sexta-feira, 12 de abril de 2024

O que a mídia pensa: Editoriais / Opiniões

Ao antecipar gastos, governo sabota sua credibilidade fiscal

O Globo

Antes mesmo de novo arcabouço completar um ano, regras já são alteradas segundo a conveniência

O governo começa a jogar contra a própria credibilidade na gestão da dívida pública. Antes mesmo de o novo arcabouço fiscal completar o primeiro ano, as regras já começam a ser alteradas de acordo com a conveniência. A Câmara aprovou uma proposta, patrocinada pela Casa Civil, de antecipar um gasto extra de R$ 15,7 bilhões neste ano. Inserida como “jabuti” no projeto que recria o seguro obrigatório de veículos, a medida foi encaminhada ao Senado. O movimento levanta dúvidas sobre a vontade e a capacidade de o governo manter suas contas sob controle.

Pelas regras do arcabouço fiscal, é permitido ao governo gastar mais que o previsto em caso de excesso de receita. Mas só a partir de maio, mediante avaliação dos resultados. Em janeiro e fevereiro, a arrecadação deu um salto, mas a prévia de março sugere que houve um freio. Diante dessa perspectiva, um governo comprometido com as regras que ele mesmo propôs agiria com cautela. Esperaria os próximos resultados para ajustar o gasto à realidade.

Mas talvez seja esperar demais da atual gestão petista. A Casa Civil formulou uma solução de improviso: pedir permissão ao Congresso para antecipar o gasto a que o governo teria direito em maio caso a receita extraordinária se confirme. A manobra revela a vulnerabilidade do arcabouço fiscal.

A queda no endividamento público traria a economia para uma rota virtuosa, permitindo cortes sustentáveis nos juros, com efeitos positivos no investimento e no consumo. Ao que parece, há na Esplanada dos Ministérios quem prefira mirar em ganhos eleitoreiros de curto prazo. Preocupado com a queda na popularidade e com a proximidade das eleições municipais, o governo planeja usar parte dos R$ 15,7 bilhões para conceder reajuste salarial a servidores federais da educação, bastião histórico do PT que ameaça com greve.

Por enquanto, o Ministério da Fazenda garante que a meta de zerar o déficit público neste ano segue valendo. O que a equipe econômica pretende mudar são os objetivos para 2025 (superávit de 0,5% do PIB) e 2026 (1%). A meta exata do ano que vem será fixada no projeto da Lei de Diretrizes Orçamentárias, que deverá se enviado ao Congresso até segunda-feira. A discussão da equipe econômica gira entre zero e 0,25%. Reduzir a meta, ainda que possa ser justificável, desferiria mais um golpe na credibilidade fiscal.

Até o momento, a estratégia do governo para controlar as contas públicas se baseia essencialmente no aumento da arrecadação. Com apoio do Congresso em várias propostas para aumentar impostos, as receitas subiram. Mas não na proporção otimista desejada. Desde o começo, sabia-se que a injeção de novo dinheiro seria momentânea. Ninguém foi pego de surpresa.

Ao longo do ano passado, analistas já previam que o governo seria obrigado a mudar as metas. Em princípio, ajustes dessa natureza fazem parte da rotina de qualquer país diante das incertezas da economia. A atitude do governo é problemática por outro motivo. A propensão a pouco — ou nada — fazer para controlar despesas semeia dúvidas num momento em que precisa despertar confiança. O Brasil deve demais para um país de renda média. Isso é uma amarra ao crescimento. Essa é a essência da responsabilidade fiscal. As propostas de antecipar R$ 15,7 bilhões em gastos e de rever metas fiscais são indícios de que ou o governo não a entendeu ou, pior, não quer entender.

Recriação do seguro obrigatório reflete sanha arrecadatória do governo

O Globo

Estado não precisa obrigar dono de veículo a contratar apólices contra acidentes — sempre sujeitas a fraudes

Quase cinco anos depois de extinto, o seguro obrigatório para vítimas de acidente de trânsito, antes conhecido pela sigla DPVAT, promete voltar, rebatizado como SPVAT, por meio de projeto de lei complementar apresentado pelo governo, aprovado na Câmara e enviado ao Senado. Será mais uma taxa a ser paga a um Estado conhecido pela voracidade nos impostos. O texto aprovado na Câmara ainda considera penalidade grave, de acordo com o Código de Trânsito Brasileiro, não pagar o novo SPVAT.

