quarta-feira, 13 de janeiro de 2016

Míriam Leitão: Razões da queda

- O Globo

Crise chega quando a Petrobras perdeu valor e reputação. Há muitas razões para o petróleo cair e nenhuma para subir. A alta do dólar, o excesso de produção, estoques elevados, diminuição de demanda, inverno suave no hemisfério Norte, tudo derruba o preço. Há inclusive um fator que não esteve presente em outras épocas de queda de cotação: o mundo se comprometeu em Paris a reduzir fortemente as emissões, isso cria uma incógnita sobre o futuro do petróleo.

As altas e baixas das cotações do óleo seguem ciclos. O preço alto estimula os investimentos em produção. A queda reduz o interesse em novos campos, o que encolhe a produção. A grande questão para a Petrobras é que esse desarme de investimentos e de interesse em novos campos produtores ocorre quando a empresa já está em crise. Ela enfrenta um período de fragilidade criado pela corrupção que destruiu valor e reputação da empresa; tenta se recuperar, mas concretamente tem dificuldades de financiar novos projetos. Agora, haverá menos interesse ainda. Por isso anunciou ontem um forte corte nos investimentos.

Recentemente a Petrobras divulgou que seu custo de produção do pré-sal é de US$ 8 o barril e que, por isso, os campos ainda seriam viáveis. Mas há dúvidas entre técnicos sobre o método de produção e forma do cálculo. Na verdade, segundo o consultor Adriano Pires, ela está ganhando com a queda do preço porque vende derivados aqui a um preço maior do que importa do mercado internacional. O problema é a dificuldade de viabilizar o aumento futuro de produção.

O começo da queda do preço ocorreu pelo aparecimento de um concorrente forte, o gás não convencional. A Arábia Saudita não quis cortar produção para forçar a alta porque queria, na verdade, tirar o competidor do mercado, que parecia abundante e barato nos EUA, grande consumidor de energia. O shale gás perdeu parte da competitividade nos últimos tempos, mas, então, novos fatos apareceram.

Há um temor de que o mundo esteja caminhando para uma desaceleração forte iniciada pela redução do PIB chinês em dimensão maior do que a esperada. A economia americana está crescendo, mas não fortemente. A Europa está melhor do que em anos recentes, mas ainda está fraca. Dois grandes produtores precisam desesperadamente vender: Rússia e Venezuela. Os estoques estão elevados, o consumo caiu, e a produção não foi reduzida.

O escritor e especialista Daniel Yergin, autor de um livro sobre a história do petróleo, disse ao jornal “Financial Times” que o “superciclo de commodities está terminando de forma dolorosa. A grande preocupação é o que vai acontecer com a economia do mundo”. O jornal inglês deu em destaque, em sua versão online, os cortes de investimentos da BP inglesa, e da Petrobras, cuja ação caiu ontem 9%.

Em relatório, analistas do Bank of America chamaram atenção para a perda de rentabilidade de novas companhias do setor nos Estados Unidos, que apostaram na exploração de campos não convencionais, que têm custos mais elevados. Muitas estão indo à falência, e a queda do preço do barril ao redor de US$ 20 pode inviabilizar até mesmo a operação. O banco lembra uma velha lei do mercado: as commodities são cotadas em dólar, incluindo o petróleo e, por isso, quando a moeda americana se valoriza, os preços dessas matérias-primas caem.

“A estabilidade do dólar é condição necessária para a recuperação do preço do petróleo”, diz o relatório.

O banco ressalta, no entanto, que os problemas financeiros dessas empresas e o corte na produção devem levar a uma recuperação nos preços. Por isso, estima a cotação do barril do tipo brent em US$ 53 no final deste ano, com uma média de US$ 46 em 2016.

Há uma velha máxima neste mercado de que as previsões sobre preços estão sempre erradas. O produto pode se recuperar dessa queda, que tem muito de preocupação com a China, que alguns analistas acham exagerada, porém há uma incógnita quando se olha para o futuro do petróleo. Nenhum outro ciclo de queda de preço se deu no contexto em que o mundo já decidiu entrar num processo de descarbonização da economia. A queda do consumo não será imediata, mas nas próximas décadas esta questão será cada vez mais real. Não é o caso de perguntar se o Acordo de Paris vai ou não dar certo. O aquecimento global empurrará o mundo para fontes menos emissoras de gases de efeito estufa.

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