- O Estado de S.Paulo
Pode não ser uma boa estratégia entrar em tanta briga ao mesmo tempo
Com carta branca até agora do presidente eleito Jair Bolsonaro, o futuro ministro da Economia, Paulo Guedes, conseguiu montar o seu próprio “dream team” completamente alinhado às suas ideias e com uma capacidade de entrega que será testada logo nos primeiros meses. Precisa ser rápido na apresentação das medidas para garantir a confiança e o apoio necessários à aprovação das reformas no Congresso. Isso é certo.
Precisa também escolher as brigas a serem compradas sem prejuízo a outras que terão que ser enfrentadas mais à frente. Um erro primário seria querer ganhá-las todas de uma vez, tumultuando o jogo de pressões no Congresso, onde projetos essenciais terão que ser aprovados.
A proposta mais importante a ser encaminhada é reforma da Previdência. O plano de desindexação e desvinculação do Orçamento, confirmado por Guedes esta semana, não pode se sobrepor à proposta de mudança das regras de Previdência que será encaminhada em março, segundo indicações do futuro ministro.
É possível que Guedes, ao confirmar o plano de aperfeiçoamento do teto de gasto para incluir uma cláusula de “desarme” de todo tipo de indexação e vinculações que existe no Orçamento – inclusive salários e despesas de Previdência, saúde e educação –, queira, na prática, mostrar: vamos lá aprovar a reforma da Previdência. Sem ela, o cenário piora rapidamente.
Guedes quer reduzir as vinculações e reduzir indexação para tornar mais fácil cumprir a emenda do teto dos gastos. A questão é que mexer em indexação envolve, em alguns casos, mudança constitucional e interesses setoriais e corporativos muito mais amplos e dispersos. Por exemplo, pela Constituição está garantida a manutenção do valor real de todos os benefícios previdenciários. Mudar a Constituição nesse ponto pode ser uma tarefa até mais difícil do que aprovar a Previdência.
Pode não ser uma boa estratégia entrar em tanta briga ao mesmo tempo. O mercado e os investidores esperam a reforma da Previdência. Se conseguir aprová-la, o futuro ministro abre o caminho para as demais mudanças do seu plano, como a desvinculação.
Não é bom tentar tanta coisa sem antes ter conhecimento do tamanho e da fidelidade da base política. Hoje, o que Guedes tem é um deputado na chefia da Casa Civil (Onyx Lorenzoni) e um general (Carlos Alberto dos Santos Cruz) que farão a coordenação política com o Congresso. Vai funcionar?
Guedes aposta na governabilidade de Bolsonaro em dois eixos. O primeiro é o das frentes temáticas, com as pautas de segurança e de costumes. O segundo eixo de governabilidade é o econômico, fazendo uso do Pacto Federativo para aprovar as reformas numa “construção coletiva”, como ele gosta de se referir. A ideia em jogo é a seguinte: com as reformas, vai ter mais dinheiro para Estados e municípios, inclusive para os comandados pela oposição. Para Guedes, nesse cenário eles estariam propensos a dar apoio.
O desenho da estrutura do novo ministério, resultado da fusão das pastas Fazenda, Planejamento e Indústria, pode ajudar. Para Fernando Schüler, do Insper, o modelo anunciado por Guedes facilita a interlocução dos setores e permite menos dispersão na tomada de decisão, já que há alinhamento nas ideias dos novos secretários. Ele vê, porém, uma zona fracionada ainda na infraestrutura, dividida entre o Ministério da Economia, o Ministério de Infraestrutura e a Presidência.
O ministério da Economia terá ao todo seis secretarias especiais, escolhidas cada uma delas com base nos objetivos ajuste fiscal, produtividade, reforma tributária, Previdência e abertura comercial. Seus titulares serão como vice-ministros. Uma inovação. Por trás dessa decisão está a visão do novo de que é preciso “sincronização” dos movimentos para a implantação do Plano Guedes. O que vale também para os bancos públicos, onde ele quer “porteira fechada” com o mínimo de interferência política.
O primeiro grupo do time de Guedes é formado por profissionais com experiência de gestão no setor privado e um segundo time de funcionários de alto escalão. Serão gestores independentes e “delegáveis”. Guedes ficará livre para pensar economia e formular os planos para o governo sem ter que cuidar do dia a dia de setores como BNDES, indústria, privatização e outras áreas. A conferir se vai dar certo.
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