A partir do governo Temer, o seguro obrigatório começou a ser extinto. Em 2018, o Conselho Nacional de Seguros reduziu sua tarifa em 63%. No ano seguinte houve novo corte, até a taxa ser extinta em 2020, quando valia apenas R$ 1,06 para carros particulares. O novo projeto estabelece a destinação de 35% a 40% da arrecadação, centralizada na Caixa, a municípios e estados em que haja serviço de transporte coletivo. O SPVAT recebeu, assim, apoio de prefeitos e governadores. Outro argumento de seus defensores é parte dos recursos ser destinada ao SUS.

Ambos são argumentos frágeis. Financiar o transporte coletivo ou o SUS são deveres de União, estados e municípios, haja ou não seguro obrigatório. O proprietário de veículos deveria ter a liberdade para contratar apólices junto à seguradora de sua preferência, ou então arcar com o ônus de acidentes. A existência de um mercado pujante de seguro automotivo no Brasil mostra que existe demanda pelo serviço e que o Estado não precisa se meter a criar um novo imposto a pretexto de garantir a segurança dos motoristas.

A cobrança do DPVAT sempre esteve sujeita a fraudes. Auditorias do Tribunal de Contas da União revelaram que, de 2005 a 2015, houve desvios de R$ 2,1 bilhões do fundo do seguro. Em 2015, a Polícia Federal deflagrou uma operação antifraudes e, no ano seguinte, as indenizações do DPVAT caíram 33,4%. Em 2017, mais de 17 mil pedidos de indenização fraudados foram retidos, somando R$ 223 milhões. Sinal de que os esquemas de assalto ao DPVAT haviam sido reativados.

Nas investigações da PF, foram descobertas indenizações pagas a quem sofrera acidentes andando a cavalo ou de bicicleta. Advogados pediam indenização sem conhecer as vítimas e embolsavam o dinheiro. Um policial civil, preso pela PF, cobrava R$ 100 por boletim de ocorrência fraudulento. Inventou 6 mil desastres de trânsito em um ano. A criação do SPVAT trará nova oportunidade a esse tipo de crime.

O governo tem justificado sua sanha arrecadatória com a necessidade de cumprir as metas fiscais. O caminho para isso não deveria ser criar mais impostos, mas reduzir gastos e aumentar a eficiência da máquina pública. Uma estimativa do Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação calcula que, no ano passado, o brasileiro trabalhou até o dia 27 de maio, quase cinco meses, apenas para pagar tributos, mais que americanos, britânicos, argentinos, chilenos, mexicanos ou espanhóis. O Senado ainda tem a chance de rejeitar a ressurreição do DPVAT e evitar que essa situação piore.

Inflação nos EUA é má notícia para o Brasil

Folha de S. Paulo

Projeção de juros americanos mais altos traz desafios para a economia aqui, em especial devido à alta do gasto público

Se a inflação brasileira proporciona boas notícias, com alta do IPCA de apenas 0,16% em março e 3,93% em 12 meses, o quadro nos Estados Unidos tem caminhado na direção oposta —o que, no final das contas, contribui para dificultar os cortes de juros pelo Banco Central.

Aqui, o índice de março ficou abaixo do esperado por analistas. Houve desaceleração em itens como alimentação e bens industriais, além de alívio no setor de serviços.

Os núcleos da inflação acompanhados pelo BC, destinados a mensurar pressões de caráter mais duradouro, subiram 0,15%, em média. Em 12 meses, a variação caiu de 4% em fevereiro para 3,8%.

Visto isoladamente, tal resultado traria otimismo ao mercado por ampliar as chances de que a taxa Selic possa ser reduzida para menos de 10% ao ano nas próximas reuniões do Comitê de Política Monetária do BC.

