- O Globo
Na próxima quinta, o assassinato da vereadora faz um ano. Até aqui, a apuração revelou mais sobre a polícia do Rio do que sobre o crime
Eram quase cinco da madrugada quando a Mangueira revelou o segredo. Na última ala da escola, grandes bandeiras em verde e rosa exibiram o rosto de Marielle Franco. Era a surpresa do desfile que já começou a homenagear a vereadora no samba-enredo. “Brasil, chegou a vez / De ouvir as Marias, Mahins, Marielles, Malês”, dizia o refrão, que embalou o 20º título da Estação Primeira.
O assassinato de Marielle e do motorista Anderson Gomes completa um ano na próxima quinta-feira. O crime continua sem castigo, apesar das seguidas promessas de autoridades federais e estaduais.
Em 10 de maio de 2018, o então ministro da Segurança Pública, Raul Jungmann, inaugurou a série de bravatas. “A investigação do caso Marielle está chegando à sua etapa final, e eu acredito que em breve nós devemos ter resultados”, anunciou.
Em 31 de agosto, foi a vez do general Braga Netto, que comandava a intervenção federal no Rio. “Estamos perto. Até o fim do ano, quando a intervenção tiver sido concluída, o caso já deverá estar solucionado”, prometeu.
Em 1º de novembro, o delegado Rivaldo Barbosa garantiu que o crime estaria “muito próximo de sua elucidação”. Três semanas depois, o então secretário estadual de Segurança, Richard Nunes, disse que o caso seria resolvido até o fim do ano. “Alguns participantes nós temos, com certeza”, assegurou o general.
O ano acabou, a intervenção passou, e as promessas continuaram a ser lançadas ao vento. Em 12 de janeiro, o novo governador, Wilson Witzel, disse que os investigadores estavam “próximos da elucidação do caso e, evidentemente, da prisão daqueles que estão envolvidos”. “Talvez isso aconteça até o final desse mês”, acrescentou.
Na campanha, Witzel participou de um ato em que dois aliados quebraram uma placa com o nome de Marielle. Um deles, o deputado estadual Rodrigo Amorim, circulou pela Sapucaí como bicão na noite em que a Mangueira homenageou a vereadora.
Até aqui, a apuração revelou mais sobre a polícia do Rio do que sobre o crime que ela deveria resolver. No mês passado, a PF fez buscas para desvendar “ações que estariam sendo praticadas com o intuito de obstaculizar as investigações”. Em português corrente, isso significa que houve uma operação abafa para encobrir mandantes e autores dos assassinatos.
O governo federal guarda um estranho silêncio sobre as execuções. Essa atitude remete a um ano atrás, quando Jair Bolsonaro foi o único candidato à Presidência que se recusou a comentar o caso. Dos 70 deputados estaduais, seu filho Flávio foi o único a votar contra a concessão da Medalha Tiradentes como tributo póstumo à vereadora.
Uma das linhas de investigação liga o assassinato de Marielle ao Escritório do Crime, grupo de extermínio chefiado por milicianos. Em janeiro, vieram à tona os laços do clã presidencial com Adriano Magalhães da Nóbrega, apontado como fundador da quadrilha. Ex-capitão do Bope, ele foi condecorado por Flávio e elogiado por Jair na tribuna da Câmara. Sua mãe e sua mulher ganharam cargos no gabinete do primeiro-filho, hoje senador. Nóbrega está foragido há 47 dias.
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