segunda-feira, 14 de novembro de 2011

Risco de salvar quem não sabe nadar:: Wilson Figueiredo

Paira sobre os fatos menores que compõem o momento brasileiro uma ausência de expectativa digna de atenção e ação, se ainda houver interesse em contornar conseqüências para as quais não estamos nem aí desde que voltamos à democracia. Aliás, nem elas, as conseqüências, andam por perto. Está ainda à disposição o entulho autoritário, denominação genérica, que não foi objeto da varredura do caminho de uma democracia que se mostrou melhor do que a encomenda. Continua devendo.

Já se foi o tempo em que era suficiente o Brasil ser objeto da eterna disputa entre otimistas e pessimistas. A República não tem de que se queixar: uns e outros ocupam-se do que continua ao alcance deles, no jogo de aparências, em ditadura ou na democracia. Cabia aos pessimistas dar a penúltima palavra, porque a última nunca foi pronunciada.

A última ditadura, que não apreciava ser referida como tal, cumpriu à risca a prioridade do programa de deterioração da atividade parlamentar. Não é por acaso que os políticos e a política ocupam as piores posições nas pesquisas de opinião pública. Perderam a confiança e não se interessam em recuperá-la. Eles e ela, os eleitos e a opinião geral, desde que veio à luz do dia o famigerado mensalão, vivem a expectativa de faxina normativa na representação política. Mas o eleitor não está nem aí. Falta alguém, ou uma oposição, mostrar à parte de baixo da sociedade a extensão da criminalidade no espaço público com exemplos que vêm de cima.

A censura aos meios de comunicação sufocou na fonte a própria retórica parlamentar. A ditadura abasteceu de privilégios e vantagens, a título de oxigênio, a maioria parlamentar escondida atrás do silêncio. Sem esquecer a pontaria autoritária, que contemplou o mandato representativo com vantagens e privilégios que favoreceram a ditadura e prejudicam a democracia até hoje, sem ninguém providenciar a varredura.

Os recursos que a ditadura propiciou à maioria que a serviu, como prêmio por não perturbá-la, continuam por aí, já incorporados a um conceito de democracia com folga ética vergonhosa. Três senadores por estado e mais estrelas na bandeira nacional, mediante redivisões territoriais para sacudir a Federação. Ficou a saudade da ditadura em governantes que perdem o sono com a liberdade de imprensa e não atinam com o fio da meada.

A safra de escândalos passou a se escoar como esgoto a céu aberto. O governo Dilma Rousseff, amarrado pela contradição entre ser contra falcatruas e ter a iniciativa tolhida , equilibra-se perigosamente entre ser e não ser. A presidente desliza entre os que esperavam colher a safra plantada no tempo de Lula e a surpresa de vir a ser, a contra gosto, um governo a mercê do imponderável que não estava nos seus cálculos e não tem hora para se instalar. Já se processou a defenestração de seis ministros sem que se estanque a sensação de que seria melhor que tivesse ocorrido na sua posse o parto do ministério que a represente. Um governo que começa não pode deixar subentendido seu mandato como exame de segunda época para ministros sobrecarregados de fatos e boatos que dispensam comprovação.

O que já se viu e ouviu, na peroração e na retratação do ministro Carlos Lupi, que falou pelos cotovelos, vai contaminar o segundo ano do mandato presidencial de Dilma Rousseff. O primeiro ministro a sair não teve tempo de fechar a porta por onde não se sabe quantos ainda passarão. Quanto mais cedo ela se livrar do antecessor e da sombra dele no seu governo, por intermédio de ministros que ficaram para trás, melhor para ambos. Quem sabe nadar sabe também do risco de salvar quem não sabe.

Wilson Figueiredo é jornalista

FONTE: JORNAL DO BRASIL ONLINE

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