No mesmo momento, entretanto, foi divulgado o resultado da inflação americana no mês passado, de 0,4%, o que perfaz 3,5% em 12 meses. É uma cifra ainda muito distante da meta de 2% anuais perseguida pelo Federal Reserve. Pior, há vários meses que os índices não dão sinais de queda lá.

Em consequência, fica mais distante o início do ciclo de cortes dos juros americanos, hoje em 5,5%. Na abertura de 2024 estava incorporada uma expectativa de redução de 1,75 ponto percentual neste ano, agora reduzida para menos e 0,5.

Questiona-se, ademais, se será viável aliviar a política monetária diante do vigor da economia americana, que mostra forte criação de empregos, alta de salários além da produtividade e inflação renitente.

Não ajuda que os déficits orçamentários do governo Joe Biden sejam crescentes, o que alimenta a demanda e o risco de juros mais elevados de maneira permanente.

Não existe correspondência automática entre o cenário nos EUA e a gestão da nossa política monetária, como salientou o presidente do BC, Roberto Campos Neto. Mas há impactos relevantes.

Num exemplo, a valorização do dólar faz subir os preços dos combustíveis, também pressionados internacionalmente pelo petróleo mais caro. Não por acaso, a defasagem dos preços domésticos de gasolina já supera 15%, trazendo pressões para a inflação adiante.

Hoje estima-se que os juros brasileiros dificilmente cairão muito abaixo dos 10% ao ano, o que mostra a necessidade de maior prudência na gestão da economia.

O caminho para viabilizar taxas mais baixas no Brasil em meio a esse ambiente global inóspito é convencer a sociedade de que não haverá descontrole das contas do Tesouro Nacional. O governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT) não mostra essa compreensão.

Absurda farra salarial

Folha de S. Paulo

PEC do Quinquênio desrespeita teto constitucional em prol de carreiras bem pagas

A Comissão de Constituição e Justiça do Senado deve votar, na próxima quarta-feira (17), uma proposta de emenda à Constituição que representa mais um golpe contra os ideais de racionalização dos gastos públicos e enxugamento da máquina administrativa no Brasil.

Trata-se da PEC do Quinquênio, assim chamada por turbinar os salários dos membros do sistema de Justiça a cada cinco anos de exercício efetivo da profissão.

De acordo com o texto discutido, haverá um acréscimo de 5% no salário por período, até o limite de 35%. E pasme: esse benefício não se sujeitará aos limites do teto constitucional, hoje fixado em já generosos R$ 44.008,52 mensais, e ainda integrará os proventos de aposentadoria e pensão.

Defensor da medida, o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), argumenta ser necessário criar um ambiente atrativo para essas carreiras —e o faz como se não cuidasse de algumas das categorias mais bem pagas do país.

O senador Eduardo Gomes (PL-TO), por sua vez, ao relatar a matéria, estendeu o mimo a diversos outros servidores —como se o seu partido não apregoasse, em tese, a redução do tamanho do Estado.

Caso os senadores não saibam, os gastos com o sistema de Justiça em 2022 corresponderam no Brasil a 1,6% do PIB, o que nos deixa na liderança de um ranking com 53 países com informações disponíveis.

Boa parte do dispêndio advém de remunerações que, por variadas manobras, superam o teto constitucional. Segundo estudo do Centro de Liderança Pública, um basta nesse tipo de gastança pode gerar economia anual de R$ 3,9 bilhões, se tomados todos os servidores que recebem acima do limite.

Pacheco, Gomes e outros dizem que a PEC do Quinquênio ajudaria a acabar com os supersalários, pois, com sua aprovação, os demais penduricalhos seriam extintos e se concentrariam num acréscimo único e predefinido.

É difícil crer que senadores experientes sejam tão ingênuos, mas vá lá: ainda que estivessem certos quanto ao fim dos abonos e outros quejandos, o que eles defendem, na prática, é uma absurda constitucionalização da farra salarial.

