caráter livre da internet. Com a polêmica, a votação final foi adiada.

Senado admite ter votado censura

Comissões restringem cobertura de eleições na internet, e senadores já aceitam voltar atrás

Em sessão conjunta, as comissões de Constituição e Justiça e de Ciência e Tecnologia do Senado decidiram manter ontem no texto da reforma eleitoral as restrições impostas pela Câmara à cobertura jornalística de campanhas eleitorais na internet. A tentativa de impor a sites jornalísticos, blogs, radiosweb e webTVs as mesmas regras previstas pela legislação eleitoral para emissoras de rádio e TV brasileiras contraria decisão recente do Supremo Tribunal Federal.

O ministro Carlos Ayres Britto, que também preside o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), encaminhou ontem para publicação o acórdão da decisão do STF que considerou, em abril passado, inconstitucional a lei de imprensa.

No texto, o tribunal deixa claro o caráter livre da internet: “...Silenciando a Constituição quanto ao regime jurídico da internet, não há como se lhe recusar a qualificação de território virtual livremente veiculador de ideias, debate, notícia e tudo o mais que se contenha no conceito essencial da plenitude de informação jornalística no nosso país.” Pouco depois da aprovação da reforma eleitoral nas comissões do Senado, as medidas restritivas à cobertura jornalística das campanhas pela internet já suscitavam polêmica entre os próprios senadores que participaram da votação. Com isso, a votação final do texto, em plenário, foi adiada para terça-feira. Até lá, os líderes partidários tentarão encontrar uma fórmula para acabar com o que alguns senadores já classificam de censura.

O líder do PT, Aloizio Mercadante (SP), sugeriu que o artigo que impõe tais restrições seja retirado integralmente do texto da reforma. O petista propôs que seja aprovado artigo no texto garantindo o direito de resposta aos candidatos que se considerarem prejudicados ou ofendidos. Sua proposta é que essa resposta seja publicada no prazo máximo de 48 horas e que fique no ar por tempo duas vezes maior do que tiveram reportagens ou artigos considerados ofensivos.

— Há espaço para buscarmos uma solução que preserve a liberdade de expressão e o direito de opinião. Até porque a essência da internet é a liberdade de expressão — disse

Doações ocultas continuam

O líder do PSDB, Arthur Virgílio (AM), foi um dos primeiros a manifestar preocupação com as restrições impostas à cobertura na rede: — A internet nasceu para ser livre, e foi isso o que permitiu que o presidente Barack Obama derrotasse a Hillary Clinton.

O presidente da CCJ, Demóstenes Torres (DEM-GO), que comandou a votação da reforma eleitoral, foi outro que admitiu a necessidade de mudança do texto: — Do jeito que ficou, o texto é restritivo, sim. Mas vamos mudá-lo.

Já Eduardo Azeredo (PSDB-MG), um dos relatores da reforma eleitoral, resistia às mudanças, mas cedeu. Ao longo do dia, ele se mostrou confuso sobre o alcance das medidas restritivas.

Sua intenção era aplicar aos sites jornalísticos as regras impostas atualmente aos jornais, impedindo inclusive os blogs de emitirem opiniões sobre os candidatos. Já rádios e TVs mantidas na internet teriam de seguir os mesmos critérios aplicados às emissoras de rádio e televisão convencionais, que determinam que seja dado espaço igual em sua programação a todos os candidatos.

A novidade introduzida pelo Senado ontem foi a emenda de Eduardo Suplicy (PT-SP) que autoriza os partidos políticos a realizarem prévias para a escolha de candidatos majoritários.

A proposta prevê que os partidos possam organizar debates entre seus pré-candidatos, permitindo, inclusive, que sejam transmitidos pelos meios de comunicação. O texto é omisso em relação à possibilidade de esses candidatos fazerem propaganda.

De acordo com a proposta aprovada ontem, fica proibida a participação de qualquer candidato em inaugurações de obras públicas ou no lançamento de pedras fundamentais nos seis meses que antecedem as eleições. Também foi vedada a publicidade institucional ou eleitoral dessas obras públicas no mesmo período.

Já os programas sociais, como o Bolsa Família, não poderão ser expandidos durante o ano eleitoral.

Mas seus benefícios poderão ser reajustados.

Fica proibida ainda a criação de novos programas desse tipo.

Apesar do esforço de Suplicy para garantir maior transparência às doações de campanha, foi mantido o texto da Câmara, que permite aos partidos receber doações em nome de candidatos, o que caracteriza as chamadas doações ocultas. Foi rejeitada proposta do petista que obrigava a publicação dos nomes dos doadores no dia 30 de setembro, véspera da eleição.

O ministro Ayres Britto vai se manifestar hoje sobre o texto aprovado.

Mas adiantou que as mudanças podem comprometer a transparência do processo eleitoral.

— A doação oculta é o mais preocupante — afirmou.

O adiamento da votação final para a terça-feira, após o feriado de 7 de setembro, poderá inviabilizar a aplicação da lei nas eleições de 2010. Isso porque o texto terá de voltar para a Câmara, onde passará por nova votação, e ser sancionado até 2 de outubro, um ano antes da eleição

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