segunda-feira, 28 de março de 2011

O risco de Dilma:: Ricardo Noblat

- Peça tudo a um político, menos que se suicide - Tancredo Neves, presidente da República, que morreu sem tomar posse

“É Dilma?”, perguntou a Lula o então governador Cássio Cunha Lima (PSDB), da Paraíba, durante conversa no início de 2009. Apesar de adversários os dois são amigos.

Lula respondeu de pronto: “É”. Cássio insistiu: “E por quê?” Lula sorriu e disse: “Por duas razões. A primeira: é mulher. A segunda: ela é mais homem do que nós dois juntos”.

Lula ainda não desencarnou do cargo como ele mesmo admite. E faz pouca força para tal. Está sempre ao telefone com Dilma. Cássio perdeu o governo do seu Estado, acusado de abuso do poder econômico. Elegeu-se senador. E assumirá o mandato depois da decisão da Justiça sobre a Lei da Ficha Limpa. Quanto a Dilma...

A menos de duas semanas de completar 100 dias de governo, Dilma parece sair-se como presidente melhor do que a encomenda. Com certeza, muito melhor do que esperavam o PT e os partidos da base aliada dentro do Congresso. A oposição não fazia idéia de que pudesse ser assim. Às escondidas, admite sua perplexidade.

“O que a gente pode fazer?”, perguntou Cássio a um amigo no qual esbarrou na noite da última quarta-feira no restaurante Piantella, a Meca dos políticos em Brasília. No mesmo local, há pouca distância de Cássio, o deputado federal Marcus Pestana, presidente do PSDB mineiro, pedia ao ex-deputado Paulinho Delgado (PT): “Me apresenta a Dilma, me apresenta”.

Paulinho sorriu e lembrou: “Já passei por isso. No governo Fernando Henrique, procurei um amigo do PSDB e pedi que me apresentasse ao presidente”. No dia seguinte, em um corredor do Supremo Tribunal Federal, ouvi do deputado Antonio Imbassahy (PSDB-BA): “E aí? Como fazer oposição ao governo? Fiz um discurso na Câmara sobre o projeto do trem-bala e até meus colegas de partido acharam que fui crítico demais”.

Lembra do slogan adotado pelo PSDB depois da eleição de Lula em 2002? “A favor do Brasil”. Agora, o senador Aécio Neves (PSDB-MG) imagina algo como “oposição generosa”.

Advogado de presos políticos durante a ditadura militar inaugurada em 1964, e que só se esgotaria 21 anos depois, Sobral Pinto tinha surtos de irritação ao ouvir falar em “democracia à brasileira”. Subia nas tamancas e vociferava: “À brasileira só existe peru”. Psicografando Sobral: “Oposição é oposição. Generosa é o que não pode ser”.

Dilma faz um governo mais redondo do que Lula começou a fazer ao se eleger pela primeira vez. Antônio Palocci cuidava da economia no Ministério da Fazenda. Na Casa Civil, José Dirceu cuidava mais da política e trombava com Palocci. Havia a sensação de que os dois mandavam no governo. Lula era apontado como uma figura decorativa.

Até que Dirceu deixou o governo no rastro do mensalão e foi substituído por Dilma, ex-ministra das Minas e Energia. Palocci continuou cuidando da economia até cair por conta do escândalo da mansão alegre que freqüentava no Lago Sul, em Brasília. Dilma virou a gerente do governo. E Lula pôde fazer o que de fato mais gosta – política.

Para quem sabe mandar e não abre mão disso, é claro que nenhuma decisão do governo passa ao largo do gabinete de Dilma. Nem mesmo decisões aparentemente sem importância – como o funcionamento da portaria do Palácio do Planalto. A propósito: acabou por lá a aglomeração de pessoas e a chegada de visitantes sem hora marcada.
Disparado, o ministro mais forte do governo é Palocci. Ele já nem mais disfarça isso. Tudo o que tenha a ver com política é assunto dele. Dilma é a executiva super ativa, exigente, cobradora e atenta a detalhes. Para efeito externo perdeu seus maus modos. Na vida real, por vezes consegue moderá-los. Guido Mantega está ministro da Fazenda.

“Eu preciso quem me esculhambe”, suplicou o presidente Jânio Quadros em 1961 ao convidar o escritor Otto Lara Rezende para assessorá-lo. Todos ao redor de Jânio o temiam. Otto não topou. É o que diz a lenda. O maior risco que corre Dilma é não ter quem esculhambe seu governo.

FONTE: O GLOBO

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