- O Globo
As batidas policiais nas universidades foram um alerta do que pode vir por aí. Quem teme uma escalada autoritária ganhou novas razões para se preocupar
A democracia brasileira enfrentará uma prova de fogo se as urnas confirmarem o favoritismo de Jair Bolsonaro. O capitão reformado fez carreira exaltando a ditadura militar, um regime que amordaçou a imprensa e perseguiu opositores. Agora seus impulsos liberticidas vão testar a resistência das instituições e da Constituição de 1988.
Nos últimos dias, quem teme uma escalada autoritária ganhou novos motivos para se preocupar. Ao menos 20 universidades públicas foram alvo de operações da polícia e de fiscais eleitorais. A pretexto de coibir a propaganda irregular, as batidas suspenderam aulas, impediram a realização de debates e apreenderam faixas e cartazes.
O caso da Universidade Federal Fluminense resume os abusos da ofensiva. Uma juíza determinou a retirada de uma faixa laranja com a inscrição “Direito UFF Antifascista”, sem referência a partidos ou candidatos. Acrescentou que a polícia deveria prender o diretor da Faculdade de Direito em caso de descumprimento da ordem.
Em Minas Gerais, uma juíza ordenou a retirada de uma nota publicada no site da Universidade Federal de São João del Rei. O texto censurado também não citava o nome de nenhum candidato. Era um manifesto “a favor dos princípios democráticos e contra a violência nas eleições”. Em Mato Grosso do Sul, policiais federais entraram no campus da Universidade Federal da Grande Dourados para impedir uma aula pública com o tema “Esmagar o Fascismo”.
Os agentes fotografaram e coletaram nomes de estudantes que organizavam a atividade. A ação foi autorizada por um juiz eleitoral que milita contra o PT nas redes. As batidas nas universidades servem como um alerta do que pode vir por aí. Bolsonaro ainda não vestiu a faixa e já surgem autoridades ansiosas para restabelecer a censura. Desta vez, houve reação da Procuradoria-Geral da República e do Supremo Tribunal Federal.
Na noite de sexta, a procuradora Raquel Dodge pediu a suspensão das ações nas universidades. Apontou ofensa a princípios fundamentais como os “direitos de crítica, de protesto e de discordância decorrentes da livre manifestação do pensamento, assim como a liberdade de expressão”.
A ministra Cármen Lúcia aceitou o pedido e concedeu a liminar. “Sem liberdade de manifestação, a escolha é inexistente. O que é para ser opção, transforma-se em simulacro de alternativa. O processo eleitoral transforma-se em enquadramento eleitoral, próprio das ditaduras”, afirmou. Ela acrescentou que as batidas afrontaram o princípio da autonomia universitária. “Pensamento único é para ditadores.
Verdade absoluta é para tiranos. A democracia é plural em sua essência. E é esse princípio que assegura a igualdade de direitos individuais”, escreveu a ministra. O episódio pode ter sido um ensaio para futuros choques entre o Executivo e o Judiciário. No domingo passado, Bolsonaro sugeriu que os opositores teriam que escolher: “Ou vão para fora ou vão para cadeia”. Ontem ele voltou a abrandar o tom e prometeu “obediência à Constituição”.
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