Presente de grego na conta de luz

O Estado de S. Paulo

Preocupado com sua popularidade, Lula decide baixar o preço da energia na marra, mas a conta dessa demagogia deve ficar salgada para os consumidores no futuro

O presidente Lula da Silva decidiu baixar a conta de luz dos brasileiros na marra. Inspirado por sua criatura, Dilma Rousseff, que praticamente quebrou o setor elétrico quando forçou a redução do preço da energia elétrica entre 2012 e 2013, Lula recorrerá a uma gambiarra – não há outra palavra – para aliviar um pouco os orçamentos familiares, preocupado que está com a queda de sua popularidade.

Por meio de medida provisória, o governo vai pegar dinheiro emprestado para pagar o crédito tomado pelas distribuidoras de energia em nome dos consumidores para suportar tanto a pandemia de covid-19 como a grande seca que reduziu os reservatórios de água em 2021 e 2022. Esse passivo está embutido na conta de luz.

Na manobra, o governo vai securitizar R$ 20 bilhões que tem a receber da Eletrobras nas próximas duas décadas como parte do processo de privatização. Ou seja, o governo estará, na prática, antecipando esse recebimento por meio da emissão de títulos, pagando juros por isso.

Nas contas do governo, tudo isso resultará numa redução de até 5% nas contas de luz – eis a tal boa notícia que Lula persegue para apaziguar eleitores zangados com a falta de rumo de seu terceiro mandato.

Mas se trata de um presente de grego. O governo escolheu deixar de receber o dinheiro da Eletrobras no futuro para bancar uma bondade fugaz no presente. O problema é que o futuro um dia chega – momento em que esses recursos, já consumidos para angariar uns votos para Lula, farão falta, pois se destinam justamente a impedir a alta da tarifa. Logo, salvo uma nova gambiarra, a conta de luz, pouco depois da presumível queda, vai subir.

Foi exatamente o que aconteceu depois da infame Medida Provisória 579, baixada em 2012 pela então presidente Dilma Rousseff para fazer a conta de luz recuar prometidos 20%. Houve mesmo uma redução (em torno de 16%), resultado da pressão do governo sobre as distribuidoras para que aceitassem reduzir tarifas, deixando de receber por investimentos feitos, em troca da prorrogação das concessões. No entanto, em pouco tempo os custos para essas empresas dispararam, e esse rombo foi financiado nos anos seguintes pelos consumidores – uma auditoria do Tribunal de Contas da União feita em 2014 alertou que a redução tarifária de 2013 já estaria ultrapassada em 2015, ano em que o reajuste médio, de fato, foi superior a 50%. E o setor elétrico nunca mais se recuperou desse baque.

Mas uma das especialidades do PT é repetir erros na esperança de que os resultados sejam diferentes. Além da antecipação de recursos da Eletrobras, a medida provisória assinada agora por Lula prolonga por 36 meses os bilionários subsídios à geração de energia renovável. Se estivesse realmente interessado em baratear de forma estrutural as tarifas de energia, o governo enfrentaria os lobbies que conseguem manter esses penduricalhos que tanto encarecem a conta de luz e que nada têm a ver com o consumo de energia elétrica.

Hoje, o fornecimento de eletricidade corresponde a algo perto de 60% da tarifa. O restante é relativo a impostos e encargos usados para custear os subsídios distribuídos pelo governo que vão desde o combustível para usinas térmicas até setores econômicos considerados estratégicos. O que não falta é jabuti pendurado nessa árvore.

O fato é que a conta de luz se tornou uma fonte descontrolada de recursos para sustentar subsídios ao setor elétrico que deveriam estar no Orçamento, submetidos ao escrutínio público. Não é por acaso que essa prática nefasta começou no governo Dilma, que repassou ao consumidor a fatura de sua insanidade.

Não há razão para acreditar que agora será diferente, mas isso não tem a menor importância para o lulopetismo. Nos cálculos dessa turma, o barateamento da redução da conta de luz, como efeito da medida provisória ora assinada por Lula, pode ter efeitos positivos até 2026 – ano em que provavelmente o presidente buscará mais uma reeleição. É essa a única conta que importa para Lula.

