quarta-feira, 7 de setembro de 2016

A base aliada e os juros altos – Editorial / O Estado de S. Paulo

Políticos da base aliada parecem gostar de juros altos e de baixo crescimento econômico. Esse deve ser o caso pelo menos do grupo empenhado em retardar as medidas de ajuste. Pressionando o presidente Michel Temer para adiar ações indispensáveis ao conserto das contas públicas, esses parlamentares dão sólido motivo ao Comitê de Política Monetária (Copom) para manter a taxa básica de juros em 14,25% ao ano. O governo, recomendam, deveria deixar para depois das eleições municipais assuntos desagradáveis como a reforma da Previdência. Se adotar essa orientação, o Executivo cometerá vários erros ao mesmo tempo. Manterá a insegurança quanto ao rumo de sua política e, portanto, da economia, desperdiçará a confiança inicial de empresários e investidores, deixará de marcar a diferença em relação à equipe anterior e contribuirá para a preservação de um aperto monetário prejudicial ao crescimento da produção e à saúde financeira do Tesouro.

Na semana passada, o Copom, formado por diretores do Banco Central (BC), manteve mais uma vez os juros básicos de 14,25%. Condições para uma redução, de acordo com o comitê, surgirão quando houver maior confiança na convergência da inflação para a meta oficial de 4,5%. A autoridade monetária comprometeu-se a conseguir esse resultado até o fim do próximo ano e, portanto, manterá as condições de crédito apertadas enquanto isso parecer necessário.

A confiança necessária ao corte de juros dependerá pelo menos de três fatores, listados na ata da última reunião do Copom: 1) a persistência limitada dos efeitos do choque de preços dos alimentos; 2) sinais de desinflação “em velocidade adequada”; 3) redução da incerteza quanto à aprovação e à implementação dos ajustes necessários, incluída a composição das medidas de ajuste fiscal.

A referência a este último item havia aparecido com ênfase igual na ata da reunião precedente, realizada um mês e meio antes. Em linguagem mais suave, a cobrança de ações para arrumação das contas públicas havia sido apresentada várias vezes durante a gestão de Alexandre Tombini na presidência do BC. A exigência tornou-se mais enfática depois da posse do atual presidente, Ilan Goldfajn.

Não há como desconhecer esse requisito. Não haverá condições seguras de estabilização e de reativação da economia brasileira sem uma ampla reparação das finanças públicas. Esse conserto apenas começou. Sem ações mais ambiciosas, firmes e de maior alcance, será impossível a retomada segura do crescimento, porque as contas governamentais estarão condenadas a novas crises.

Além disso, sem uma forte redução do desequilíbrio entre receitas e despesas fiscais será inútil qualquer tentativa de corte dos juros. O Tesouro só conseguirá rolar seus compromissos e financiar-se com juros menores quando o governo brasileiro houver reconstruído sua credibilidade. As três principais agências de avaliação de risco, ninguém deveria esquecer, cortaram duas vezes a nota do Brasil, desde o ano passado, e passaram a classificá-lo dois degraus abaixo do grau de investimento.

A condição fiscal indicada pelo Copom – maior segurança quanto à aprovação e à implementação dos ajustes necessários – está longe de ser um capricho ou mera manifestação de uma tendência neoliberal. A credibilidade da política oficial é um componente real das condições de financiamento do setor público. Enfim, a gestão responsável e eficiente das finanças governamentais é um importante fator de estabilidade de preços e de dinamização da economia.

Que o grupo formado pelo PT e por seus associados se oponha ao conserto das contas públicas é compreensível. É uma atitude compatível com a irresponsabilidade e a incompetência exibidas durante boa parte de seu período de governo. Que políticos da atual base aliada menosprezem a seriedade administrativa e desconheçam, ou finjam desconhecer, a urgência das medidas de ajuste é escandaloso. O presidente Michel Temer e sua equipe errarão muito perigosamente se aceitarem esse jogo.

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