quarta-feira, 4 de fevereiro de 2009

Indústria cai pelo 3º mês e aponta recessão no país

Tombo histórico
Cássia Almeida e Bruno Villas Bôas
DEU EM O GLOBO


Indústria tem maior queda desde 91 e economistas veem recessão no país

A indústria brasileira registrou em dezembro, a maior queda na sua produção desde 1991, quando começou a série histórica do IBGE. O recuo foi de 12,4% em relação a novembro. Foi a terceira queda consecutiva e, em três meses, o setor encolheu 19,8%. Os números surpreenderam analistas e governo, que pretende agora tirar da gaveta um projeto para estimular compra de geladeiras por R$ 500. Consultorias e bancos calculam que o PIB tenha recuado entre 1,3% e 3% de outubro a dezembro de 2008. A Confederação Nacional da Indústria já admite recessão.

Um verdadeiro colapso atingiu a indústria brasileira em dezembro do ano passado. Uma chuva de números negativos tomou conta da divulgação da pesquisa industrial ontem pelo IBGE. A produção do setor caiu 12,4% frente a novembro e 14,5% contra dezembro de 2007, nas maiores quedas já vistas desde 1991. É o terceiro mês seguido de retração, na comparação com o mês anterior, o que fez a produção encolher 19,8% no período. Tombo desse tamanho em período tão curto ainda não tinha sido registrado na história recente do país. Diante da queda da produção em dezembro, acima das expectativas que giravam perto de 10%, as previsões de estagnação da indústria este ano começam a surgir e há economistas que já consideram o país em recessão.

- É inexorável considerar que estamos numa recessão - afirmou Sergio Vale, economista-chefe da MB Associados, que prevê queda de 2,5% no quarto trimestre de 2008 no Produto Interno Bruto (PIB, conjunto de bens e serviços produzidos no país) frente ao período de julho a setembro, e de 0,2% nos três primeiros meses deste ano. - Para o ano de 2009, esperamos expansão de 1,2% (o que seria a menor taxa desde 2003 quando a economia avançou apenas 1,1%).

Com essa derrubada da indústria no último mês de 2008, a quantidade de bens produzidos voltou aos níveis de março de 2004, recuando quase cinco anos. Em dezembro, houve queda na produção de 69,5% dos 755 itens pesquisados pelo IBGE. A expansão de janeiro a setembro impediu que o setor caísse em 2008. A alta foi de 3,1%, menos da metade dos 6,4% captados até setembro no ano.

- Foi um colapso sem precedentes na era pós-Real. Nada parecido houve até agora. E há risco, sim, de estagnação da economia este ano - afirmou o economista-chefe da GAP Asset, Alexandre Maia.

Segundo Isabella Nunes Pereira, gerente da pesquisa do IBGE, vários fatores levaram à essa derrubada na produção:

- Houve deterioração forte do nível de confiança, com o crédito escasso e caro, o que reduziu a produção de bens duráveis (-42,2% frente a dezembro de 2007), puxada pela redução de 49,4% na fabricação de veículos.

Ela também culpou o freio brusco na demanda internacional por commodities metálicas, como minério de ferro e produtos siderúrgicos. Isso afetou diretamente a produção de bens intermediários (os insumos da indústria) que recuaram 18,2% frente a dezembro. Essa categoria de produtos é a que mais preocupa o economista-chefe da Convenção Corretora, Fernando Montero.

- Esse setor responde por mais de 50% de toda a produção. Com a retração local, o caminho natural seria desviar o excedente para o mercado externo. Diante do quadro mundial, não há o que fazer com o excedente. Temo por esse ajuste de estoque dessa parcela da indústria. Nada indica neste início de ano que a indústria alcançou o fundo do poço em dezembro. Mesmo com a queda no fim do ano, pode ter havido novo corte em janeiro.

Há visões mais otimistas. Bráulio Borges, economista-chefe da LCA Consultores, prevê alta de 10% na produção em janeiro frente a dezembro. Queda da mesma magnitude, 10%, vai se observar na comparação com janeiro de 2008:

- Há sinais positivos, como melhoria na confiança do consumidor e dos empresários. E as vendas de veículos avançaram bem. Mas essa alta se dará sobre uma produção muito deprimida.

PIB pode cair 0,8% no 1º trimestre

Borges diz que o ajuste de estoque da indústria vai se esgotar no primeiro trimestre. Daí a sua previsão de crescimento mais forte da produção no segundo trimestre.

- A história mostra que depois de um ajuste de estoque, a indústria reage rápido e forte.

Os números de dezembro provocaram revisões nas projeções do PIB. Há consultoria prevendo que este ano a economia poderá sofrer contração de 0,2%, aproximando-se da estagnação verificada em 1998 e 1999, anos de crise cambial. Oito instituições consultadas pelo GLOBO revisaram seus números para baixo. Todas acreditam no encolhimento da economia no quarto trimestre frente ao terceiro (de -1,3% a -3%) e não descartam nova queda no PIB no primeiro trimestre deste ano, embora a maioria não tenha números fechados.

André Perfeito, economista da Gradual Investimento, aposta em queda de 2,25% do PIB no quarto trimestre e de 0,8% de janeiro a março deste ano. Ele fez uma das projeções mais pessimistas para a economia brasileira este ano, ao prever uma retração de 0,2% no PIB em 2009. Resultado da recessão nos EUA e do crescimento menor da China:

- Mesmo com um corte maior nos juros, não acredito em expansão na economia. O resultado de 2009 já está contratado, principalmente por estar comparado com 2008 quando a economia cresceu forte.

Alexandre Maia, da GAP, diante da chuva de números negativos, acredita que os juros básicos da economia (Taxa Selic em 12,75% ao ano) cheguem a um dígito este ano:

- É de se esperar uma resposta agressiva do Banco Central.

Para Sergio Vale, da MB Associados, a recessão será puxada pela indústria, principalmente a extrativa mineral, com as fortes quedas observadas nos preços de minério de ferro. Pelo lado da demanda, ele prevê investimentos ainda positivos, graças ao setor de construção civil e máquinas e equipamentos.

- As exportações devem cair 8,7% no quarto trimestre, resultado da queda da demanda externa.
Embora não descarte completamente a retração da economia este ano, a maioria dos analistas prevê crescimento fraco para o PIB, de 1,2% a 2,8%. Marcela Prada, economista da Tendências, acredita em estabilização no segundo trimestre deste ano e um início de recuperação a partir de julho.

- Tem aumentado o risco de PIB negativo no ano, mas tudo dependerá do nível de confiança do consumidor e dos empresários. Precisamos aguardar os resultados das medidas de política fiscal e monetária que estão sendo tomadas - afirmou Marcela.

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