Derrota dos liberticidas

O Estado de S. Paulo

Ao aprovar a permanência de Brazão na cadeia, a Câmara reforçou a linha divisória que separa legítimas críticas ao STF dos ardis para deslegitimar a Corte e minar a democracia

Os liberticidas perderam uma importante batalha em sua cruzada para deslegitimar o Supremo Tribunal Federal (STF) e, desse modo, degradar a qualidade da democracia no Brasil.

A bem do melhor interesse público, a Câmara dos Deputados aprovou a manutenção da prisão do deputado Chiquinho Brazão (sem partido-RJ), acusado pela Polícia Federal (PF) de ser um dos mandantes do assassinato de Marielle Franco. Não era desprezível o risco de que fosse bem-sucedida a tentativa dos bolsonaristas – de mãos dadas com os corporativistas da Casa – de instrumentalizar o caso envolvendo a morte da vereadora carioca para “dar um recado” ao STF, em particular ao ministro Alexandre de Moraes, a pretexto de defender as prerrogativas dos parlamentares.

Não é de hoje que esses inimigos da democracia se comportam como se travassem uma guerra particular contra o STF. Assim tem sido por obediência à tática adotada por dez entre dez populistas autoritários, qual seja, começar seus ataques contra o Estado Democrático de Direito pela via da subjugação ou cooptação do Poder Judiciário, e pelo fato de o STF ter sido um intransponível anteparo às estocadas golpistas de Jair Bolsonaro nos últimos anos. Tanto é assim que houve bolsonaristas que não se acanharam nem sequer para propalar o fechamento da Corte e a prisão de alguns de seus ministros, Moraes à frente.

A prisão de Chiquinho Brazão não significou violação das prerrogativas dos deputados, como bem decidiu a Câmara. Seguindo a Constituição, os pares de Brazão analisaram e ao fim chancelaram os fundamentos da decisão de Moraes, que, atendendo a um pedido da PF, expediu os mandados de prisão preventiva contra o deputado, seu irmão, Domingos Brazão, conselheiro do Tribunal de Contas do Rio de Janeiro, e Rivaldo Barbosa, ex-chefe da Polícia Civil fluminense. O estado de flagrância foi reconhecido pela série de ações e omissões dos suspeitos para obstar o deslinde do assassinato. Ademais, por envolver a acusação de pertencimento a “organização criminosa”, ficou caracterizado o crime inafiançável de que trata o art. 53, parágrafo 2.º, da Constituição.

O placar da votação final no plenário da Casa – 277 votos a favor, 129 contrários e 28 abstenções – transmite a ideia, não de todo desarrazoada, de que interesses os mais diversos estavam em jogo além do destino penitenciário de um deputado federal. Por si sós, a brutalidade do crime e a consistência dos indícios de autoria e materialidade que recaem sobre Chiquinho Brazão e os outros dois suspeitos – para além do fato de a vítima ter sido uma parlamentar em pleno exercício de mandato, como todos naquele plenário – idealmente deveriam unir a Câmara em torno de uma defesa inequívoca dos direitos humanos e da democracia representativa. Não sendo possível essa concertação civilizatória, chegou-se a um resultado que, ao fim e ao cabo, ao menos preservou a Casa de um vexame, pois seria escandaloso mandar soltar o deputado Brazão à luz de tudo o que já se sabe até agora pelas investigações da PF.

Além desse resultado, outro mérito da decisão da Câmara de manter Chiquinho Brazão na cadeia foi evidenciar ao País que há limites para essa ofensiva bolsonarista contra o STF. Essa linha divisória, a bem da verdade, já havia sido traçada quando da prisão do ex-deputado Daniel Silveira, um dos mais notórios camisas pardas do bolsonarismo. A votação do dia 10 passado só reforçou uma distinção que precisa ficar muito clara para a maioria da sociedade que carrega no coração os valores democráticos.

O STF não apenas pode, como deve ser criticado por suas decisões e comportamentos de seus ministros – alguns, no limite, incompatíveis com a magistratura. Razões não faltam para reparos, desde a vaidade de ministros que, como os siriris, não vivem longe do calor dos holofotes até o pouco-caso que a Corte faz com sua própria jurisprudência. O busílis são as intenções subjacentes às críticas. Genuínos democratas criticam o STF para aprimorar a democracia; golpistas irresignados, para subvertê-la.

