Blog do Noblat / Metrópoles
A decadência da educação brasileira
Há décadas os eleitos e os eleitores não reagem diante dos claros sinais de
decadência da educação brasileira e das consequências que esta tragédia
provocará sobre a economia e a sociedade: baixa produtividade, pobreza,
violência, estagnação cultural, atraso civilizatório. O maior sinal é o
abandono escolar por 50% de nossos adolescentes antes da conclusão do ensino
médio, e a constatação de que a metade dos que terminam são “analfabetos para a
contemporaneidade”: não são fluentes em idiomas estrangeiros, não sabem usar as
ferramentas do mundo moderno, não adquirem um ofício profissional que lhes
assegure emprego e renda, não estão preparados para aprender novos
conhecimentos que o mundo exige a cada novo momento.
A tragédia da educação é resultado do descuido com nossas escolas. Os
professores são tão desprezados que parte deles próprios perderam motivação
para o desempenho eficiente do magistério, até porque as escolas não lhes dão
as condições necessárias: ainda temos milhares sem água ou luz e dezenas de
milhares sem equipamentos modernos de computação e teleinformática, os prédios
são decadentes, os móveis feios e desconfortáveis, com manutenção precária. O
conteúdo ensinado não atende aos gostos dos alunos, nem parecem ter impacto na
vida futura deles. Ao lado deste sistema precário que atende a quase totalidade
de nossas 50 milhões de crianças, um pequeno grupo de escolas a custos
elevadíssimos oferece uma educação melhor, mas desnudam a outra triste face da
educação: a desigualdade conforme a renda e o endereço da família.
Sem qualidade e equidade, o sistema educacional brasileiro mostra sua tragédia
social ao desperdiçar nossos cérebros deixados para trás por evasão ou
aprovação aem estudos, e a tragédia pessoal em atos de violência entre alunos ou
contra professores, e até as bárbaras cenas de chacina. Nestes momentos, o país
desperta, as famílias se assustam, as crianças se traumatizam, o governo
procura demonstrar ativismo, mas todos pensam em como evitar a violência contra
pessoas, e continuam dormindo diante da violência do dia a dia contra o país e
sua população. Violência que não mata indivíduos com balas ou facas, mas
condena o futuro de milhões de crianças e do país inteiro.
O descuido com a educação é tão grande, que o assombro não desperta para a
tragédia educacional, não provoca mudar a escola, apenas colocar polícia nela.
O problema sai da educação e vai para o Ministério da Justiça. O governo
federal nem ao menos tem um ministério voltado para a educação de base, que
cuide das crianças. A tragédia não desperta o Brasil para adotar as escolas,
valorizar e prestigiar aos professores, fazer com que os prédios escolares
sejam os mais bonitos e confortáveis do setor público, tanto quanto os palácios
da justiça, do poder legislativo, do governador ou do presidente, cada escola
um Palácio da Educação. Seus equipamentos modernos sejam capazes de oferecer
eficiência pedagógica e atender ao gosto dos alunos nascidos no mundo digital,
querendo uma escola cinematográfica, onde o aluno fique o dia inteiro até os 18
anos de idade, não mais “escolas senzala”.
Ao lado destas condições, oferecer ensino que os alunos reconheçam como mapas
para que tenham sucesso na vida e facilite a conquista de sua felicidade.
Tornar a escola sagrada aos olhos de todos os brasileiros, tratando os alunos
com o mesmo cuidado e mesmo ensino, independente da renda e do endereço da
família. Este seria o caminho para evitar a violência constante e diária.
Mas isto exige despertar o Brasil para a tragédia menos dramática do que a
sentida pelos familiares de crianças ou professores violentados e até
assassinados no presente, mas não menos grave para o futuro, do que os tiros
que há décadas damos no coração do Brasil, incinerando os cérebros das crianças
que construiriam o futuro.
*Cristovam Buarque foi senador, ministro e governador
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