‘Lula e o PT institucionalizaram a corrupção’
Silêncio de Cunha era ‘agenda de Temer’
Empresário, em entrevista à revista ‘Época’, detalha o pagamento de propina aos principais partidos do país ao longo dos últimos 15 anos e classifica o PMDB como ‘quadrilha mais perigosa do país’
Na contundente entrevista que deu à revista “Época”, o empresário Joesley Batista deu detalhes de como era feita a distribuição de propina a partidos como PT, PSDB e PMDB nos últimos 15 anos. Ele explicou um dos motivos de ter gravado o presidente Michel Temer: queria se certificar de que o pagamento de propina em troca do silêncio do deputado cassado Eduardo Cunha “ainda era parte da agenda de Temer”. Afirmou que, depois do encontro, ficou claro que sim. “Me arrepiei”, disse. Joesley chama o PMDB de “quadrilha mais perigosa do país”, chefiada, segundo ele, por Temer. E sustenta que o PT “institucionalizou a corrupção”, citando o ex-ministro da Fazenda Guido Mantega como principal intermediário do partido. Em nota igualmente dura, Temer disse que vai processar Joesley.
Propina para todo lado
Joesley afirma que PT ‘institucionalizou’ a corrupção e PMDB é a maior quadrilha do país
- O Globo
SÃO PAULO - Em entrevista na edição desta semana da revista “Época”, o empresário Joesley Batista, da JBS, voltou a disparar contra o presidente Michel Temer e revelou mais detalhes de como funcionava a distribuição de propina a quase todos os partidos políticos brasileiros ao longo dos últimos 15 anos. Joesley chamou Temer de “chefe da quadrilha mais perigosa do Brasil” e afirmou que o “ex-presidente Lula e o PT institucionalizaram a corrupção no país”. Segundo ele, Aécio Neves (PSDB) fazia parte do mesmo sistema corrupto. Joesley também garantiu na entrevista que a gravação da sua conversa com Temer no Palácio do Jaburu, em março, não foi editada e assegurou que o material pode passar por qualquer perícia. O dono da JBS falou com a revista na última quinta-feira, antes de prestar o depoimento à Procuradoria Geral da República (PGR), em que reafirmou as acusações de que Temer deu aval para que ele mantivesse os pagamentos para garantir o silêncio do ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha (PMDB-RJ). Confira os principais trechos da entrevista do empresário:
“PT INSTITUCIONALIZOU A CORRUPÇÃO”
Joesley conta que começou a pagar propina no governo do PT. “Foi no governo do PT para frente. O Lula e o PT institucionalizaram a corrupção. Houve essa criação de núcleos, com divisão de tarefas entre os integrantes, em estados, ministérios, fundos de pensão, bancos, BNDES. O resultado é que hoje o Estado brasileiro está dominado por organizações criminosas. O modelo do PT foi reproduzido por outros partidos”, relatou. Joesley afirma que começou a pagar propina pela primeira vez no Mato Grosso do Sul, no governo de Zeca do PT. Entretanto, Joesley afirma que nunca tratou de propina diretamente com Lula, por isso não gravou o petista. Diz que seu interlocutor no PT era o então ministro da Fazenda Guido Mantega que resolvia seus problemas, sem necessidade de recorrer ao líder máximo do PT. “Nunca tive conversa não republicana com o Lula. Zero. Eu tinha o Guido. Estive uma vez com o presidente Lula quando assumi a empresa em 2006. Pedi audiência oficial. Deve estar nos registros. (...) Nunca mais vi o Lula até o fim de 2013. Não precisou ter conversa. Meu contato era o Guido”.
“TEMER É CHEFE DA ORCRIM”
Joesley chama Michel Temer de chefe do grupo que é formado por parte de seus ministros e exministros, além de Eduardo Cunha. “Essa é a maior e mais perigosa organização criminosa desse país. Liderada pelo presidente”, declarou Joesley Batista. “O Temer é o chefe da Orcrim da Câmara. Temer, Eduardo, Geddel, Henrique, Padilha e Moreira. É o grupo deles. Quem não está preso está hoje no Planalto”. Ainda segundo o empresário, Cunha tratava Temer como seu superior hierárquico. Também revela temor: “Essa turma é muito perigosa. Não pode brigar com eles. Nunca tive coragem de brigar com eles. Por outro lado se você baixar a guarda, eles não têm limites. Meu convívio com eles sempre foi mantendo à meia distância: nem deixando eles aproximarem demais nem deixando eles longe demais para não armarem alguma coisa contra mim”.