Abstenção indecente

O Estado de S. Paulo

Governo Lula favorece Rússia e Irã em votação do Conselho de Direitos Humanos da ONU

No início deste mês, o Conselho de Direitos Humanos da ONU reuniu-se para votar resoluções que estendiam o prazo de investigações sobre crimes de guerra cometidos pela Rússia na Ucrânia e sobre violações dos direitos de mulheres, crianças e minorias pelo Irã desde 2022. As resoluções foram aprovadas, por serem obviamente necessárias, mas o Brasil escolheu se abster – mais um claro sinal de que o governo de Lula da Silva fez a opção preferencial pelos delinquentes em sua política externa.

No caso do Irã, a investigação da ONU começou em 2022, após a morte da jovem iraniana Mahsa Amini, presa sob a acusação de usar o véu islâmico de forma incorreta. O caso provocou grandes protestos no país, devidamente reprimidos pela polícia dos aiatolás, e não há nenhuma razão para acreditar que a situação tenha melhorado de lá para cá. No entanto, o representante do Brasil no conselho, embaixador Tovar da Silva Nunes, comunicou a abstenção brasileira “considerando que o Irã vai aumentar seus esforços para melhorar a situação dos direitos humanos no país e baseado em um espírito de diálogo construtivo”. Trata-se de uma evidente piada de mau gosto, que desrespeita profundamente as vítimas das violações de direitos humanos no Irã.

Já a comissão de inquérito sobre crimes de guerra cometidos pela Rússia na Ucrânia, criada em março de 2022, investiga o deslocamento e a deportação de crianças ucranianas e os ataques russos a civis. Há evidências de sobra dessas e de outras atrocidades cometidas pela tirania de Vladimir Putin, mas o governo brasileiro, novamente na voz de seu representante em Genebra, preferiu se abster alegando que a resolução era “desequilibrada” porque “coloca o fardo das violações dos direitos humanos apenas em um lado do conflito”.

Mais uma vez, o governo Lula tenta lançar sobre os ombros das vítimas da agressão russa parte da responsabilidade pela guerra e por seus efeitos trágicos e criminosos. Abundam exemplos da pusilanimidade e do cinismo de Lula em relação ao conflito, refletidos na abstenção do Brasil na ONU.

Vem de longa data a fascinação de Lula por regimes que hostilizam valores ocidentais, sobretudo dos que antagonizam os Estados Unidos e a Europa.

O PT celebrou a vitória de Putin na recente eleição de fancaria realizada na Rússia, e Lula está empenhado em arranjar uma brecha jurídica para recepcionar Putin na próxima reunião de cúpula do G-20, no Rio, driblando o mandado de prisão imposto contra o tirano russo pelo Tribunal Penal Internacional.

Já o Irã, cuja revolução islâmica se notabilizou pelo enfrentamento ao “Grande Satã” norte-americano, acaba de entrar no Brics, o grupo que integra o chamado “Sul Global” – consórcio de países, muitos dos quais ferozes ditaduras, que se dispõem a desafiar os valores ocidentais. O Irã lidera o autointitulado “eixo da resistência”, formado por países e grupos terroristas empenhados em varrer Israel do mapa e ameaçar interesses americanos no Oriente Médio. É esse país, que ademais nega a mulheres e homossexuais vários direitos básicos, que o Brasil resolveu apoiar na ONU.

Pioram cenários externo e interno para a inflação

Valor Econômico

Fragilidade das metas fiscais aumentou depois que os ministros da área econômica insinuaram que o tímido superávit planejado para 2025, de 0,5% do PIB, se tornou impraticável

Uma das possíveis guinadas dos mercados globais está ocorrendo agora: a inflação nos Estados Unidos prega peças nos investidores e, em vez de cair, ensaia alta ou mantém-se firme fora da meta. Com isso, o dólar sobe, pressiona as moedas dos emergentes e realinha as expectativas para as taxas de juros em países como o Brasil. O movimento mudou as apostas sobre o nível final da Selic - uma parte importante dos analistas o vê agora mais perto da faixa 9,5%-9,75% do que de 9%, aposta anterior.

