José Meirelles Passos
DEU EM O GLOBO
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Campanha sobre desaparecidos é criticada
O governo está gastando R$ 13 milhões para pedir à sociedade informações sobre desaparecidos. O Tortura Nunca Mais diz que é “encenação”, pois o próprio governo não abriu seus arquivos.
Campanha sobre desaparecidos é encenação, diz ONG
Dirigente do Tortura Nunca Mais cobra abertura de arquivos oficiais e cita risco de país ser punido em tribunal da OEA
O grupo Tortura Nunca Mais definiu como “mera encenação” a campanha publicitária lançada pelo governo federal no último fim de semana. Os anúncios solicitam aos brasileiros que tenham documentos ou informações sobre o período de 1964 a 1985 — a ditadura militar — que os doem ao Arquivo Nacional.
Para o Tortura Nunca Mais, a iniciativa é parte de uma estratégia para evitar que em breve o Brasil seja condenado pelo tribunal da Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), da Organização dos Estados Americanos (OEA), em Washington, em processos sobre desaparecidos políticos.
Veiculada em rádio, TV, jornais, revistas e internet, a campanha Memórias Reveladas (www.memoriasrevela-das.gov.br) diz que o governo tem uma dívida com as famílias dos desaparecidos políticos, e que elas “têm o direito sagrado de enterrar os corpos dos seus entes queridos”. Segundo o anúncio, permanecem desaparecidas 140 pessoas que “lutaram e morreram por um Brasil mais justo”. E faz um apelo: “Para que não se esqueça. Para que nunca mais aconteça”.
A reação dos familiares dos desaparecidos foi contundente, segundo Elizabeth Silveira e Silva, tesoureira e ex-presidente do Tortura Nunca Mais do Rio, cujo irmão (Luiz Renê Silveira e Silva) lutou na Guerrilha do Araguaia e está na lista de desaparecidos: — Vemos a campanha como encenação para aliviar um pouco as denúncias que constam do processo em andamento no tribunal da Comissão Interamericana de Direitos Humanos. É uma maneira de o governo dizer ao tribunal: “Fizemos o que foi possível fazer”, quando, na verdade, nada está fazendo.
Ela lembrou que tempos atrás, quando o processo foi aberto na CIDH, a entidade fez sugestões ao governo para que tomasse providências no sentido de evitar que o caso chegasse ao julgamento na corte internacional.
Uma delas seria intimar para depor militares que serviram na época, para que revelassem o que sabiam a respeito da repressão contra quem resistia à ditadura militar.
— O governo deu de ombros, não aceitou a sugestão. Sequer explicou as circunstâncias das mortes. E surpreende com essa campanha. Não vemos vontade política de que esse episódio da História recente seja totalmente esclarecido.
Grupo duvida que apareçam documentos relevantes Para o Tortura Nunca Mais, o governo deverá obter pouco material através da campanha, pois as pessoas mais diretamente interessadas — parentes de desaparecidos — só possuem dados que investigaram por conta própria ou com a ajuda de entidades civis.
— Se alguém tiver um documento oficial em mãos, trata-se de material roubado do governo e, portanto, um crime. Por isso, é estranho esse pedido.
A posição do grupo, segundo Elizabeth, é clara: o governo deveria dar o primeiro passo. Antes de pedir aos brasileiros que doem documentos sobre os chamados anos de chumbo, para que sejam compilados e posteriormente divulgados pelo Arquivo Nacional, o governo deveria abrir os seus arquivos secretos daquele período.
— Essa iniciativa é fundamental para que essa nova campanha de aparência séria não passe de uma brincadeira, de uma encenação.
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