“Ou nos conformamos com a idéia de que formas de autogoverno brotarão ocasionalmente e conviveremos com grupos anárquicos que predicam a violência, arriscando-nos à ruptura da convivência democrática, ou nos pomos humildemente a dialogar com os vastos setores da sociedade que só formalmente pertencem à pólis. Eles estão, na maioria das vezes, economicamente integrados, politicamente insatisfeitos e possuem identidades culturais diferentes do que até hoje parecia, equivocadamente, ser o mainstream. É só conhecer a realidade das “comunidades” que pontilham nossas cidades ou as periferias infindáveis de seus contornos para sentir a força dessas presenças. Tecnicamente é possível aumentar os mecanismos de escuta e de participação ampliada no processo deliberativo e nas instituições executivas. Politicamente o avanço tem sido muito lento.
Numa palavra: não há tempo a perder para reconstruir a democracia nos moldes das realidades atuais. Neste esforço, a educação e a cultura continuam fundamentais. O momento não é de simples “pregação democrática”, como se este credo construído a duras penas nos últimos séculos fosse o anelo da maioria. Não se trata só de “ensinar”, mas de “aprender” Não estamos diante de uma elite que sabe e de um povo que desconhece. O momento é de respeito à pluralidade das identidades culturais e de reconstrução das instituições para que elas captem e representem o sentimento e os novos interesses da população. Só assim poderemos manter acesa a chama da liberdade, do respeito à representação e da autoridade legítima e evitar que formas abertas ou disfarçadas de autoritarismo e violência ocupem a cena.”
Fernando Henrique Cardoso, sociólogo, ex-presidente da República. Extraído do discurso de posse de FHC na Academia Brasileira de Letras, em 10/09/2013.
Nenhum comentário:
Postar um comentário