O deputado petista André Vargas, que se viu compelido a deixar a vice-presidência da Câmara ao emergirem os seus negócios com o grão-doleiro Alberto Youssef - o que levou o Conselho de Ética da Casa a abrir contra ele processo por quebra de decoro parlamentar -, deve se achar um guerreiro. Não tem, é claro, a movimentada biografia de um José Dirceu, o ex-presidente do PT, ex-deputado e ex-ministro da Casa Civil que cumpre pena na Papuda como capo do mensalão, a quem os companheiros assim reverenciam, acrescentando, para rimar, "do povo brasileiro".
Mas, para quem ignorasse os métodos, não propriamente solares, graças aos quais André Luiz Vargas Ilário fez carreira no PT de Londrina - começando por dirigir o Albergue Noturno local até chegar ao comando da sigla no Paraná em 1998 e ao Congresso Nacional em 2006 -, foi na esteira do encarceramento de Dirceu que ele apareceu na mídia nacional. O robusto parlamentar valeu-se da circunstância de estar ao lado do presidente do STF, Joaquim Barbosa, na abertura do atual ano legislativo, para erguer o punho esquerdo em solidariedade aos mensaleiros condenados, vítimas, segundo ele, de um julgamento injusto.
O bravo Ilário acabaria, porém, metendo os pés pelas mãos, quando se revelou que viajara de férias a bordo de um jatinho providenciado por Youssef. O episódio virou notícia porque, a essa altura, ele tinha sido preso sob a acusação de operar uma usina de lavagem de dinheiro que branqueara R$ 10 bilhões. (O mundo é pequeno. Como o Estado revelou, o ex-diretor do Banco do Brasil Henrique Pizzolato, que fugiu para a Itália para não fazer companhia aos correligionários cumprindo pena pelo mensalão, é considerado pela Justiça italiana suspeito de ligações com uma lavanderia chefiada por um certo Valter Lavitola, que prestava serviços ao ex-premiê Sílvio Berlusconi.)
Primeiro, Vargas negou que conhecesse Youssef. Depois se enrolou em um cipoal de novas mentiras até, contrito, dizer que se "equivocou". Tudo poderia ser reduzido a um pecadilho, e punido, quem sabe, com advertência ou suspensão do mandato. Mas o seu mundo caiu quando a Polícia Federal descobriu que ele atolara com o doleiro na tentativa de tomar R$ 31 milhões do Ministério da Saúde para medicamentos a serem produzidos por uma empresa cujo dono oculto é Youssef. Exposto o tráfico de influência, Vargas imaginou que, se renunciasse ao mandato, mataria o processo no Conselho de Ética. Assim, poderia candidatar-se de novo este ano.
Desfeita a ilusão, renunciou à anunciada renúncia - e deixou o PT em polvorosa, a ponto de ameaçá-lo de expulsão se insistisse em manter-se deputado. O partido tem pelo menos dois bons motivos para tirar Vargas de cena - e nenhum deles tem que ver com um improvável surto ético pós-mensalão da legenda de Lula. O primeiro se chama Gleisi Hoffman. O segundo, Alexandre Padilha. A ex-ministra da Casa Civil de Dilma é candidata ao governo do Paraná, onde os adversários poderiam usar contra ela a folha corrida de Vargas. Já o ex-ministro da Saúde, candidato em São Paulo, teria de ficar explicando que, afinal, a pasta não fechou o negócio com Youssef mediado pelo parlamentar.
No limite, a própria campanha reeleitoral da presidente poderia ser atingida pelos detritos da era Vargas. Nem esse argumento dissuadiu o deputado valentão. Numa reunião com a cúpula partidária, na terça-feira, ele peitou os cobradores. "Não renuncio. Agora vou até o fim", avisou. E, no que poderia ser tomado como um acesso de megalomania não fossem o que são os conflitos internos do PT, provocou: "Vou fazer o meu sucessor (na Mesa da Câmara)". De fato, embora o presidente da sigla, Rui Falcão, tenha lhe dito que "já devia ter renunciado", porque não conseguirá "sustentar a sua versão dos fatos no Conselho e no plenário", há quem divirja.
Figuras carimbadas como os deputados paulistas José Mentor e Cândido Vaccarezza e o carioca Luiz Sérgio estão fechados com o teimoso, que se gaba de ter o apoio de 1/3 dos 88 membros da bancada. Como diria Lula, ele "foi para cima".
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