- Folha de S. Paulo
Ganhar ou perder faz parte da vida. Mas a derrota com certa dose de humilhação da seleção brasileira para a da Alemanha por 7 a 1 produz uma sensação um pouco mais desoladora.
Passaram-se 64 anos desde a decepção de 1950. O imaginário local sobre ganhar "em casa" provocou um estado de transe coletivo. A nação escancarou todo o seu atraso civilizatório resumido na dicotomia reducionista e infantil do "é tóis" (o Brasil) contra "eles" (o restante do mundo), como se uma disputa esportiva fosse vital para o país conseguir sanar seus problemas.
Protofascistas pediram na internet o assassinato do colombiano que causou a contusão em Neymar. O principal telejornal do país dedicou quase 90% do seu tempo diário ao futebol. O paroxismo da patriotada.
Agora, a ressaca. Talvez seja necessário esperar algumas décadas para ter outra Copa do Mundo no Brasil. O sonho de ganhar a atual se dissipou com os sete gols alemães de ontem (8). E ainda há o "jogo mais triste de todos", com os derrotados das semifinais disputando no sábado o 3º lugar.
O mundo não acabou, mas o bom humor das últimas semanas vai se evanescer um pouco. O país voltará a se enxergar como de fato é.
Haverá efeito político relevante? Não creio. O jogador Ronaldo teve um apagão durante a Copa de 1998. A seleção brasileira perdeu de maneira contundente. Mas o tucano Fernando Henrique Cardoso, com a economia no buraco, conseguiu se reeleger presidente. Em 2006, o petista Lula foi reeleito ainda sob os eflúvios do mensalão e de uma derrota do Brasil na Copa da Alemanha.
É claro que a vitória da seleção prolongaria o estado de torpor quase geral. Ajudaria quem já está no poder, a presidente e os governadores. O despertar do sonho --ou do pesadelo-- acelera a percepção da realidade. Não é ruim. O Brasil ainda é uma nação a ser construída, e tem pressa.
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