- Folha de S. Paulo
Alegria no mercado é fato, mas em boa parte uma animação pelo mundo
É fato que o dinheiro fez festa para o salto de Jair Bolsonaro (PSL) na pesquisa de segunda-feira (1º).
Mas o motivo eleitoral parece apenas a espuma de uma onda de animação com países emergentes, notável desde meados de setembro.
Caso essa animação persista, terá impacto positivo mesmo na nossa paisagem com ruínas. No entanto, o cálculo das probabilidades ainda é uma pilhéria, tanto no que diz respeito a melhoras duradouras no panorama financeiro global quanto no doméstico, mesmo em caso de vitória da extrema-direita.
Os povos do mercado discutem se passou o pior das tormentas que abalaram os preços de ativos financeiros em países emergentes neste 2018.
As moedas, em particular, foram abaladas pela ameaça de guerra comercial, pelas crises turca e argentina, pela incerteza sobre a alta de juros nos EUA e por um ano política ou eleitoralmente agitado.
A resposta provisória parece ser "sim", a coisa pode acalmar. Pelo menos, o pessoal aproveita para fazer compras de ações e de moedas na xepa.
O estresse baixou aqui também, embora o barco brasileiro ainda vá balançar na eleição. O dólar ficou mais barato, os juros reais de curto prazo recuaram, para os níveis ainda altos de agosto.
As taxas de longo prazo, porém, indicam desconfiança grande do que será o próximo governo e desanimam quem queira tocar negócios na economia real.
Mesmo que sobrevenha euforia financeira em caso de vitória de Bolsonaro, o efeito a princípio será pirotécnico.
Ânimo para valer, para expansão de negócios, contratações de trabalhadores e aberturas ou levantamento de capital, tudo vai depender de perspectivas sérias de reforma econômica, fiscal em particular.
Há mais dificuldades.
O Banco Central tende a chancelar a alta de juros, até o início do ano, por exemplo. Também não haverá investimento público e, tão cedo, privado em infraestrutura, por exemplo. Exceto em caso de vitória retumbante de reformas, todo mundo vai tatear, esperar quem se aventure, antes de pensar em expansão mais firme.
O observador frio não faz ideia do que seriam os governos de Bolsonaro e de Fernando Haddad (PT).
Atrás da cortina liberal, a extrema-direita parece amalucada. Haddad esconde seu programa tanto do PT quanto do público em geral, se é que já sabe o que fazer além de dizer que é "moderado".
No que deixa vazar, a campanha bolsonarista tem ideias exóticas de talhar a dívida pública com privatizações imediatas e em massa (impossível ou besteira), de fazer revolução temerária nos impostos com um tributo ruim como a CPMF ou de baixar a carga tributária em tempo de ruína fiscal, entre outras enormidades, notadas mesmo por porta- vozes da finança mundial.
A conjunção de um presidente instável e ignaro com uma equipe econômica amalucada e escasso apoio político deu no desastre de Fernando Collor, 1990-1992.
Os tempos são outros, a crise é outra e talvez o collorismo possa servir de lição, embora o Brasil esteja repetindo erros faz quase 40 anos.
Decerto Bolsonaro vai aglutinando os maiores partidos "reais" do Congresso, as bancadas da bala, da Bíblia e, agora, do boi, o que tem relevância, mas não necessariamente se traduz em articulação eficiente com os partidos formais.
É um problema sério para qualquer governo, que terá de aprovar reformas duras como a da Previdência e não terá um tostão para fazer graças ou adquirir aliados.
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