- Folha de S. Paulo
Mesmo se o plano de Bolsonaro fosse atropelar instituições, ele fez tudo errado
Não duvido de que Jair Bolsonaro fantasie com a ideia de, amparado nos braços do povo, passar o rodo em instituições que ele vê como corruptas, como o Congresso Nacional e o Supremo Tribunal Federal, e, a partir daí, governar sem embaraços. Mas fantasias frequentemente não passam de fantasias.
É verdade que tudo o que não é proibido pelas leis da física é possível, mas nem tudo o que é possível é provável. A essa altura, parece-me ser maior a chance de Bolsonaro não concluir seu mandato do que a de ele congregar forças para desferir algum tipo de golpe de Estado.
O motivo principal para isso é sua própria incompetência. Ele assumiu o cargo em condições razoavelmente boas. Tudo o que precisava fazer era manter em alta a confiança da população e correr com a reforma da Previdência, seguida pela tributária. Se obedecesse a esse roteiro, eram grandes as chances de o país assistir à volta do crescimento.
O que vimos, porém, foi um presidente que, através de omissões e declarações, operou para sabotar a reforma que seria a chave para o sucesso de seu governo. Errou desde o primeiro dia, quando optou por iniciar do zero os trâmites da proposta de emenda constitucional (PEC), em vez de modificar a de Temer, que estava pronta para ser votada em plenário. Perdeu preciosos seis meses.
Mesmo se o plano de Bolsonaro fosse, desde sempre, passar por cima das instituições, ele fez tudo errado. Deixou para desenhar o cenário de enfrentamento num momento em que sua popularidade é declinante —ele já parece ter perdido uma boa fatia dos eleitores mais moderados que o apoiaram contra o PT— e, mais importante, conseguiu se indispor até mesmo com os militares, que, em situações de impasse institucional, costumam ser os fiéis da balança.
Temos aqui a inépcia como um fator moderador. Se é ela que impede o governo Bolsonaro de nadar de braçada, também é ela que nos protege de uma investida autoritária.
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