Eficiência fiscal e gasto inteligente poderiam evitar má alocação e desperdícios de 3,9% do PIB, ou US$ 68 bilhões, ou 9,1% do gasto total do Brasil, segundo estudo recém-lançado do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), "Melhores gastos para melhores vidas". Não é pouco dinheiro nem se trata apenas de dinheiro. Um ajuste fiscal que devolvesse às finanças públicas seu equilíbrio no Brasil é aproximadamente dessa ordem, isto é, de 4 pontos percentuais do PIB. Os diagnósticos e as sugestões apresentadas pelo banco merecem ser aproveitadas e o momento é mais que propício: o governo tenta reformar a previdência e cobiça uma reforma tributária de grande ambição.
O estudo do BID aponta vários vícios das políticas econômicas e fiscais que são comuns na América Latina e Caribe. A tendência dos governos é priorizar gastos correntes em detrimento dos investimentos de longo prazo. Com isso, o investimento público despencou vis a vis as despesas correntes em toda a região. Além disso, a expansão de gastos deveria ocorrer em tempos ruins, quando, na verdade, são cortados. Uma política expansionista deveria ser posta em ação nesses casos via despesas de capital, isto é, investimentos, cujos efeitos multiplicadores são muito maiores que os das despesas correntes. Na região e no Brasil, faz-se o contrário. Nas épocas de bonança, como durante o boom de commodities, as despesas aumentam, em geral com salários e outras despesas que se tornam permanentes e que não são suprimidas em retrações - os investimentos são a vítima principal.
No Brasil, Argentina e Uruguai as despesas com previdência social tornaram-se, segundo o BID, fortemente pro-cíclicas, "pois as reformas alteraram perversamente a forma como os benefícios são indexados, usando fatores pro-cíclicos subjacentes como crescimento do produto, receitas fiscais e salários". Os dados do estudo corroboram a necessidade inadiável da reforma previdenciária. O Brasil tem o mais alto gasto da América Latina e dispende 7 vezes mais com a população idosa do que com os mais jovens (a média da região é de 4 vezes). Com o nível atual de despesa, em 2065 a previdência consumiria 138% do orçamento.
Em geral, os gastos com previdência somam dois terços das transferências nos países da região. No Brasil 75% das transferências de recursos públicos são classificadas como "pró-ricos", isto é, não atingem seu alvo principal. O estudo dá o norte: "Gasto público não é apenas uma questão de eficiência, mas também de equidade". Nesse quesito, o país vai mal. Impostos diretos e programas de transferência de renda às famílias reduziram a desigualdade em média em 8,3%, eficiência muito menor que os 38% da média de uma amostra de países desenvolvidos, com um detalhe - o Brasil tem gastos semelhantes a eles em proporção do PIB. O país é o que mais realiza gastos sociais na América Latina, 25% do PIB, atrás apenas da Argentina.
A composição das receitas no Brasil também não ajuda seu uso mais eficiente. 49% do gasto dos governos subnacionais, ou 9,9% do PIB brasileiro, são financiados via transferências intergovernamentais e, segundo o BID, estudos empíricos mostraram que fatia maior de transferências - em relação à receita com impostos locais - tende a propiciar "maior nível em salários, e menores níveis de eficiência na provisão de serviços e infraestrutura básica". O Bolsa Família se sai bem na maré de desigualdade incentivada pela despesa pública - só 20% dos que recebem o benefício não deveriam recebê-lo.
O banco faz sugestões sobre os três componentes básicos de avaliação da eficiência técnica dos gastos públicos. Primeiro, é possível economizar, ganhar transparência e minimizar fraudes nas compras do governo por meio de licitações digitais, como o Comprasnet. O estudo avalia que entre 10% a 30% do dinheiro destinado a obras civis de projetos com recursos públicos somem por corrupção.
O segundo item é dos custos com salários dos servidores, que na região são 25% maiores que os pagos pela iniciativa privada (no Brasil, o dobro disso). A solução é implantar um sistema meritocrático e rever a estrutura de salários e carreiras do funcionalismo.
Por fim, há o custo com subsídios e transferências. O estudo nota que as isenções fiscais são as mais propensas a vazamentos, isto é, a serem capturadas pelos ricos. É necessário criar sistema de avaliação de todas as políticas públicas, mensurar seus resultados, eliminar subsídios e isenções que não favoreçam a equidade e priorizar os projetos com maior impacto social comprovado.
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