Sob inspiração trumpista na área externa, equipe de Bolsonaro se mete em entrevero pueril
Sob o argumento de que a política externa brasileira nos anos petistas foi flexionada pelo peso da ideologia, o presidente eleito, Jair Bolsonaro (PSL), prometeu em sua campanha pôr fim ao que chamou de aparelhamento do Itamaraty.
É incontestável, em especial no período do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que o Brasil se aproveitou do momento econômico favorável para tentar aumentar sua relevância geopolítica, mas o fez assumindo posições de um surrado repertório antiamericanista e terceiro-mundista.
Sem dúvida, uma correção de rumos se fazia necessária —e chegou, de certa forma, a se esboçar no primeiro mandato de Dilma Rousseff, mas logo foi diluída pelo desinteresse da mandatária nessa seara.
Bolsonaro, infelizmente, não dá sinais de que pretenda buscar um equilíbrio. Ao assumir bandeiras de revanchismo contra uma esquerda que já deixou o poder há mais de dois anos, o presidente eleito padece, com sinal trocado, do mesmo mal que vê nos governos do PT.
O ideário que vai se revelando por vezes parece uma paródia do adotado por Donald Trump, com a crucial diferença de que este lidera o país mais poderoso do planeta.
A face constrangedora dessa conduta subalterna já se manifestou antes de o governo ter início. Por exemplo, na viagem aos EUA do deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-RJ), filho do presidente eleito, que aproveitou a ocasião para posar com um boné com a inscrição “Trump 2020”, em referência ao próximo pleito naquele país.
Paralelamente, causou turbulência a intenção do próximo governo de mudar a embaixada em Israel de Tel Aviv para Jerusalém, como fez seu modelo americano.
Agora, no que parece prenúncio de uma condução voluntariosa da política externa, o Brasil se meteu em um entrevero pueril ao convidar e desconvidar representantes de Cuba e da Venezuela para cerimônia da posse presidencial.
Desrespeita-se uma tradição de serenidade do Itamaraty com o intuito, mais uma vez sob inspiração do figurino trumpista, de criar fatos midiáticos e reviver os confrontos da campanha eleitoral.
Não resta dúvida de que os governos de Miguel Díaz-Canel e Nicolás Maduro são ditaduras hostis a Bolsonaro —e quase certamente não mandariam ninguém à posse. Os cubanos, ademais, já manifestaram seu repúdio ao futuro governo ao se retirarem do Mais Médicos.
Nem por isso, entretanto, convém à diplomacia brasileira se rebaixar a tais querelas.
Devem-se, sim, prestigiar valores fundamentais, como a democracia, os direitos humanos e a autodeterminação dos povos. É preciso defender tais convicções, todavia, nos canais e fóruns diplomáticos adequados, evitando-se atos espetaculosos e inconsequentes que coloquem em risco as relações pacíficas e os interesses comerciais.
A busca desse equilíbrio complexo entre princípios universais e pragmatismo econômico deve nortear a política externa do governo.
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