‘Querem me deixar como a rainha da Inglaterra’, afirmou o presidente; ele disse ser contra a PEC para reeleição de Maia e de Alcolumbre
Fabrício de Castro, Thiago Faria / O Estado de S. Paulo
BRASÍLIA – O presidente da República, Jair Bolsonaro, voltou ontem a atacar o Congresso e acusou parlamentares de tentarem reduzir seu poder, transformando-o em uma espécie de “rainha da Inglaterra”. Também criticou a articulação de deputados e senadores para aprovar uma proposta de emenda à Constituição (PEC) que permita a reeleição dos presidentes da Câmara e do Senado, conforme mostrou ontem o Estado.
Os comentários foram feitos por Bolsonaro ao tratar de um projeto de lei aprovado na Câmara e no Senado que, segundo ele, delegaria ao Parlamento a indicação de integrantes de agências reguladoras, e não pela Presidência da República. “Se isso aí se transformar em lei, todas as agências serão indicadas por parlamentares. Imagina qual o critério que vão adotar”, disse o presidente. “Pô, querem me deixar como rainha da Inglaterra? Este é o caminho certo?”, questionou.
O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), rebateu Bolsonaro e afirmou que o projeto em questão “não tira nenhum poder do presidente e não delega nada novo ao Parlamento”. “O presidente não perde prerrogativa alguma”, disse Maia ao Estado.
O projeto da Lei Geral das Agências Reguladoras, que aguarda a sanção de Bolsonaro, endurece as regras para preenchimento dos cargos e prevê que a escolha seja feita a partir de uma lista tríplice, pré-selecionada por uma comissão de seleção. A indicação, porém, ainda seguirá sendo do presidente da República.
Pela proposta, também caberá ao Executivo estabelecer a composição e a forma de atuar do colegiado que selecionará os nomes da lista. O texto ainda proíbe a indicação de políticos e parentes de políticos.
O projeto foi defendido pelo atual secretário executivo do Ministério da Fazenda, Marcelo Guaranys, durante a discussão no Congresso. Em uma apresentação sobre o tema feita em agosto do ano passado, quando ocupava o cargo de subchefe de Análise de Políticas Governamentais, Guaranys destacou que o pilar da proposta era “o equilíbrio entre a efetivação da autonomia das agências e o fortalecimento da governança e do controle social”.
“O presidente deveria trocar a assessoria jurídica ou ler o projeto aprovado antes de disparar sua metralhadora de impropérios: não entendeu nada”, disse o líder da Minoria no Senado, Randolfe Rodrigues (Rede-AP).
Na entrevista a jornalistas, Bolsonaro ainda criticou o que chamou “superpoderes” do Legislativo e disse que existe uma minoria no Congresso que “perdeu alguma coisa e quer recuperar”. Ao mesmo tempo, qualificou as agências regulatórias como um “poder paralelo”.
“As agências travam os ministérios. Você fica sem ação. Você tem que negociar com agência, é um poder paralelo”, afirmou Bolsonaro na saída da Coordenadoria de Saúde do Palácio do Planalto, em Brasília, onde passou por exames pela manhã. Segundo ele, foram procedimentos de rotina para se precaver antes do encontro do G20, no Japão. O presidente viaja na terça-feira.
As declarações ocorrem no momento em que o Congresso busca adotar uma agenda própria e já discute uma série de medidas para tentar acelerar a retomada da economia, como uma reforma tributária própria.
Na sexta-feira, o presidente admitiu problemas de articulação política entre o Planalto e a Casa. Bolsonaro atribuiu as dificuldades à “inexperiência” e admitiu que teve de adotar o modelo que era usado no Palácio do Planalto de Michel Temer. O mea-culpa ocorreu após editar Medida Provisória que retirou a articulação política das mãos do ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni (DEM), e transferiu-a para o general da ativa Luiz Eduardo Ramos, recém-nomeado por Bolsonaro para a Secretaria de Governo.
Reeleição. O presidente também indicou contrariedade ao ser questionado sobre uma mudança na Constituição para possibilitar a reeleição para presidências da Câmara e do Senado. Atualmente, a Constituição proíbe que os presidentes das Casas sejam reconduzidos aos cargos, na mesma legislatura. Na prática, isso significa que, em 2021, Maia e o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), não poderão concorrer à reeleição. A PEC mudaria isso.
“Veja, por exemplo, a Câmara Municipal do Rio de Janeiro. O cara fica eternamente lá”, criticou Bolsonaro, ao falar da articulação no Congresso.
“Qualquer eleição de quem já tem mandato, ele já sai com a máquina na mão. Ele tem um orçamento grande lá dentro. Isso aí é um atrativo para ganhar simpatizantes”, disse.
O presidente, porém, voltou a sinalizar que pode tentar a reeleição em 2022, contrariando o seu discurso de campanha. “Falei durante a campanha toda o seguinte: (com) uma boa reforma política, eu aceitaria acabar com essa política de reeleição”, disse. No entanto, na sequência, Bolsonaro deu a entender que, caso a reforma não ocorra, pode sair candidato. “Aí, 2022, se estiver bem, ou razoavelmente bem... Do contrário, estou fora”, acrescentou o presidente, completando: “Não existe bom governo com uma má economia.”
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