quinta-feira, 18 de agosto de 2022

Maria Cristina Fernandes - Não é só a economia

Valor Econômico

Rejeição a Bolsonaro supera intenção de votos em Lula no início oficial da campanha eleitoral

O aumento do auxílio emergencial e a redução no preço dos combustíveis são aprovados pela população, a rejeição do presidente da República diminui, a aprovação de seu governo sobe, mas sua intenção de voto não cresce na mesma proporção. Este é o cenário das últimas pesquisas no início oficial da campanha. Donde se conclui que não é só a economia que define o voto de outubro. O núcleo duro da rejeição bolsonarista resiste ao dinheiro que cai do helicóptero.

A rejeição de Bolsonaro, apesar de cadente, é maior que o apoio à candidatura do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, tanto no Ipec quanto na Quaest. A despeito da gastança e da redução da pressão inflacionária, a resiliência da rejeição se dá porque o voto tem mais a ver com a expectativa de futuro do que com a avaliação do presente. Com o isolamento demonstrado na posse no TSE, por exemplo, o presidente custa a convencer que melhores dias virão.

Todo governante em disputa de reeleição melhora seu desempenho entre os mais pobres porque, com a máquina na mão, pode adotar políticas que os favorecem. Foi assim com todos os que disputaram a recondução de mandato. Não é assim com Bolsonaro. Ao se eleger em 2018, não liderava as pesquisas entre os mais pobres. Foi o único, na redemocratização, a conseguir ser eleito a despeito desse desempenho.

Na disputa pela reeleição, Bolsonaro reprisa o feito. Apesar do aumento de 50% no Auxílio Brasil, o presidente não conquista os mais pobres. Ou, pelo menos, ainda não conquista. No Ipec, tem 19% na faixa até um salário mínimo e 29% entre um e dois SM (contra 60% e 44% de Lula).

É bem verdade que o Auxílio Brasil mal começou a ser pago. Mas corroboram para o ceticismo de seus dividendos eleitorais tanto a contrapropaganda petista (“pega o dinheiro e vota 13”, “o auxílio é que nem picolé, você chupa tudo e fica com o palito na mão”) quanto a experiência recente com o benefício durante a pandemia. Sua descontinuidade no início deste ano serviu de prévia para o que pode acontecer com seus beneficiários em janeiro de 2023 quando a lei prevê sua interrupção.

Isso talvez explique o cruzamento do Ipec mostrando o voto daqueles cujo núcleo familiar tem um beneficiário do auxílio e o daqueles que não o têm. Pois no primeiro grupo (com auxílio) Bolsonaro pontua pior do que no segundo (sem auxílio). Pela simples razão que o viés determinante é a renda. Como os beneficiários são os mais pobres e estes resistem mais a Bolsonaro, é a renda que determina o voto e não o auxílio.

A Quaest vai adiante e pergunta se as pessoas sabem quem é o responsável pelo aumento do Auxílio Brasil e pela redução do preço dos combustíveis. E lá está, sem tirar nem por, o devido crédito a Bolsonaro. Na segunda pergunta, porém, o eleitor mostra que manja tudo do negócio chamado campanha eleitoral. Seis em cada dez eleitores acham que tudo o que o governo faz na economia é para ajudar a eleição de Bolsonaro.

O melhor respiro para o bolsonarismo na última rodada de pesquisas é o desempenho cada vez melhor entre os evangélicos, o que só reforça o tom de uma campanha mais voltada para o misticismo do que para as entregas do governo. Mais Michelle, menos Jair.

Como a propaganda eleitoral na TV só começa na próxima semana, ainda não dá para dizer o quanto a ofensiva para amenizar a imagem do presidente lhe trará dividendos eleitorais. O que se sabe, por enquanto, é que há uma barreira a ser ultrapassada por Bolsonaro que o dinheiro não tem sido capaz de derrubar.

Isolado por opção

Ao definir o sistema eleitoral como objeto do orgulho nacional, o ministro Alexandre de Moraes colocou o voto em urna eletrônica no mesmo patamar da vacinação, dois atos cuja adesão distingue os brasileiros. E assim como o presidente se desgraçou ao enfrentar a vacina, também o fará se desafiar as urnas.

O comportamento de Bolsonaro na posse do novo presidente do Tribunal Superior Eleitoral, no entanto, não sugere que a cerimônia o tenha domesticado. O presidente não foi apenas emparedado pelas instituições ali representadas. Ele fez questão de se mostrar isolado. O comportamento explícito sugere que o troco virá em moedas de radicalismo.

Moraes deu respaldo institucional ao ato de 11 de agosto para antecipar a independência da democracia brasileira dos achaques bolsonaristas no 7 de setembro - o que não significa que estes não acontecerão. As imagens da posse de Moraes, quando as atenções estiveram voltadas para Lula, também fotografado cumprimentando Moraes, já fizeram metade do serviço.

O roteiro já está pronto. Assim como o ato do Largo de São Francisco, a posse de Moraes também teve foi retratada pelo bolsonarismo como de cunho “político-partidário”. Dessa forma, ao presidente, escanteado, não restará alternativa senão buscar respaldo popular - e das Forças Armadas - contra o “golpe da urna eletrônica”.

Na manhã seguinte à cerimônia, os grupos de WhatsApp da “comunidade militar” amanheceram apinhados de mensagens sobre a necessidade de adiamento das eleições em função das dúvidas surgidas no código-fonte das urnas eletrônicas.

O caldo golpista foi temperado nas mensagens pela associação feita pelos militares entre Lula e Gustavo Petro, o novo presidente colombiano que, em sua reformulação da guerra às drogas, trocou sete oficiais da cúpula das Forças Armadas.

Quem fala (mal) pelas Forças é o Ministério da Defesa, mas o comandante do Exército, Marco Antonio Freire Gomes, achou por bem soltar uma nota sobre o afastamento do coronel Ricardo Sant’Anna da comissão que acompanha a fiscalização das urnas eletrônicas.

O coronel infringiu três portarias do Exército, além do regulamento disciplinar da corporação e o estatuto dos militares. Ainda assim, não recebeu nenhuma punição. Contrariando todas as normas do Exército, o comandante, por meio da nota, limitou-se a respaldar o coronel ao dizer que as posições pessoais dos oficiais não interferem no desempenho de suas funções. Não apenas deixou de substituí-lo na comissão como não o puniu.

A confirmação, no dia seguinte à posse de Moraes, pelo Comando Militar do Leste, do 7 de setembro em Copacabana, ainda que sem parada militar, é indício de que Bolsonaro não desistiu. E tem respaldo para novo show de horrores.

Um comentário:

ADEMAR AMANCIO disse...

O pior é que tem plateia para aplaudir o show de horrores.