- O Estado de S.Paulo
Favoritos são cobrados a justificar propostas e nomes fortes da economia
Candidatos, por favor falem. Abram a boca. Não para incendiar as redes sociais e alastrar o fogo na reta de chegada da eleição. Mas para pôr às claras o que está sendo realmente planejado, tanto em termos de programas como de equipes de governo. Nem sempre à luz do dia. Com os sinais cada vez mais fortes de que Jair Bolsonaro (PSL) e Fernando Haddad (PT) serão os classificados para um possível segundo turno, o que tem saído dos comitês de campanha dos candidatos é, preferencialmente, um discurso preparado para reforçar a polarização. E fica para segundo plano como e com quem cada candidato pretende atuar no governo. Principalmente na economia.
Coube ao guru de Bolsonaro, o economista Paulo Guedes, abrir essa caixa, e com propostas para um dos temas mais sensíveis, ou seja, impostos. A primeira é a recriação de uma espécie de CPMF – que substituiria várias contribuições, como a patronal sobre a folha de pagamento e as do chamado sistema S, por um tributo sobre movimentação financeira, com alíquota de 1,28%. A outra seria uma unificação das alíquotas do Imposto de Renda, na faixa de 20% – medida que, mesmo com a oferta de ampliação da isenção para a faixa até cinco salários mínimos, ainda levaria a uma vantagem tributária para os 11% mais ricos.
Do hospital, Bolsonaro descartou a hipótese de volta da CPMF, mas reafirmou a intenção de alterar o IR. Por via das dúvidas, mandou o economista fechar a boca e esse desencontro chegou a despertar desconfianças quanto à permanência de Guedes na equipe. Imposto, como se sabe, é quase tabu para o público em geral. A rejeição a novos tributos e/ou aumento dos já existentes consegue unir os interesses dos mercados, dos empresários e dos trabalhadores.
Todos estão convictos de que a carga tributária é excessiva, mais ainda se for considerada a contrapartida insatisfatória em termos de serviços públicos. Não é por outro motivo que os ministros de plantão, a exemplo de Henrique Meirelles, costumam recorrer à ameaça de aumentar impostos, caso o Congresso não dê aval a alguma medida de contenção de gastos proposta pelo Executivo.
Haddad, por sua vez, está nesse momento às voltas com um delicado movimento de aproximação do centro, já de olho no segundo turno, onde as pesquisas ainda apontam uma vulnerabilidade no confronto com Bolsonaro. E esse movimento está diretamente ligado à economia. Verdade seja dita, o programa econômico do PT não foi exatamente camuflado, até porque estava sob responsabilidade direta do próprio candidato. Mas, como até pouco tempo atrás a grande questão era quando Haddad trocaria a condição de vice pela cabeça de chapa, por algum tempo essas discussões encobriram as propostas concretas do PT para uma eventual volta ao governo.
Agora, naturalmente, com a escalada do candidato nas pesquisas de intenções de voto, entra de novo em cena, além do programa econômico petista, o nome do seu condutor. Por enquanto, não houve nenhum atrito ruidoso na equipe petista, como ocorreu com Bolsonaro. Mas os mercados e os setores empresariais acompanham com atenção algumas mudanças de posicionamento do candidato em relação ao seu time da área econômica.
Em debate recente, Haddad desautorizou o economista Marcio Pochmann como um dos principais formuladores do plano de governo do PT – ele foi “uma das 300 pessoas” que participaram desse trabalho, desconversou o candidato. Pochmann havia se manifestado contra a necessidade de mudanças profundas na Previdência, ponto de honra para os setores financeiro e empresarial.
Haddad tem mandado recados para o público-alvo de que a reforma da Previdência está no seu radar, embora não exatamente a de Temer. Ele admite discutir itens como idade mínima e alíquota de contribuição, mas põe foco nos regimes de aposentadorias estaduais – o que atenderia aos interesse de governadores, que enfrentam dificuldades para pagar salários dos servidores.
Faltam apenas duas semanas para a eleição e, pelo grau de tensão do momento, dá para imaginar o quanto de irracionalidade ainda contaminará a campanha. E seria justamente a combinação de transparência com razão que ajudaria a esclarecer os eleitores.
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