segunda-feira, 11 de janeiro de 2016

Opinião do dia – Fernando Gabeira

Independentemente de nuances políticas, governos ilegais não têm outro caminho senão construir uma narrativa de fuga, um cipoal de álibis. Essa incapacidade de nos dar alguma verdade parece incomodar dois quadros importantes do partido: Patrus Ananias e Jaques Wagner.

Nessa virada de ano, como se cumprissem uma promessa de réveillon, disseram: um, que o PT precisava pôr a mão na consciência; o outro, que o PT se lambuzou no poder. É uma reação tardia. Durante tanto tempo, a mão esteve no bolso dos brasileiros, estranho que só agora se desloque para a consciência. Jaques Wagner disse alguma verdade ao afirmar que o PT se lambuzou no poder. Mas o fez de forma tão hábil que parecia atenuar a culpa por ser um réu primário.

O PT teria chegado ao poder e reproduzido as práticas que condenava nos outros. Acontece que isso é apenas um fragmento da realidade. O PT, como nunca antes na História, transformou a corrupção num instrumento de governo e base para se perpetuar no poder. Fundos de pensão, estatais, empreiteiras, teles, tudo passou a ser fonte de recursos. Os aliados foram comprados no Mensalão e ganharam lugares estratégicos para saquear a Petrobras.

O PT montou um esquema que produziu fortunas. Sua passagem pelo governo, além de tornar a prática sistemática e abrangente, fez da corrupção no Brasil um tema internacional com desdobramento em várias cortes. Possivelmente, a tática dos dois quadros políticos, diante das resistências internas, é apenas uma proposta gradativa da verdade. É uma tática que só funciona quando o poder é o único a deter a realidade dos fatos. Mas hoje eles são públicos, através de dados da polícia, delações, reportagens investigativas.

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Fernando Gabeira, jornalista, ‘Alguma verdade’, O Globo, 10.1.2016

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