- Folha de S. Paulo
Começou uma espécie de fritura de Nelson Barbosa, o ministro da Fazenda, como se recorda. Um de seus colegas que vivem nas redondezas de Dilma Rousseff, no Planalto, diz que se trata de "autocozimento". Isto é, Barbosa defende seu plano econômico como se não entendesse que as prioridades do governo são abaladas a cada dia pelas convulsões da política.
Fritura, assado ou cozido, pode bem ser que prato termine cru, pois sabe-se lá se o governo vai durar até que o ministro esteja pronto para servir. De qualquer modo, ontem foi um dia em que se tornou evidente o descompasso entre Barbosa e o resto do governo.
O ministro foi ao convés do navio governista que afunda a fim de dizer que, sem arrumação das contas públicas, o caldo vai engrossar. Fez um discurso meio desesperado sobre a pindaíba do governo e sobre a urgência de mudanças.
No governo, francamente, quase ninguém dá a mínima para as preocupações do ministro. Um ministro do Planalto chegou a dizer que, com seu discurso dramático, Barbosa parece dar um ultimato. Que parece preparar sua saída: autocozimento.
No governo, se trituram mesmo as vagas propostas de reforma da Previdência e de limite do gasto público. Barbosa toma tiros diários do PT. Na sexta-feira retrasada, o partido dinamitou o programa proto-reformista do ministro da Fazenda. Deputados que restaram na coalizão de Dilma Rousseff dizem que esse plano não vai passar –reformas, CPMF etc.
Nos últimos dez dias de terra em transe, muita gente do governo começou mesmo a enterrar o Plano Barbosa. No mínimo, querem jogar essa conversa para depois da eleição municipal. Ou seja, trata-se de dizer que o ministro fique quase quieto no seu canto, pois não se sabe se haverá governo Dilma no final do ano e, havendo, as reformas acabariam sendo adiadas para março de 2017.
Calmaria e Dilma
O governo do Brasil aproveitou a calmaria relativa dos mercados financeiros e foi ontem buscar um troco lá fora. Pegou dinheiro emprestado no exterior, coisa que não fazia desde setembro de 2014.
Desde meados de fevereiro, melhoram as condições financeiras pelo mundo. Desde então, o preço das ações sobe, juros e dólar caem no Brasil. Sim, a expectativa de queda de Dilma Rousseff também anima os donos do dinheiro. Mas o assunto é mais complexo.
Seja como for, o Brasil foi verificar em que pé estão suas relações com o mercado financeiro internacional, testar quem quer nos conceder empréstimos, quanto dinheiro oferecem e a que preço (não é que "precisasse" de dinheiro). Ressalte-se, o país estava fora do mercado fazia ano e meio.
Nesse tempo, de descalabro interno, degradação do nosso crédito e tumultos recorrentes na finança internacional, estava difícil ou caro demais tomar empréstimos, ou "fazer uma emissão de títulos soberanos", na linguagem engraçada do jargão.
O título é de dez anos. O rendimento para os investidores, segundo as primeiras informações, ficou entre 6% e 6,5%. Em setembro de 2014, a taxa foi de 3,9%. A diferença é uma paulada, prova da ruína e do descrédito provocados pelo governo de Dilma Rousseff, na maior parte.
Noutra parte, claro, os donos do dinheiro grosso ficaram mais avessos a risco.
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