- O Globo
O ministro da Economia, Paulo Guedes, com a sua retórica estimulante, poderia estar hoje em Davos anunciando novos projetos industriais na Amazônia
A polêmica frase do ministro da Economia Paulo Guedes, representante do Brasil no Fórum Econômico Mundial, afirmando que as queimadas da Amazônia são provocadas pela necessidade de se alimentar dos brasileiros que vivem na região, é uma derivação do que já disse o presidente Jair Bolsonaro: “As queimadas são uma questão cultural”.
Assim se resume a política ambiental do novo governo brasileiro: a prioridade é o milhão de pessoas que moram na região amazônica. Não há o que discordar, as pessoas em primeiro lugar. O problema é que o governo considera que a devastação da Amazônia é justificável pela questão social, sem nem mesmo admitir que a exploração econômica descontrolada serve apenas aos interesses dos grileiros, que ao mesmo tempo devastam vidas humanas que exploram e o meio ambiente que degradam em busca de vantagens econômicas.
O mais angustiante é que a exploração econômica da Amazônia baseada na nossa biodiversidade é um grande projeto nacional que poderia ser levado adiante para reforçar nossa soberania na região, que tanto preocupa os militares.
Os projetos para a Amazônia sempre foram paralisados pelos disputa politica, mesmo no governo Lula, quando a então ministra do Meio-Ambiente Marina Silva propôs programa nacional de Amazônia Sustentável, citado pelo ex-presidente do Inpe Ricardo Galvão como uma boa proposta no caminho do desenvolvimento da região.
A disputa entre Marina e o então ministro do Planejamento Estratégico Mangabeira Unger acabou inviabilizando o projeto. O ministro do Meio Ambiente de Bolsonaro, Ricardo Salles, queria usar o Fundo Amazônia para indenizar proprietários rurais em unidades de conservação, para fazer a regularização fundiária. Os críticos o acusam de favorecer os grileiros em áreas protegidas.
Pois o então ministro Mangabeira Unger, do Planejamento Estratégico, quando assumiu o Programa da Amazônia Sustentável (PAS), teve a mesma proposta. Aliás, o fato de Lula ter dado a Mangabeira o projeto para a Amazônia foi a gota d’água para a saída da ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, assim como, anteriormente, o então deputado federal Fernando Gabeira havia deixado o PT devido a divergências, especialmente pela política ambientalista.
Em recentes entrevistas à Central da Globonews, dois dos maiores cientistas brasileiros, Ricardo Galvão e Carlos Nobre, forneceram dados para uma industrialização da Amazônia com proteção ao meio-ambiente. Galvão disse não ter duvidas de que a leniência do governo estimula o desmatamento.
Carlos Nobre lamentou que nós brasileiros não nos enxerguemos como o País da maior biodiversidade do planeta. O potencial econômico da biodiversidade, segundo ele, é muito superior ao da pecuária e ao dos grãos. O exemplo do açaí é imediatamente lembrado pois, segundo Nobre, ele já gera mais de um bilhão de dólares para a Amazônia, e na economia mundial, muito mais. O açaí está sendo industrializado no Vale do Silício, na Califórnia. Para Carlos Nobre, ”falta industrializar a biodiversidade”.
O ministro da Economia Paulo Guedes, com sua retórica estimulante, poderia estar hoje em Davos anunciando novos projetos industriais na Amazônia, em vez de ter que defender o governo brasileiro diante de uma plateia de investidores internacionais que cada vez dão mais importância ao meio-ambiente.
A indicação do vice-presidente Hamilton Mourão para coordenar um conselho interministerial de desenvolvimento da Amazônia é um passo importante, assim como a criação da Força Nacional Ambiental, mas o governo não tem uma coordenação que permitisse que Paulo Guedes, em Davos, anunciasse essas medidas como sinais de que o governo brasileiro está preocupado com a questão ambiental.
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