O alerta para os investidores soou quando o índice de preços ao consumidor (CPI) nos EUA aumentou de novo, de 3,2% para 3,5% em março. Em fevereiro, havia subido de 3,1% para 3,2%. Como o Federal Reserve não mexeu nos juros, que permanecem os maiores em 22 anos, o cenário piorou bem. Os títulos do Tesouro americano de dois anos passaram a pagar perto de 5% e os de 10 anos, acima de 4,5%. Anteontem, o Fed divulgou a ata da reunião mais recente, e a maioria dos argumentos passa longe da ideia de iniciar em breve o processo de corte dos fed funds.

Em primeiro lugar, os membros do Fed não viram qualquer sinal que lhes desse confiança de a inflação está se movendo sustentavelmente rumo à meta de 2%. Alguns participantes da reunião indicaram que há riscos geopolíticos em cena que podem criar gargalos importantes na oferta ou aumentos relevantes nos custos do transporte marítimo que podem pressionar os preços para cima, derrubando as taxas de crescimento. Os ataques de Israel a Gaza e da Rússia à Ucrânia, além dos ataques houthis nas rotas de escoamento de petróleo no canal de Suez, podem aumentar os preços da energia, colocando um risco altista na inflação.

Antes da divulgação da inflação ao consumidor de março, os mercados já registravam um recuo no ritmo previsto de cortes futuros nos fed funds, de três para duas reduções de 0,25 ponto percentual até o fim do ano. Depois que a ata do Fed não sinalizou a menor urgência de que o BC americano vá reduzir os juros em futuro próximo, as apostas dos investidores se distanciaram ainda mais dos prognósticos otimistas do início do ano. Com a alta discreta do CPI e de seu núcleo, alguns investidores passaram a sugerir que o afrouxamento da política monetária não mais terá início em julho, mas depois de setembro, com chance crescente de apenas um corte em 2024. Uma ala dos investidores começou a desenhar a paisagem de “no landing”, ou seja, a economia americana não desaceleraria, apesar da forte restrição monetária, e a inflação se manteria acima da meta.

Apesar de ingressar tardiamente no ciclo de aperto monetário, o Banco Central Europeu hoje parece estar em uma posição mais confortável para invertê-lo do que o Fed, contra todas as expectativas anteriores. Um dos motivos é que a desaceleração econômica foi bem mais forte na zona do euro, com alguns países, como a Alemanha, aproximando-se da recessão. O índice de inflação no bloco monetário caiu a 2,4%, bem mais perto da meta do que está o Fed. Ainda assim, na reunião de ontem o BCE manteve os juros em 4%. Ao contrário do congênere americano, porém, alguns membros do banco central se mostraram favoráveis a iniciar logo a queda dos juros.

A reversão das expectativas coloca problemas para o processo de acomodação monetária nos emergentes. No Brasil, as taxas futuras chegaram a saltar acima das vigentes quando se iniciou o processo de redução dos juros, em agosto. O boletim Focus mostrou ligeiro deslocamento no sentido contrário às metas do IPCA de 2024 e 2025, e pode se afastar mais dependendo de variáveis domésticas como o nível de evolução dos salários e do emprego - que começa a ser considerado incompatível com reduções adicionais da inflação -, o diferencial de juros em relação aos EUA, o desempenho fiscal e, como resultado da interação desses fatores, o grau de valorização do dólar em relação ao real.

A aprovação pela Câmara dos Deputados, sob inspiração do ministro da Casa Civil, Rui Costa, de um jabuti que subiu no dorso da recriação do Dpvat, seguro contra acidentes com veículos, para permitir já um aumento de gastos de R$ 15,7 bilhões, e assim obter recursos para emendas parlamentares vetadas pelo presidente Lula, que serão derrubadas, arranhou ainda mais a credibilidade das metas fiscais. A fragilidade delas aumentou depois que os ministros da área econômica insinuaram que o tímido superávit planejado para 2025, de 0,5% do PIB, se tornou impraticável.

