É um exercício interessante imaginar o estágio de desenvolvimento econômico do País caso a reconhecida competência do Estado para criar entraves aos negócios fosse exercida para atingir o resultado diametralmente oposto, ou seja, facilitar a vida dos que desejam empreender e criar riqueza.
Da mesma sorte, em nada ajuda o crescimento do Brasil a visão limitada de parte do empresariado nacional que atua para obter benesses estatais para seus setores de atuação com vistas a reduzir – ou mesmo eliminar – os riscos de seus negócios à custa do poder público, ainda que isso represente pesados ônus para a coletividade.
Medidas para tornar o Brasil um país mais amigável para os negócios foi o tema da quarta edição do Fórum Estadão – A reconstrução do Brasil, ocorrida na terça-feira passada. O evento é uma realização do Estado em parceria com a Unibes Cultural e apoio do Instituto de Relações Internacionais e Comércio Exterior (Irice), o Centro de Liderança Pública (CLP) e a Tendências Consultoria Integrada.
O ex-ministro da Fazenda Pedro Malan abriu sua fala no segundo painel do evento com uma pertinente provocação: antes de crescer, a sociedade precisa decidir se quer pagar menos impostos ou se quer um Estado “forte”, que tudo provê, como indicam recentes pesquisas de opinião. “Esse é o paradoxo, uma mistura tóxica não resolvida de uma população que não quer mais impostos, mas quer que o governo continue muito ativo na resolução de problemas”, disse o ex-ministro, lembrando também que o Estado não gera recursos ao sabor das “vontades políticas” de ocasião.
As eleições de 2018 terão papel primordial na definição dos rumos do País nas próximas décadas. Tão importante quanto a escolha do próximo presidente da República será a escolha dos representantes no Poder Legislativo. A Câmara dos Deputados e o Senado terão papel decisivo para o rumo de crescimento do País ao tratarem de projetos que tornem mais simples a vida de quem pretende fazer negócios.
O peso da burocracia é tão insuportável para a fluidez dos negócios que empreender no Brasil é “como correr uma maratona com um elástico amarrado na cintura”, comparou Camilla Junqueira, diretora-geral da Endeavor Brasil, agência de apoio a empreendedores. São necessários, em média, 80 dias para se abrir ou fechar uma empresa no Brasil, onde, segundo ela, há mais de 3,7 milhões de CNPJs “fantasmas”, vale dizer, cadastros de empresas para as quais não há mais registros de atividades.
A complexidade tributária é outro dos grandes entraves enumerados por Camilla. “Só a legislação do ICMS foi alterada 558 vezes nos últimos 4 anos em todos os Estados. É uma mudança a cada três dias. Fica impossível para o empreendedor dar conta dessas mudanças, aumentando seus custos”, disse.
O sistema tributário é altamente complexo porque é desigual. Diversos setores são privilegiados com regras especiais em detrimento de outros. “É preciso criar um sistema igual para todos os setores da economia”, disse o economista Marcos Lisboa, presidente do Insper. “Alguns grupos que hoje pagam menos impostos teriam de pagar mais. Olha a dificuldade para se restabelecer a reoneração da folha de pagamento”, acrescentou.
João Manoel Pinho de Mello, secretário de Promoção de Produtividade e Advocacia da Concorrência do Ministério da Fazenda, também criticou os mais de 40 regimes especiais de tributação em vigor no País. “Todo mundo reclama do nível da carga, mas temos de ver quanto cada um paga. Talvez seja por isso que ainda não houve consenso para a reforma (tributária)”, disse.
Espera-se muito do poder público as soluções para a quase totalidade dos problemas nacionais, mas pouco, ou nada, é exigido da iniciativa privada. “O setor privado tem sido pródigo em propor soluções estapafúrdias”, criticou Marcos Lisboa.
O mesmo sentimento que inspira a visão de milhões de cidadãos sobre o papel do Estado-provedor também se faz presente no meio empresarial. Enquanto prevalecer essa ideia de “cada um por si”, todos perdemos.
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