- O Globo
Assim como Dilma não faz gol, nem defende pênalti, também não escala o time. Por isso, nada tem a ver com o vexame protagonizado pela seleção brasileira na tarde de ontem no Mineirão. Mais uma vez, porém, foi xingada por parte da torcida presente ao estádio, em igualdade de condições com Felipão e Fred.
Nada mais equivocado do que essa repetição de comportamento, mas, mais uma vez, a equipe de marketing que assessora a candidata à reeleição errou na dose ao imaginar que a campanha da seleção poderia reverter em seu benefício, que não tem nada a ver com o sucesso do campeonato.
Até mesmo a derrota desmoralizante é mais um ingrediente para tornar esta a Copa das Copas, por razões alheias à atuação do governo. Dentro dos estádios, a Copa pode ser considerada a melhor de todos os tempos, e provavelmente a goleada de 7 a 1 sofrida pelo Brasil vai consolidar o recorde de gols marcados nesta edição.
Ficou claro, à medida que a seleção brasileira chegava aos trancos e barrancos à semifinal, que o Palácio do Planalto arvorou-se o responsável pelo sucesso da Copa, e tudo estava sendo preparado para que a presidente Dilma revertesse a situação da abertura, quando, mesmo não discursando por temor das vaias, foi xingada em uníssono no Itaquerão.
Com a seleção se classificando para as semifinais, Dilma confirmou que entregaria a taça ao campeão e classificou as vaias como “ossos do ofício”, na afoita esperança de que, entregando a Copa do Mundo ao capitão brasileiro Thiago Silva, tudo lhe seria perdoado.
Fez de tudo para associar sua imagem à da seleção pretensamente vitoriosa, fazendo até o “é tois” do Neymar para exibir-se nas redes sociais.
Mais grave, fez uma ligação direta — mais desastrada do que os passes longos da defesa brasileira para o ataque inexistente — entre o sucesso da Copa e as previsões pessimistas para a economia brasileira este ano. Como seus críticos supostamente erraram nas previsões catastróficas sobre a realização da Copa do Mundo, Dilma achou-se no direito de dizer que as previsões catastróficas para o crescimento de nossa economia também não se realizarão.
Se a seleção em campo não justificava um otimismo tão grande assim, mas ia seguindo em frente, na economia nada indica que uma previsão otimista tenha base na realidade.
Nos últimos 30 dias, vivemos em um país, pelo menos nas 12 capitais que sediam a Copa, que um dia poderá ser, mas ainda não é.
Mesmo o desabamento do viaduto em Belo Horizonte, que sinaliza a decadência de nossas obras públicas e o açodamento com que o PAC da mobilidade está sendo tocado, não provocou grandes reações, pois estávamos todos anestesiados pelo encantamento do futebol.
A fantasia da Copa do Mundo, que fez o país sair de sua realidade para criar uma bolha de felicidade e segurança nos últimos 30 dias, neutralizou por efêmeros momentos as conseqüências de uma política econômica que produz resultados desastrosos.
Mas eles estão aí, vigendo enquanto a bola rola nos estádios padrão Fifa e, assim como voltariam a ditar a vida dos brasileiros na próxima segunda-feira, na hipótese de uma vitória da seleção brasileira numa final que não acontecerá, retornaram ontem mesmo diante da tragédia do Mineirazo. A inflação superando o limite máximo aceitável é uma demonstração de que os efeitos perversos da política econômica são inexoráveis
mesmo no país do futebol.
Já tivemos a tragédia do Maracanazo, quando perdemos a final da Copa de 1950 para o Uruguai em pleno Maracanã. Tivemos a tragédia do Sarriá, quando a notável seleção de 1982 perdeu para a Itália por 3 a 2 quando dependíamos apenas de um empate. Mas nunca uma seleção perdeu de 7 em uma semifinal, onde os jogos são equilibrados geralmente, nem nunca uma seleção brasileira perdeu de 7.
Nada disso teria a ver com a presidente Dilma se ela não tivesse tentado afoitamente se aproveitar da Copa em benefício de sua candidatura. Tendo feito isso de caso pensado, a tragédia de ontem volta-se também contra ela.
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