- Folha de S. Paulo
Crise turbinada por corrupção facilita ataque a instituições e medidas autoritárias
Ao ordenar o fechamento do Congresso peruano, o presidente Martín Vizcarra disse que aquela era “uma solução democrática” para os problemas do país. São remotas as chances de que ele tenha confundido o adjetivo. A frase revela, na verdade, como o enfraquecimento das instituições fertiliza o terreno para medidas autoritárias.
A bagunça na qual se meteu o Peru nos últimos dias é a soma de um megaescândalo de corrupção, uma política dramaticamente fraturada, um Congresso que tenta salvar a própria pele e um presidente disposto a aproveitar crises para concentrar poder. Semelhanças com outros casos da região não são coincidências.
Vizcarra assumiu o poder em 2018, quando Pedro Pablo Kuczynski renunciou sob acusação de envolvimento com esquemas da Odebrecht. A revelação da bandalheira jogou no lixo os resquícios de credibilidade da classe política daquele país.
Disposto a surfar na fúria do povo, o presidente passou a trabalhar para reformar o sistema político e, de quebra, diluir o poder de um Congresso dominado pela oposição.
Os parlamentares reagiram: atuaram para retaliar Vizcarra e proteger a si próprios. Enquanto os congressistas barravam planos de reduzir seu direito à imunidade, o presidente usava a população como escudo e sugeria antecipar eleições para se livrar de rivais no Legislativo.
Nos últimos dias, os dois lados começaram a disputar também o aparelhamento da corte suprema. O último golpe aconteceu na segunda (30). Vizcarra dissolveu o Congresso, e os parlamentares responderam com a suspensão de seu mandato.“Em sua ansiedade por confronto, o presidente confunde seus adversários políticos com as instituições que eles representam”, disse Carlos Meléndez, especialista em política peruana, ao New York Times.
Turbinada por um escândalo de corrupção, a crise é um exemplo acabado de como a desgraça política pode ser explorada por aproveitadores e abrir caminho para fragilizar a própria democracia.
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