GRAVAÇÃO E AMEAÇAS
O empresário Joesley reage às acusações de que o áudio entregue à Procuradoria Geral da República (PGR) foi editado. “Podem fazer todas as perícias do mundo. Tentam desqualificar por desespero”. Joesley afirma que gravou o presidente porque “sabia que estava aumentando a chance” de ele “trocar de lado” e fazer a colaboração com o Ministério Público. Diz que encaminhou à polícia indícios de ameaças que teria sofrido quando começou a fazer a delação. “Recebi mensagens anônimas enquanto estava fazendo a delação. No dia em que começamos a delação, o Ricardo (Saud) teve um assalto estranhíssimo na porta de casa, com revólver. Pode ser só coincidência. Mas ficamos olhando um para a cara do outro: será que tem a ver? Eu nunca andei com segurança e passei a andar com quatro. Eram ameaças veladas. Diziam ‘Isso não vai dar certo. O fim não vai ser bom’. Passei para a polícia o que consegui registrar”.
AÉCIO NEVES, O NÚMERO 2
Sobre o senador Aécio Neves, o empresário diz que precisava mostrar ao país que “o número 2 do Brasil (segundo colocado na eleição de 2014) era igual ao número 1 (Temer)”. “Preciso fazer uma ação indiscutível para o entendimento da população e do MP. Vou registrar como se dão as conversas com o número 1 da República e o número 2, que seria a alternativa ao número 1. Se o Brasil não entendesse que o 2 era igual ao 1, o Brasil ia achar que a solução era substituir 1 por 2. Mas o 2 é do mesmo sistema”, afirmou. Joesley também relatou que o esquema utilizado pelo tucano na eleição de 2014 era o mesmo que o utilizado pelo PT, com “caixa dois, nota fria, compra de coligação”
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PAGAMENTOS PARA CUNHA
O empresário dá detalhes sobre como teria sido o acerto de pagamento de propina ao ex-deputado Eduardo Cunha quando este já estava preso para impedi-lo de fazer uma delação premiada. Esse foi um dos episódios tratados por Joesley no encontro gravado que teve com Temer. “Eu queria ter certeza de que essa agenda ainda era do Temer. Será que ainda é? De repente eu chegava lá e o Temer dizia: 'Não, Joesley, para, não precisa mais não'. Mas ele fala para mim que tem que continuar isso. Me arrepiei”. “Eu tinha perguntado a ele (Cunha): ‘Se você for preso, quem é a pessoa que posso considerar seu mensageiro?’ Ele disse: ‘O Altair procura você. Qualquer outra pessoa não atenda.’ Passou um mês, veio o Altair. Meu Deus, como vou dar esse dinheiro (R$ 5 milhões) a um cara que está preso? Aí o Altair disse que a família do Eduardo precisava de dinheiro e que ele estaria solto logo, logo. Fui pagando em dinheiro vivo, ao longo de 2016”, disse Joesley.
MENSAGEIRO DE TEMER
Joesley diz que esse esquema era monitorado por um “mensageiro do presidente”, o ex-ministro Geddel Vieira Lima. “E toda hora o mensageiro do presidente me procurando para garantir que eu estava mantendo esse sistema. De 15 em 15 dias era uma agonia. Sempre querendo saber se estava tudo certo, se ia ter delação, se eu estava cuidando dos dois. O presidente estava preocupado. Quem estava incumbido de manter Eduardo e Lúcio calmos era eu”. O empresário diz que foi ao encontro de Temer para ter certeza se o esquema de pagar pelo silêncio de Cunha era para continuar. “Eu queria ter certeza de que essa agenda ainda era do Temer. De repente eu chegava lá e ela dizia: ‘Não, Joesley, para, não precisa mais não’. Mas ele fala para mim que tem que continuar isso”.