A redução de 0,5 ponto da Selic na próxima reunião do Copom está assegurada, mas os passos seguintes se tornaram incertos. Para o presidente do BC, Roberto Campos Neto, o que ocorre nos EUA pode não ocorrer aqui. Ontem, ele apontou o canal do câmbio como fator de transmissão da mudança, que primeiro afeta as expectativas de inflação e “depois afeta a inflação”. Ele afirmou que essa dinâmica não está acontecendo. O dólar, no entanto, se valoriza em relação ao real, o que é uma oscilação recorrente, mas uma mudança de patamar consolidada seria preocupante para a evolução do IPCA. O horizonte de queda da inflação tornou-se nublado e duvidoso.

Olhar atento aos idosos

Correio Braziliense

Amanhã, vários municípios promovem o Dia D de Vacinação contra a Gripe. No ano passado, 54,9% das internações por síndrome respiratória aguda grave (SRAG), causada por influenza, foram registradas na população 60+

A vacinação de públicos prioritários, especialmente de idosos, nunca deixou de ser uma preocupação de especialistas, de órgãos da saúde e de seus governantes. E não é para menos. Essa faixa etária - composta por pessoas acima de 60 anos — representou quase 66% das mortes de pacientes hospitalizados por influenza (o vírus da gripe) em 2023 no Brasil. No ano passado, 54,9% das internações por síndrome respiratória aguda grave (SRAG), causada por influenza, foram registradas na população 60 .

Quando os idosos em questão têm idade superior a 80 anos, os números ainda estão piores: 26,7% das pessoas hospitalizadas por SRAG causada por influenza foram a óbito em 2023 por conta das complicações da doença, enquanto na faixa etária de 60 a 69 anos a letalidade chegou a 19%. Levando-se em conta que cerca de 70% de pessoas acima de 60 anos têm uma ou mais doenças crônicas, além de um maior risco de agravamento de infecções, nada mais natural que a atenção em relação a esse público seja redobrada.

Outro fator determinante para que o Ministério da Saúde concentre seus esforços no sentido de levar grupos prioritários aos postos de saúde é a baixa cobertura vacinal contra a gripe em 2023: apenas 60,6% desse público recebeu o imunizante - número considerado bem aquém dos 91% e 95% de anos anteriores (2019 e 2020).

Não há dúvidas de que a desinformação e o negacionismo com relação às vacinas tenham uma parcela significativa de contribuição para a baixa cobertura em todo o país. Levantamento publicado pela Fundação Oswaldo Cruz em 2022 mostra que grande parte da população (68,9%) ainda tem bons níveis de confiabilidade na ciência e mais de 86% dos participantes da pesquisa consideram a imunização importante para a manutenção da saúde pública. No entanto, 14% não acham as vacinas necessárias, e 46% afirmam que os imunizantes produzem efeitos colaterais que são um risco.

A enxurrada de fake news despejada especialmente nas redes sociais impactou significativamente para que as pessoas perdessem o hábito e a confiança em se vacinar. E, aqui, incluem-se todas as faixas etárias, de todas as classes sociais.

No próximo sábado (13), vários municípios brasileiros promovem o Dia D da Vacinação contra a Gripe — a exemplo de Porto Alegre (RS), Franca (SP), Belo Horizonte (MG), Curitiba (PR), Rio de Janeiro (RJ), Aracaju (SE), entre outros. Fato é que nem mesmo as campanhas de divulgação e a antecipação da vacinação contra a gripe este ano - de abril para o fim de março — traduzem-se em uma cobertura vacinal exitosa.

E estamos falando da oferta de três tipos de vacinas contra a gripe no mercado brasileiro: a trivalente pelo Programa Nacional de Imunizações (PNI), do governo federal; a quadrivalente, ofertada na rede privada; e a quadrivalente de alta dose, com uma quantidade quatro vezes maior de antígenos, justamente para atender os idosos acima de 60 anos. 

 

 



 

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