domingo, 24 de abril de 2016

Os doze trabalhos de Temer

• Caso o Senado aprove o impeachment, vice assumirá a Presidência com um trabalho hercúleo pela frente: uma longa lista de desafios na política, na economia e na esfera social

Jeferson Ribeiro e Danielle Nogueira - O Globo

I
TRINCHEIRA VERMELHA: Após quase 14 anos no poder, o PT voltará a ser oposição. O partido teve o PMDB como aliado durante todo esse tempo, mas se sente traído pelo o que classifica de golpe para tirar a presidente Dilma Rousseff do poder. Duas figuras-chave nessa suposta conspiração são do PMDB: Michel Temer e Eduardo Cunha, apontados por Dilma como chefe e vicechefe do golpe, respectivamente. Os petistas são a segunda maior bancada, considerando Câmara e Senado.

II
TOMA LÁ DÁ CÁ: Após fila de carros no Palácio Jaburu, onde Temer recebeu deputados para conseguir votos a favor do impeachment de Dilma, o eventual novo presidente precisará de jogo de cintura para agradar aos parlamentares. PP, PR, PSD, PRB e PTB vão cobrar a fatura por terem rompido, na reta final, o acordo que tinham fechado com o governo, por intermédio do ex-presidente Lula, para dar sustentação a Dilma. A demanda maior deverá vir de seu próprio partido, o PMDB, de olho nos cargos mais cobiçados.

III
MAIS COM MENOS: Caso assuma o comando do Executivo, Temer terá que usar sua habilidade de negociação à exaustão. Ele planeja cortar até dez ministérios e, com isso, terá menos cargos disponíveis para formar uma coalizão de partidos que estejam dispostos a apoiar no Congresso uma agenda econômica amarga, a poucos meses das eleições municipais. Construir governabilidade, herdando um governo impopular, será uma das tarefas mais difíceis para o vice-presidente.

IV
IMAGEM MANCHADA: O discurso do golpe de Dilma teve eco em algumas publicações internacionais, como a revista britânica “Economist”. O comportamento dos deputados na sessão de votação do impeachment na Câmara, com referências a parentes e homenagem a torturadores, também teve má repercussão. Mesmo antes de assumir o posto de presidente, Temer iniciou uma contraofensiva e tem dado entrevistas à imprensa estrangeira, na tentativa de recuperar a imagem do país no exterior.

V
CRISE FISCAL: O país caminha para o terceiro ano seguido de déficit. Recolocar as contas em ordem passa pelo corte de gastos públicos e, provavelmente, aumento de impostos. Já há uma data fatal no horizonte: caso não seja aprovada uma mudança na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) até 22 de maio, o país viverá um novo shut down do orçamento, o que impede qualquer gasto. Temer terá ainda de lidar com o caos fiscal dos estados, que tentam empurrar para a União o ônus de suas dívidas bilionárias.

VI
URGÊNCIA DAS REFORMAS: Ganha força o discurso da necessidade das reformas estruturais. Na lógica fiscal, defende-se a imposição de teto para gastos obrigatórios. Economistas avaliam que haveria tempo para Temer enviar ao Congresso a Reforma da Previdência, pois a discussão está madura. Estudo do Ipea mostra que, somando-se os déficits da Previdência de estados e União, o rombo chega a R$ 3,6 trilhões ou 65,8% do PIB. As reformas tributária e trabalhista ficariam para depois de 2018.

VII
INVESTIMENTOS EM QUEDA: O tombo foi de 14% em 2015, pior desempenho em 19 anos. Com o país indo para o segundo ano de recessão, o investimento em infraestrutura é fundamental para a economia voltar a crescer em 2017. Temer terá de recuperar a confiança dos empresários, não apenas nomeando uma equipe econômica com credibilidade, como também dando os primeiros passos para ajustes estruturais. Um programa de concessões poderia atrair o interesse do empresariado, incluindo o estrangeiro.

VIII
MANDATO AMEAÇADO: Caso assuma o cargo de presidente, Temer iniciará sua gestão com o mandato questionado. Corre no Tribunal Superior Eleitoral uma ação que pede a cassação da chapa Dilma-Temer devido a supostas irregularidades no financiamento da campanha eleitoral de 2014. O autor da ação é o PSDB. Temer já pediu ao tribunal para que suas contas sejam investigadas separadamente das de Dilma, mas até agora o TSE rejeitou a proposta de sua defesa.

IX
PRESSÃO DA LAVA-JATO: Temer terá que lidar com a maior investigação de corrupção já feita no país. Na mira dos investigadores estão caciques peemedebistas. Entre eles. Renan Calheiros (PMDB-AL), presidente do Senado; Eduardo Cunha (PMDB-RJ), presidente da Câmara, e Romero Jucá (PMDBRR), presidente interino do PMDB. Tanto essa ala do PMDB quanto grupos de novos partidos aliados, como o PP, devem fazer pressão para que o eventual futuro presidente contenha as investigações.

X
PROGRAMAS SOCIAIS: São incógnitas. Até agora, Temer promete uma política fiscal ainda mais austera. Ao mesmo tempo, tem dito que preservará o Bolsa Família (que seria até reajustado), o Fies e o Pronatec. Analistas acreditam que, ao cortar gastos públicos, nem todos os programas sociais serão poupados. Temer escalou Ricardo Paes de Barros, um dos criadores do Bolsa Família, para formular as políticas sociais. Estas decisões poderão determinar o apoio das classes mais dependentes das políticas governamentais.

XI
RUAS COM TEMER? Temer vai precisar convencer a sociedade a abandonar o clima de polarização que marcou a cena política nos últimos meses em prol de um pacto social para recolocar o país nos trilhos. Uma das incógnitas é como se portarão o Movimento Brasil Livre (MBL) e o Vem pra Rua, que vinham organizando setores da classe média contra a corrupção e a favor do impeachment. Não se sabe se eles vão se desmobilizar ou se seguirão erguendo a bandeira anticorrupção num eventual novo governo.

XII
OU RUAS CONTRA TEMER? Se há dúvidas sobre o comportamento da classe média, há certeza de que os movimentos sociais simpáticos ou ligados ao PT vão questionar a legitimidade de Temer. O MST pode ressuscitar estratégias de fechar rodovias. A CUT, a maior central sindical, convocar greves. Artistas e intelectuais pró-Dilma devem apoiar estes movimentos. Sob o comando do ex-presidente Lula, e mesmo de Dilma, manifestações poderão contestar Temer, que vai encarar estes protestos por meses.

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