MENSALINHO A PEDIDO DE TEMER
Ele conta na entrevista episódios em que Temer teria pedido dinheiro a ele: “Uma vez foi quando ele pediu R$ 300 mil para fazer campanha na internet antes do impeachment, preocupado com a imagem dele. Fazia pequenos pedidos. Quando o Wagner (Rossi) saiu (do Ministério da Agricultura), Temer pediu um dinheiro para ele se manter. Também pediu para um tal de Milton Ortolan que está lá na nossa colaboração. Um sujeito que é ligado a ele. Pediu para nós fazermos um mensalinho. Fizemos. Ele volta e meia fazia pedidos assim”. De acordo com o empresário, Temer também pediu para que ele pagasse o aluguel de seu escritório político na Praça Pan-Americana, em São Paulo. “Eu desconversei, fiz de conta que não entendi, não ouvi. Ele nunca mais me cobrou (...) Há políticos que acreditam que, pelo simples fato do cargo que ele está ocupando, já habilita você a ficar devendo favores a ele. Temer é assim.”
PEDIDO DE DILMA NO PLANALTO
O empresário diz que tratou de propina com a ex-presidente Dilma Rousseff no Palácio do Planalto. Conta que na ocasião expôs para a então presidente os detalhes da conta corrente de propina que mantinha com Guido Mantega. “Confirmei com a Dilma porque ela me pediu R$ 30 milhões para o Pimentel (Fernando, governador de Minas Gerais). Aí me senti na liberdade de explicar”, disse. A conversa, conta Joesley, foi no Palácio do Planalto, na mesa redonda do gabinete presidencial. “Expliquei: acabou o dinheiro. Ela ouviu e falou: ‘Tá bom. Pode fazer’. Foi o último dinheiro. Estava no final da campanha (de 2014)”.
MANTEGA E O BNDES
Joesley também descreve que o ministro Guido Mantega se valeu do BNDES para conseguir pagamentos para o PT. “Olhe o caso do Guido (Mantega), do PT: ‘O BNDES comprou ações e investiu na sua empresa. Como você não vai me dar dinheiro?’ Estávamos nas mãos deles. Era só o Guido dizer no BNDES que não era mais interesse do governo investir no agronegócio. Pronto. Bastava uma mudança de diretriz para acabar com o nosso negócio”, afirmou à revista.
PMDB E A CAIXA
O empresário relata que um dos braços do que chama de organização criminosa do PMDB estava na Caixa Econômica Federal. “Foi aí que o Lúcio (Funaro) entrou na minha vida. O modus operandi sempre foi assim: eu tentava fazer operações na Caixa, o Lúcio descobria e vinha falar comigo. Ele dizia: ‘Vai ter 3%, não é’”, diz Joesley.
CPI DA JBS
O empresário conta que a pressão por dinheiro vinda de Cunha aumentou quando ele chegou à presidência da Câmara. “Ele chegou para mim: ‘Joesley, estão querendo abrir uma CPI contra a JBS para investigar o BNDES. É o seguinte, você me dá R$ 5 milhões que eu acabo com a CPI’. Eu falei: Pode abrir, não tem problema. Ele imediatamente falou assim: ‘Seu concorrente me paga R$ 5 milhões para abrir essa CPI’. Não paguei e ele não abriu. Esse é o exemplo mais bem acabado da lógica dessa organização criminosa”.
GANHO COM AÇÕES E FUTURO DO GRUPO
Joesley negou que tenha se aproveitado da delação para vender ações da empresa. “A CVM (Comissão de Valores Mobiliários) pode investigar e temos tranquilidade em responder. São operações feitas absolutamente dentro das regras. Não houve nada de atípico. É público. Eu preciso de dinheiro. Eu tenho ações e preciso vender. Não tem mistério. O empresário diz que o grupo vai vender seus ativos o quanto for necessário para que “não paire dúvida sobre nossa solvência”. “Vamos vender o que for preciso para recuperar as contas e a nossa credibilidade”.
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