segunda-feira, 27 de julho de 2009

Gabeira analisa candidatura em função das 'chances reais' de vitória de Cabral

Ana Paula Grabois, do Rio
DEU NO VALOR ECONÔMICO

Quase eleito como prefeito no ano passado ao prometer um estilo de política diferente aos cariocas, o deputado Fernando Gabeira (PV) procura manter o jeitão apolítico, mas nunca esteve tão próximo das confabulações eleitorais. Afinado com o PSDB desde o início da campanha municipal de 2008, partido que o vê como palanque ideal para a candidatura presidencial do governador José Serra no Estado, o deputado agora aguarda o desenlace dos arranjos regionais para decidir se sai candidato ao Palácio da Guanabara, como querem os tucanos e o DEM, ou se tenta um vaga no Senado.

Gabeira recebeu o Valor com o estilo usual: camisa estampada, jeans e tênis de camurça. Além dele e da mulher, moram no apartamento duas gatas. A decoração é despojada, sem luxo, embora fique na valorizada Ipanema, na zona sul carioca. Mineiro de Juiz de Fora, 68 anos de idade, se diz cansado de Brasília, onde cumpre o quarto mandato consecutivo na Câmara Federal.

"Tem que ter sanidade mental para ouvir esse discursos durante 15 anos", diz.

O ambiente do Planalto Central, onde apenas se respira política, não é um atrativo para Gabeira.

Acha até monótono. Por isso, desenvolveu um hobby, a fotografia. Está montando o que chama de diário visual da capital federal e de suas idas, vindas e esperas nos aeroportos. Divaga sobre as perspectivas de sua carreira dizendo vislumbrar até a possibilidade de abandonar a política para fazer assessoria em temas nos quais se concentrou nos últimos anos, como ambiente, política externa e transparência política.

Crítico da corrupção no Congresso, acabou na lista dos deputados que se beneficiaram da farra das passagens aéreas na Câmara. Ele deu de presente uma passagem para uma das duas filhas, a que mora no Rio, visitar a outra no Havaí. Logo depois, foi acusado de beneficiar a mulher em contrato de prestação de serviços de internet pago com a verba indenizatória de seu gabinete.

Gabeira, que diz possuir como bens apenas "duas motocicletas e uma bicicleta", não enxerga eventuais impactos negativos sobre seus eleitores, especialmente sobre aqueles conquistados na eleição passada, boa parte desencantados com a política e de perfil mais conservador. "Quero prestar contas. No caso da passagem, devolvi o dinheiro. Foram R$ 86 mil de crédito. Apresentei ao Temer (Michel Temer, presidente da Câmara) as normas, que acabaram sendo adotadas e que reduziram os gastos. Foram medidas claras de reparação", explicou o deputado. "Me sinto numa posição muito melhor do que os ingleses", brinca o deputado, numa referência aos escândalos recentes no Parlamento inglês envolvendo gastos supérfluos dos parlamentares.

Sobre a mulher, Neila Tavares, disse ter contratado seus serviços quando ainda namoravam.

Depois de casados, o contrato acabou, diz.

Pioneiro na divulgação das doações de campanha na internet durante as eleições, Gabeira não viu espaço político para inserir o tema na recente mudança na lei eleitoral, pois havia uma grande parcela de parlamentares defensora da anistia a todas as multas eleitorais. "Quem está neste afã de anistiar quem foi multado está querendo reduzir ao máximo essa possibilidade (de controle)", afirmou.

Praticamente um estranho no ninho dentro do PV, não acompanha sempre o voto da bancada de 13 deputados. "Sou oposição, eles (o governo) apoiaram meu adversário, Eduardo Paes, no Rio", diz. O PV faz parte da base do governo, tem a pasta da Cultura nas mãos de Juca Ferreira e não apoia a eventual candidatura de Gabeira ao governo do Rio. Prefere a disputa por uma cadeira do Senado. O PV também já se pronunciou a favor de uma candidatura própria à Presidência da República, em favor da senadora e ex-ministra do Meio Ambiente Marina Silva, ainda no PT.

