As manifestações do ministro da Fazenda, Guido Mantega, como as desta terça-feira, no Senado, revelam avaliações nem sempre coerentes, sobre as causas mais profundas da falta de competitividade da indústria. E, por deficiência de diagnóstico, o governo fica sem estratégia, faz de tudo um pouco – e não faz nada. É a política dos puxadinhos.
Um dos discursos do governo repetidos nas últimas semanas é o de que há despejo enorme de moeda no mercado global pelos grandes bancos centrais, que chega ao câmbio brasileiro como tsunami, valoriza o real e enfraquece a indústria. "A estratégia única dos países avançados é a expansão monetária", disse Mantega.
Não é o mesmo que atribuir o problema do câmbio à especulação com a diferença de juros, prática que teria começado antes da produção de tsunamis pelos grandes bancos centrais. Também é discurso recorrente do governo Dilma.
Mas, logo após, Mantega prefere focar a "concorrência predatória" e "os subsídios disfarçados" praticados no comércio internacional. E, depois, parece reconhecer que o problema de fundo está no altíssimo custo Brasil. E segue se defendendo das dificuldades que enfrenta para fazer reformas; desonerar a folha de pagamentos; reduzir preços da energia; e da falta de investimentos em infraestrutura.
Em outras oportunidades, não só Mantega, mas outros ministros, sugeriram que o fraco desempenho da indústria se deve à ausência de inovação. Tanto é que preparam políticas destinadas a estimular a modernização e a incorporação de tecnologia.
Mas Mantega parece acolher também o argumento do seu amigo, o ex-ministro Luiz Carlos Bresser-Pereira – para quem o maior problema da indústria é a doença holandesa, ou seja, são as crescentes receitas com exportações de matérias-primas, alimentos e energia, que multiplicam receitas em dólares, valorizam o real e tiram competitividade da indústria.
Cada um desses diagnósticos pede tratamentos diferentes. O tsunami monetário, por exemplo, pode ser mitigado só com controle de capitais. Mas o governo gostaria que a Organização Mundial do Comércio reconhecesse esse jogo como dumping cambial para, assim, torná-lo passível de retaliação comercial. Mas isso não vai acontecer tão cedo.
Arbitragem com juros se cura com derrubada interna dos juros, processo que está sendo intensificado desde agosto. O alto custo Brasil, por sua vez, exige reformas, desoneração da folha de pagamentos e investimentos – que são sempre adiados "para quando der".
A concorrência predatória se ataca com políticas de defesa comercial que implicam longos processos e custam caro. As deficiências de inovação pedem atualização tecnológica e mais investimento em tecnologia da informação, para os quais não há incentivo que chegue.
E a doença holandesa, avisa Bresser, tem de ser atacada com confisco das exportações de produtos primários. Em alguns momentos, o governo federal chegou a ameaçar com algo parecido. Quando tentou enquadrar os produtores de álcool, avisou que estava estudando a taxação das exportações de açúcar.
Enfim, o governo Dilma tenta fazer um pouco de tudo e não faz nada, porque nada sai bem feito.
CONFIRA
Sobrou para o exportador. Outra comprovação da atual política dos puxadinhos que caracteriza este governo foi a resposta que o ministro Guido Mantega deu nesta terla ao senador Blairo Maggi (PR-MT). Ele se queixou de que as medidas de restrição aos financiamentos externos, supostamente para beneficiar o exportador, na verdade, prejudicam-no, obrigando-o a buscar financiamentos no curto prazo sob custos financeiros mais altos.
Sobrou para o gavião. Mantega reconheceu o estrago, mas como puro efeito colateral: "A gente dá um tiro no urubu e sobra também pro gavião". E avisou que o governo prepararia alguma medida compensatória para os exportadores. É ou não é mais um puxadinho?
Faltou explicar. O ministro Mantega também condenou nesta terça-feira a guerra fiscal entre Estados que atraem importações. Mas, em seguida, admitiu também que os Estados têm de ser compensados. Pergunta: têm de ser compensados por uma prática condenável?
FONTE: O ESTADO DE S. PAULO
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