segunda-feira, 4 de abril de 2011

Esperando a colheita:: Raquel Ulhôa

Há exatos 11 anos, o plenário do Senado parou para assistir a um dos mais fortes bate-bocas de sua história, entre Jader Barbalho, que presidia o PMDB, e Antonio Carlos Magalhães, presidente da Casa. Munidos de dossiês contra o oponente, ambos trocaram ofensas pessoais e acusações de envolvimento em corrupção. Na época, o episódio foi definido por Jader como um "strip-tease moral".

A violência do enfrentamento público entre dois dos principais líderes do Senado levou-os a um desgaste político que lhes custou os mandatos.

ACM, por seu envolvimento na violação do painel eletrônico na votação da cassação de Luiz Estêvão, renunciou em 2001 para evitar processo por quebra de decoro que poderia levar à cassação _ o que o tornaria inelegível por oito anos. Disputou novamente o Senado em 2002, foi reeleito e morreu em 2007.

Jader conseguiu se eleger presidente do Senado no início de 2001, mas, enfraquecido pelas denúncias, afastou-se do cargo. Meses depois, também renunciou ao mandato de senador, para - assim como o adversário - evitar o risco de cassação em um processo disciplinar.

Em 2002, foi preso por um dia pela Polícia Federal, numa operação de investigação de desvios de recursos da Superintendência de Desenvolvimento da Amazônia (Sudam). Solto, foi eleito deputado federal pelo Pará e reeleito em 2006.

Foram oito anos de uma atuação discretíssima na Câmara, embora mantidas a influência na política paraense, a participação nas principais articulações do PMDB e a interlocução com o governo federal. Apoiou o ex-presidente Lula e a eleição de Dilma Rousseff, a quem hoje elogia pela "maturidade" demonstrada nos primeiros meses de governo.

Em 2010, Jader considera ter recebido seu "coroamento político", ao receber 1,8 milhão de votos para o Senado. Foi o segundo mais votado, mas não pode assumir. A candidatura foi impugnada pela Justiça Eleitoral com base na Lei da Ficha Limpa, que define como uma das causas de inelegibilidade a renúncia para escapar de processo de cassação.

Agora que o Supremo Tribunal Federal (STF) julgou que essa lei não poderia ser aplicada na eleição de 2010, Jader considera-se finalmente liberado para voltar à Casa de onde saiu há 10 anos.

Para ele, o assunto está "esgotado" e sua posse depende apenas de "medidas burocráticas", apesar de algumas controvérsias jurídicas e da promessa da atual ocupante da vaga, Marinor Brito (PSOL), de dar trabalho. Ela avisa que continuará exercendo plenamente o mandato até que se esgotem todas as possibilidades de questionamento jurídico.

"A decisão do Supremo foi clara ao julgar que a lei não teria eficácia em 2010. Não foi em aramaico ou grego. Foi em português. Me parece uma extravagância qualquer tentativa de discutir. Esse é um assunto que, no meu entendimento, está esgotado. Falta ser cumprido apenas o ritual de natureza burocrática", diz Jader.

Perder "alguns dias", segundo ele, não comprometerá um mandato de oito anos. "Eu não me encontro em nenhum estado de ansiedade. Só quem tem voto é que pode exercer. E eu tive um milhão e 800 votos, apesar de toda a campanha contra mim."

Jader planeja exercer seu "melhor mandato", voltado principalmente para os interesses do Estado. "Na Câmara, votei o que tinha que ser votado, colaborei no que tinha que colaborar. Mas era momento de ser discreto. Uma das grandes lições de retorno ao parlamento depois de situações extremas foi dada pelo Churchill. Quando voltou ao parlamento depois de derrotado nas eleições, após a segunda guerra mundial, manteve posição muito discreta. Tudo na vida são fases. Casa uma com a sua agonia. A vida é um imenso aprendizado."

Reassumir o mandato de senador significará uma espécie de volta do exílio. Nesse período em que esteve fora, o paraense sempre foi tratado no PMDB como membro da bancada do Senado. Na divisão dos cargos no governo federal, as vagas de diretores da Eletronorte preenchidas por indicações de Jader sempre foram para a cota da bancada do Senado.

Jader fala com tranquilidade sobre a inevitável convivência que terá na Casa com Pedro Taques (PDT-MT). Como ex-procurador da República do Mato Grosso, Taques pediu sua prisão preventiva em 2002, em inquérito que investigou desvios de recursos da Sudam.

"Eu não trabalho com restrições de natureza pessoal. Não existe nenhuma dificuldade para mim [conviver com Taques]. Não faço política voltada para as pessoas", afirma.

Se depender de Taques, não haverá problema no relacionamento com Jader. "Eu não fiz nada de errado para ficar constrangido. Exerci meu papel constitucional como procurador da República, junto com outros colegas. Nada foi feito sozinho. Foi um trabalho constitucional e vou continuar exercendo meu papel constitucional aqui, num outro espaço público".

O ex-procurador prevê um processo "relativamente demorado" antes que Jader e outros beneficiados pela decisão do STF possam assumir. Para ele, cada caso terá de ser analisado. Taques acredita que a Lei da Ficha Limpa poderia ter sido aplicada para as eleições de 2010 e considera o julgamento do STF "lamentável".

Uma convivência pacífica entre Jader e Taques não será surpresa, numa Casa de confrontos e reconciliações. Na atual legislatura, houve o reencontro do ex-presidente Fernando Collor de Mello com seu vice-presidente Itamar Franco - que o sucedeu na Presidência da República após o impeachment - e com Lindbergh Farias, ex-líder do movimento estudantil que foi às ruas pedir seu afastamento.

Para Jader, tudo é uma questão de tempo. "Dizia o Eclesiástico: há tempo de falar e há tempo de calar; há tempo de plantar e tempo de colher. Nesse período eu vi tanta coisa acontecer com tanta gente..."

Raquel Ulhôa é repórter de Política em Brasília. Luiz Werneck Vianna deixa de ocupar este espaço a partir de hoje

FONTE: VALOR ECONÔMICO

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