O deputado, porém, parece mais interessado em aliar-se aos tucanos. "Não tenho uma posição formada. Temos conversado com o PSDB. Fomos, toda a bancada do PV, almoçar com o Aécio (Neves, governador de Minas Gerais) e estamos combinando um almoço com o (José) Serra (governador de São Paulo)", disse. O que vai pesar na escolha da eventual candidatura para concorrer com o governador Sérgio Cabral, candidato à reeleição pelo PMDB, são as chances reais de vitória. "Candidatura só para marcar posição não me interessa".

Vê Cabral como candidato "muito forte" num contexto de mais dificuldades em financiar campanhas devido à crise. "Ele tem a máquina e grandes fornecedores que, de certa maneira, são gratos ao governo por sua parceria. Vamos examinar porque não quero levar a população do Rio, do Estado, que me acompanharia, a uma nova derrota", diz o deputado.

Oito meses depois de terminada a campanha municipal, reconhece como seu principal erro o episódio no qual disse ser a vereadora Lucinha (PSDB) dona de pensamento suburbano. A frase, ouvida por jornalistas sem que ele tivesse percebido, acabou virando combustível para o adversário, Eduardo Paes (PMDB), vencer a disputa.

De gestos suaves e voz tranquila, o ex-guerrilheiro, que participou do sequestro do embaixador americano Charles Elbrick em troca da libertação de 15 presos políticos em 1969, tem visão extremamente crítica ao governo e ao PT, partido do qual foi filiado de 2001 a 2003. Em um texto intitulado "Última Sessão" publicado no último dia 17 em seu blog e também no jornal "Folha de São Paulo", o deputado do PV defende a saída do presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP) do cargo e mira sua metralhadora para o PT. "A estrela vermelha, para mim, não tem sentido. Eu a vi nos tanques sérvios que atiravam nos civis e em nós, repórteres. Agarrados à estrela vermelha, perpetraram crimes horrendos sob o título de limpeza étnica. Assim como a suástica, estrelas vermelhas levam ao desastre, quando se decide obedecer cegamente a um projeto de poder", diz um trecho do texto.

Gabeira adquiriu postura mais moderada ao defender as questões ambientais. Chega a se colocar fora dos grupo dos ecologistas e vê avanços na Medida Provisória 458, conhecida como MP da Grilagem, diante da falta de regulamentação anterior. A MP foi criticada por conceder algumas vantagens aos ruralistas. "Para negociar essa MP, com todas as suas dificuldades, em primeiro lugar foi preciso quebrar a resistência de representantes do agronegócio. Eles achavam que o governo queria chamar os proprietários para confiscar as terras. A gente mostrou que não, que se o governo quisesse, era só confiscar. Por outro lado, tinha também os ecologistas, que queriam uma lei bastante dura. E eu dizia que se a gente fizesse uma lei muito dura, ainda que passasse, as pessoas iriam preferir continuar na clandestinidade", explicou.

O assunto, diz ele, deverá ser tratado com cautela pelos candidatos a presidente do PT e do PSDB, de olho no capital eleitoral ruralista. Em 2006, foi nos Estados de base predominantemente rural que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva perdeu no primeiro turno para o ex-governador Geraldo Alckmin (PSDB). Aprendeu a lição e assumiu o segundo mandato disposto a fazer mais concessões aos ruralistas e disputar esse terreno com a oposição.

"Os dois lados precisam e vão fazer concessões. O discurso centrista vai predominar", afirma o deputado do PV. Por enquanto, Gabeira aproveita o recesso de dez dias na Câmara viajando ao interior do Estado, onde tem pouca popularidade. Visitará Niterói e cidades da região Serrana, localidades onde obteve boa votação como deputado. Pretende entender melhor as demandas desses eleitorado e fazer um "trabalho de aproximação".

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