- O Globo
Há tantas possibilidades de provas nos depoimentos dos marqueteiros João Santana e Mônica Moura, que não é exagero dizer que a ex-presidente Dilma corre o risco de ser presa por obstrução da Justiça a qualquer momento, em prisão preventiva decorrente da investigação policial que foi desencadeada a partir dos relatos agora liberados para divulgação.
A prisão em flagrante não cabe neste momento, passado tanto tempo do ocorrido. Dilma Rousseff avisou por telefone que João Santana seria preso, numa clara ação de obstrução da Justiça, agravada pelo fato de que Dilma era a presidente da República na ocasião e recebia informações diretamente do então ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo.
Ele confirmou que, “por dever de ofício”, comunicava a presidente do andamento das investigações à medida que recebia os informes da Polícia Federal. Mesmo que esse dever de ofício o obrigasse a esses relatórios, eles não deveriam ser feitos com tanta antecedência que permitisse avisos aos procurados pela Justiça com 48 horas de antecedência.
E, no limite, a presidente da República não poderia nunca usar as informações que recebia para alertar seus amigos marqueteiros. A maneira como a ex-presidente Dilma Rousseff se comunicava com eles, e os conselhos que dava de acordo com as informações que recebia sobre as investigações, agravam mais ainda a situação.
Mônica Moura relatou, por exemplo, que um dia recebeu um e-mail clandestino da presidente, que se assinava para tais fins com o codinome Iolanda do Carmo Ribeiro, pedindo um telefone seguro para conversar. Passaram-lhe então o número da produtora em que se encontravam, na República Dominicana, e “Iolanda” avisou então que a Lava-Jato já havia obtido um mandado de prisão contra eles.
Anteriormente, já enviara um aviso pelo tal e-mail fake criado para comunicações clandestinas, através de linguagem figurada, de que um amigo estava em fase terminal e o pior era que a mulher dele também estava seriamente doente, advertindo que os dois já estavam na mira da Operação Lava-Jato.
Mas a “presidenta honesta” já atuara em outras ocasiões para obstruir a Justiça. Sugeriu que os marqueteiros transferissem uma conta da Suíça para Cingapura, que seria um lugar mais seguro. Como se vê, a então presidente Dilma tinha mesmo preocupações com as contas na Suíça dos envolvidos no esquema de propinas da Odebrecht, tanto que comentou com o ex-presidente Lula que soubera que Renato Duque, ex-diretor da Petrobras, tinha uma conta na Suíça.
Foi o que bastou para que Lula convocasse Duque para uma conversa, e seu relato do encontro está cheio de contradições. Duque disse que Lula o orientou a não ter contas na Suíça relacionadas aos pagamentos da Odebrecht. Na sua ingênua versão, o ex-presidente disse que, ao receber a resposta de Duque de que não tinha conta na Suíça (o que era mentira), ficou tranquilo e encerrou o assunto.
Tanto o ex-presidente quanto a então presidente Dilma não estavam preocupados com a corrupção em si, que, pelos relatos, comandavam, mas com os sinais de corrupção que uma conta na Suíça deixava pelo caminho.
Dilma Rousseff pode pegar de três a oito anos de prisão pelo crime de obstrução à Justiça, segundo o professor Thiago Bottino, da FGV Direito Rio. Não será difícil identificar tanto o IP do computador de onde saíram as mensagens para a dupla Santana e Mônica, como também o telefone de onde foi feita a ligação para o Panamá com o aviso de que seriam presos.
Mais contradições
O ex-presidente Lula, em seu depoimento ao juiz Sergio Moro, isentou-se de responsabilidade por tudo o que aconteceu na Petrobras, dizendo que não tinha ingerência na empresa.
Pois está circulando na internet um vídeo de 2010 em que o então presidente Lula vangloria-se, em uma cerimônia em Angra dos Reis, de que a Petrobras deixou de ser uma “caixa-preta”, como nas gestões anteriores ao seu governo:
“No nosso governo, ela é uma caixa branca e transparente. Nem tão assim, mas é transparente. A gente sabe o que acontece lá dentro, e a gente decide muitas das coisas que ela vai fazer”.
A ressalva irônica sobre a transparência “mas nem tanto” tirou gargalhadas dos presentes, entre eles o presidente da Petrobras, José Sérgio Gabrielli, que está com seus bens indisponíveis.
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